São Paulo, domingo, 25 de março de 2007

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Elio Gaspari

Grampearam 8.787 e-mails no Museu Imperial


As mensagens e as conversas dos funcionários eram arquivadas e mandadas ao comissariado da cultura

DESDE A MADRUGADA de 17 de novembro de 1889, quando sumiu a maleta de jóias da imperatriz Tereza Cristina, o patrimônio dos Bragança não passava por transtorno semelhante. No dia 7 de fevereiro, funcionárias do Museu Imperial foram surpreendidas por mensagens eletrônicas do serviço Gmail, informando que as memórias de suas caixas estavam saturadas. Como elas não tinham caixas no Gmail, foram ver o que houve. A diretora do museu, Maria de Lourdes Parreiras Horta, aprendeu que, desde agosto do ano passado, 8.787 mensagens de 34 endereços funcionais do museu haviam sido repassadas para um desconhecido musimp@gmail.com.
O encarregado do serviço, Aluizio Robalinho, explicou-se: por motivo de segurança, criara uma espécie de "backup" no Gmail. Fizera isso sem pedir autorização a quem quer que fosse. Muito menos contara que arquivava numa caixa particular a correspondência funcional dos outros. Seu "backup" era esperto. Antes que fosse apagado, conseguiu-se comprovar que quatro mensagens alheias haviam sido redirecionadas. Três para um endereço do próprio funcionário e uma para Mário de Souza Chagas (pmariosc@terra.com.br), coordenador técnico do departamento de Museus e Centros Culturais do Iphan, subordinado ao diretor José do Nascimento Jr. A mensagem incluía um tenebroso "para seu conhecimento". Anexava diálogo da diretora do museu com a chefe do arquivo.
Com 41 anos de serviço público, 20 de Museu Imperial e há 16 na sua direção, Maria de Lourdes Parreiras Horta chamou a Polícia Federal. O Ministério da Cultura abriu uma sindicância interna. O funcionário que privatizou comunicações do serviço público e criou o "backup" esperto, atribui a encrenca à ação de algum hacker. O uso de sítios como o Gmail para fins criminosos permite à polícia varejar a memória da caixa fantasma. Quando mensagens eletrônicas do serviço público são retransmitidas para o comissariado de Brasília, está instalada uma forma inédita de espionagem político-administrativa. As escutas da ditadura passam a ser brinquedo de criança.
Quem deve estar contente com essa marmelada é d. Pedro 2º. Testou o telefone de Graham Bell, e está na crônica do grampo, com o seu museu transformado em Big Brother.

VAI TRABALHAR, GALÃ DE GOGÓ DE CPI

Se a oposição deixar de lado o facilitário policialesco e espetaculoso das CPIs, poderá começar a discutir políticas públicas. Por exemplo, a tarifa social de energia elétrica.
Até 30 de setembro serão revistos os critérios dessas tarifas e pelo menos 2 milhões de famílias poderão perder o desconto na conta de luz. (Dezenas de milhares recebem-no indevidamente e é ótimo que o percam.)
O assunto está no Congresso desde 1999 e pelo menos 20 projetos tratam do assunto. O último deles, do deputado Carlos Zarattini, propõe redefinição da linha da pobreza elétrica, que no Rio e em SP é bem diferente da do Nordeste (R$ 218 contra R$ 150).
Há aí uma boa discussão, pois governadores como Aécio Neves, Sérgio Cabral e José Serra podem ser convidados a explicar porque não zeram a alíquota de ICMS da eletricidade dos pobres. Lula explicaria porque ainda cobra PIS e Cofins nessas contas.
O PSDB e o PFL poderiam discutir a proposta de Zarattini e ler um trabalho coordenado pelo professor Adilson de Oliveira (UFRJ) sobre pobreza e energia no Rio de Janeiro, feito para o Banco Mundial em 2005. Se não fizerem nada, Nosso Guia bate o pênalti e resolve a questão com um projeto do Executivo.
Serviço: O trabalho do professor pode ser capturado com a ajuda do Google. Chama-se "Energy Poverty-Caju Shantytown Case Study".

PAPA TRANSATLÂNTICO
De um conhecedor do Vaticano: "O papa Ratzinger radicalizou de tal maneira a sua visão européia dos problemas da igreja que é grande a probabilidade de ele ser substituído por um pontífice nascido do outro lado do Atlântico".

O SUB DO SUB
Por trás da demagogia republicana do senador John McCain, que teme um avanço do socialismo na América Latina, está a conhecida figura de Robert Zoellick, ex-subsecretário de Estado e negociador-chefe do governo americano em questões comerciais. McCain disputa a indicação de seu partido para a eleição presidencial do ano que vem.
Zoellick é aquele sujeito que, em 2002, Nosso Guia chamou de "sub do sub".

BOLSA DEPUTADO
Veteranos parlamentares governistas têm sugerido aos colegas recém-chegados que o Palácio do Planalto, na sua infinita bondade, resolveu separar R$ 3 milhões em verbas para cada um deles. Nada a ver com a generosidade do dinheiro que é oferecido aos calouros por representantes de pequenos partidos da base aliada. O SuperMensalão, com seus petrocontratadores, é escândalo para 2009. Tratar dele em 2007 chega a ser falta de educação.

COMANDO ÚNICO
Se o deputado Aldo Rebelo for para o ministério da Defesa, o PC do B ficará com o monopólio do mistério dos documentos da guerrilha do Araguaia. Uma parte da memória do episódio é escondida por autoridades militares desde 1972. Outra parte (tão relevante quanto a primeira) é escondida pelo PC do B, desde 1973. Nomeado, Aldo ficará com a tarefa de esconder as duas.

SEIS MESES
Graças a um depoimento de Nosso Guia ao sítio "ABC de Luta", entende-se melhor um detalhe de sua biografia. Trata-se de sua relação com a enfermeira Miriam Cordeiro, com quem teve uma filha, Lurian, que prontamente reconheceu. Coisa de 1974.
Criou-se a lenda de que se tratou de um episódio fortuito. Por iniciativa de Lula, e nas suas palavras, deve-se entender que essa impressão está errada. Ele conta: "Aí, foi interessante, eu até compreendo o ódio que a Miriam Cordeiro tem de mim porque ela estava grávida de seis meses. A gente estava até procurando casa. Mas quando eu conheci a Marisa eu me apaixonei e falei: "Bom, eu vou largar de tudo o que eu tenho". Aí, eu larguei da Miriam Cordeiro e com seis meses eu casei com a Marisa".
O depoimento, excepcional e extenso, está no sítio "ABC de Luta", ou abcdeluta.org.br.

CADÊ O BOBO?
Um curioso que acompanhou a caravana de Lula como candidato a presidente em 1994 assombrou-se com a fraternidade-companheira de Nosso Guia com o ex-presidente Fernando Collor. Como Paulo Maluf, o senador integra a base de apoio do governo.
Como candidato, Lula ajustava seus discursos pelo interior gaúcho com módulos de retórica. Se um não funcionava, engatava o seguinte, mais agressivo. Quando a platéia não reagia, ia ao último recurso e propunha o confisco dos bens pessoais de Collor. Usou a fórmula pela primeira vez na cidade Ronda Alta. Deu certo.
Alguém fez papel de bobo: a platéia de Ronda Alta em 1994 ou o senador Collor em 2007.


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