São Paulo, segunda-feira, 25 de agosto de 2008

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Congressistas e advogados criticam "legislação" do STF

Edição de súmula que limita uso de algemas é vista como afronta à Constituição

Supremo afirma que não legislou, só interpretou a lei; advogado vê excesso de preocupação de membros do tribunal com ações da PF

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

ANDREA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A edição da súmula que limita o uso de algemas colocou em alerta congressistas e advogados que viram, na medida do Supremo Tribunal Federal (STF), uma afronta à Constituição. Uns dizem que a corte usurpou a função do Congresso de legislar; outros, que criou um precedente ruim ao baixar uma norma amparada apenas em quatro julgamentos que servirá a juízes de todo o país.
Sem entrar no mérito do uso de algemas, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), que defendeu a lei da súmula no Congresso, diz que o instrumento surgiu para dar uma resposta padrão a centenas de processos repetidos. "Ao aprovar a lei, falamos em "reiteradas decisões". A súmula não é para que o STF legisle sobre assuntos da competência do Congresso."
Para o Supremo, a corte não legislou, só interpretou a Constituição. Sobre a quantidade de decisões que embasam a súmula, diz: "Não há fórmula matemática". Para Mercadante, a aprovação unânime não justifica a edição da norma. "Toda vez que houver decisão unânime, vira súmula. Não há sentido."
O senador Demóstenes Torres (DEM-GO) concorda. Para ele, desde o início ficou claro que a súmula não seria usada para legislar. "Não demos ao Supremo esse poder."
O Congresso, que criou a lei da súmula, pode revogá-la. Os senadores afirmaram, no entanto, que nem aventam essa possibilidade. Ao criar a súmula das algemas, o STF citou quatro julgamentos: um, de 1978, que permitiu o uso para evitar fuga e preservar testemunhas; outro, de 95, que autorizou o uso no julgamento se "essencial à ordem dos trabalhos"; um, de 2007, que classificou o uso de "excepcional"; e um deste ano, que anulou uma sentença porque o réu algemado pode ter influenciado o júri.
Daí nasceu a súmula que limita o uso de algemas para casos de resistência e possível fuga. Prevê ainda que o emprego deverá ser justificado por escrito, sob pena de anular a prisão. Um projeto de lei aprovado pelo Senado na semana passada inverte essa lógica. O texto não define quando as algemas serão permitidas; ao contrário, fixa quando proibidas.
O professor de Direito Constitucional da UnB Menelick de Carvalho Netto questiona o número reduzido de julgamentos anteriores. "A súmula inviabiliza ou torna muito difícil o uso de algemas pois requer justificativa por escrito. Por isso, a exigência de normas gerais reiteradas, [a súmula] nasce da experiência de processos julgados, o que não houve."

Dantas
O fato de a súmula ter sido editada após a prisão do banqueiro Daniel Dantas foi criticado pelo advogado Fábio Konder Comparato, que foi contra a lei da súmula. "O Supremo compartilhou da nossa hipocrisia. Foi chamado a se pronunciar porque a pessoa que levou a essa discussão não era o "Zé da Bodega". Mas Dantas é banqueiro, branco e endinheirado." O advogado Dalmo Dallari vê excesso de preocupação do tribunal com as ações da Polícia Federal "sobre camadas tradicionalmente privilegiadas da sociedade". "Veio essa reação porque o envolvido era um homem das altas finanças."


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