São Paulo, Quinta-feira, 25 de Fevereiro de 1999
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CRISE
CRISE
Saque é legítimo e não deve ser criminalizado, afirma Stedile
Esquerda espera convulsão social se economia não mudar

CARLOS EDUARDO ALVES
da Reportagem Local

Partidos, sindicatos e movimentos de esquerda vislumbram um cenário de convulsão social se a recessão econômica não for ao menos atenuada. Saques, manifestações de rua e pressão popular são termos cada vez mais utilizados pelos oposicionistas.
João Pedro Stedile, líder do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), vocaliza o sentimento da esquerda e dá a receita pontual para enfrentar a crise e forçar a ruptura com o modelo recomendado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). "Fernando Henrique Cardoso não tem mais moral para convocar a salvação nacional e vamos aumentar o ritmo de ocupação de terra", diz Stedile.
Os sem-terra, segundo seu líder, não aceitam que os saques sejam tratados como questão policial. "O saque contra a fome é legítimo e não pode ser criminalizado", acha Stedile.
O MST e partidos e entidades de esquerda estão agrupados, na luta pela mudança da política econômica, no Fórum Nacional de Lutas. O objetivo é organizar a "resistência" ao governo.
Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho, participa da articulação e, na CUT, já admite o início da discussão sobre a conveniência de tentar organizar uma greve geral contra o desemprego.
Vicentinho reconhece que a mobilização sindical é dificultada pelo óbvio temor, dos que ainda mantêm carteira assinada, de engrossarem o cada vez maior contingente de desempregados, mas vê uma saída. "No início, vamos fazer caminhadas e correr as periferias das grandes cidades para exigir uma mudança radical na economia. A greve pode ser o segundo passo", declara o sindicalista.
O deputado federal Aldo Rebelo (SP), líder da bancada do PC do B na Câmara, diz que uma eventual troca de governo não está fora do horizonte do partido. "Ou a economia é modificada ou o governo é substituído."
O petista Tarso Genro, que não figura exatamente entre os radicais de sua legenda, tem posição semelhante.
Rebelo investe fora da via institucional. "A luta tem que passar pela praça", afirma. José Dirceu, presidente nacional do PT, vai na mesma linha. "Não haverá solução institucional para a crise sem pressão das ruas", afirma.
A "rua" do jargão da esquerda comporta ações como saques a supermercados, como deixa claro Raimundo Bonfim, um dos coordenadores da Central de Movimentos Populares. "Os saques são ruins para a democracia, mas a população não terá outra alternativa", diz Bonfim.
A Conferência Nacional dos Bispos (CNBB), que organiza o "Grito dos Excluídos", há alguns anos um estuário conhecido das chamadas reivindicações populares, afirma que a entidade vê com "preocupação" o momento atual. "É necessário que o governo garanta aos mais pobres pelo menos as suas necessidades básicas, o que não vem ocorrendo", declara d. Raymundo Damasceno Assis, secretário-geral da CNBB.
O agravamento da crise social pode estar forçando modificações na inflexão política de algumas entidades. A Força Sindical, central que costuma apoiar o governo federal, está, por exemplo, apoiando uma invasão de terra.
A Força Sindical está cacifando uma invasão de terra pertencente ao governo paulista na cidade de Piratininga. "A situação está se complicando", afirma João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da entidade presidida pelo deputado federal Luiz Antônio de Medeiros (PFL-SP).
Juruna diz que o aumento do desemprego e o corte de investimento do governo em áreas sociais estariam forçando uma posição diferente da entidade. "A verdade é que os juros altos e a indefinição da política para gerar empregos estão fazendo a base pressionar a nossa direção para endurecer com o governo", declara Juruna.
O fato de os principais dirigentes da Força Sindical terem apoiado a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso só legitima a cobrança por uma mudança na política econômica, argumenta o sindicalista.
"Não temos a tradição de confronto da CUT e por isso temos mais direito de cobrar ações do governo federal", acha Juruna.


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