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Salário vale mais, mas alta do consumo do Real perde força
Nos primeiros anos do governo FHC, o brasileiro consumiu mais devido à melhora do poder aquisitivo; a partir de 97, o consumo começa a perder força por causa das crises externas que afetaram o país e devido ao aumento do desemprego
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ADRIANA MATTOS
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
Nos anos do governo FHC, 13,9
milhões de brasileiros migraram
de classes de menor para as de
maior poder aquisitivo e subiram
um degrau na escala social.
O consumidor foi beneficiado
ainda pelo fim da disparada dos
preços. A inflação nos preços dos
produtos como roupas e alimentos ficou abaixo da taxa média registrada nos anos FHC. Enquanto
a inflação na era tucana foi de
117,66%, os preços dos alimentos
subiram 73,34%; de calçados,
43,8%, e de roupas femininas,
35,42%. Os preços relativos caíram, nesses setores.
O consumo de produtos supérfluos disparou. As vendas de amaciantes de roupa subiram 374%;
as de requeijão, 284%; e as de cremes e loções, 183%.
Além de a inflação ter ficado sob
controle, a renda média do trabalhador pulou de R$ 769, em 1992,
para R$ 1.098, em 1996 -o melhor ano. Mas o consumo começou a perder fôlego a partir de
1997 (como consequência também das crises internacionais), e a
renda, a encolher. Em agosto de
2002, o valor médio da renda ficou em R$ 797,05 -o pior número desde o início dos anos FHC.
O movimento de remarcação de
preços nos últimos meses, por
conta da disparada do dólar, jogou água fria no final da era tucana. Nos últimos 12 meses terminados em setembro, o IPCA, índice de inflação do próprio governo,
ficou em 7,93%, superando o de
2001, de 7,67%.
Assim, o brasileiro passou a
consumir menos e a trocar produtos: só adquire o que é essencial
e barato. Com isso, de janeiro a setembro deste ano, o faturamento
real do varejo paulista caiu 5,26%.
Nas lojas de departamento, a queda foi de 10,42% no período.
O freio nas compras, a retração
da renda e o desemprego, que se
mantém elevado, quebraram o
encanto do início do Plano Real.
Ainda assim, o país, na análise de
especialistas ouvidos pela Folha,
está numa situação mais confortável do que há oito anos quando
o tema em questão é o consumo.
O que eles dizem é que o fim da
elevada inflação que o país vivia
no início dos anos 90 -em 1993,
o IGP-DI bateu em 2.708%-
propiciou, além do incremento da
renda, aumento da competitividade das empresas, eliminando, portanto, as menos
eficientes. A redução do custo
final dos produtos e o fim
do fantasma da
inflação fizeram com que
as mercadorias
ficassem mais
acessíveis à população. A mudança pode ser
vista em números.
Considerando como base
100 o índice de
produtividade das indústrias em
1989, esse número bateu em 170,8
(produto por hora trabalhada) no
ano passado, segundo levantamento da Fundação Dom Cabral.
Em 1990, o índice estava abaixo de
100 (96). "As empresas se tornaram mais eficientes, e o consumidor, mais exigente. Isso não tem
volta", diz Alberto Serrentino, sócio-diretor da consultoria Gouvêa
de Souza & MD.
A exigência é reflexo do maior
poder de compra. O BCG (Boston
Consulting Group) informa que
4,5 milhões de brasileiros migraram do que a empresa classifica
de classe D (renda mensal inferior
a quatro salários mínimos) para a
classe C (de quatro a dez mínimos). Outros 2,9 milhões pularam da classe C para as classes A e
B (acima de dez mínimos). Os números têm como base o IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística). Segundo o instituto,
em 1992 a classe C representava
26,3% da população. Em
2000, esse grupo já respondia
por 30%.
Dados do
Ibope/Latin
Panel mostram
uma movimentação semelhante. Em
1993, 2% da
população pertencia à classe
A, de maior
poder de compra. Em 2000,
essa taxa chegou a 5%. Já a
classe E, com
menor poder
de compra, diminuiu de 18% do
total para 8%. O levantamento é
feito em 6.000 domicílios.
A migração das classes de menor renda para as de maior causou a expansão no consumo. No
período acumulado de 94 a 2000,
o consumo per capita de creme
dental, absorvente higiênico, papel higiênico e xampu cresceu
cerca de 70%.
Na linha de bens duráveis, como TVs, refrigeradores e carros, o
aumento do crédito oferecido pelos bancos aos consumidores foi o
estopim de um processo que culminou em lojas cheias. Havia dinheiro barato na praça para aumentar as compras e saciar a demanda reprimida. De meados de
1994 ao início de 1995, os empréstimos aos brasileiros subiram de
R$ 3 bilhões para R$ 26 bilhões.
"A expansão da carteira de crédito levou a um aumento brutal
do poder de compra", afirma Fábio Pina, economista da Federação do Comércio do Estado de
São Paulo (FCESP). "O problema
é que essa fase não durou."
O boom de consumo visto no
início do Real foi brecado, em
1997, pelo aumento da inadimplência, que resultou na quebradeira de redes de lojas como Casas
Centro, Mappin, Mesbla e Arapuã. Com tanto dinheiro disponível, gastou-se mais do que se podia pagar. "Há casos ainda de má
administração no varejo", afirma
Marcos Gouvêa, sócio-diretor da
Gouvêa de Souza & MD.
Vale lembrar que os gastos cresceram durante o período anterior
à disparada dos juros promovida
pelo Banco Central. Com as crises
da Ásia e da Rússia, em 1997 e
1998, respectivamente, foi necessário subir as taxas para manter o
interesse do investidor estrangeiro pelo Brasil. Com isso, os juros
ao consumidor subiram também.
Hoje, especialistas em varejo dizem que a explosão da inadimplência vivida pelo país em 97 não
se repete, já que o comércio está
mais cauteloso para liberar o crédito, e o consumidor, mais consciente. No mês passado, de cada
1.000 cheques compensados, 12,7
foram devolvidos. Em setembro
de 2000, esse número estava em
13,7 -isto é, houve queda.
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