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JANIO DE FREITAS
Momento especial
Sua atenção , por favor, que
o fato é muito relevante: Lula
produziu uma novidade. Quem
poderia esperar por isso, já com
23 desalentados meses do mandato de 48, ou seja, decorrida
quase metade do mandato? A rigor, a abrangência da novidade
recua até muito aquém, incalculavelmente aquém, do início do
governo.
É preciso recapitular um pouco.
Desde o início, mas sobretudo
neste ano, Lula cada vez mais parece discursar para si mesmo. Como se tomado da necessidade de
dizer que o governo está no rumo
certo para acreditar, ele próprio,
que isso contenha alguma verdade. Ou, o que dá quase no mesmo, que preside de fato.
A desconexão entre palavras e
realidade vem de muito longe, segundo o próprio Lula. Sua definição de tudo o que disse antes da
última campanha coube em duas
palavras bem escolhidas: "eram
bravatas", quer dizer, fanfarronice, tapeação. Ainda mal iniciado o governo, viu-se que todos os
compromissos com o eleitorado
não passaram de falsas seduções.
Era a mesma fanfarronice enganadora, porém sem bravatas,
que o Lulinha paz e amor não as
comportaria.
Nas horas infindáveis de segunda para terça-feira, em que
Lula e os 17 ministros do PT,
além de uns quantos coadjuvantes, discutiram sem saber o que
discutir e chegaram à orientadora conclusão de que nada concluíram, deu-se a novidade. Com
o mínimo de clareza e o máximo
de tibieza possíveis, alguns ministros insinuaram que a política
econômica talvez, quem sabe,
pudesse ser reconsiderada em alguns pontos, ou do contrário
-como disse o ministro Luiz
Dulci na culminância da ousadia- poderá levar à derrota.
Não explicitou se derrota de Lula
na reeleição, derrota do governo
ou derrota do PT, mas, se necessário, depois Marta Suplicy, o
gaúcho Raul Pont e outros explicam por que e como são as "derrotas vitoriosas" que a integridade intelectual do José Genoino
identificou.
E chegou, então, o extraordinário. Talvez porque mal contivesse
a irritação, Lula deu esta resposta, no seu discurso final, aos que
falaram da política econômica:
"Na política econômica eu não
mudo nada. A política econômica é essa e não tem volta. E quem
quiser contestar a política econômica, comigo não terá vez pra
discutir".
Que coisa extraordinária: tudo
indica que foi um momento de
plena sinceridade. Meio esquisita
na forma, sim. "Não tem volta"
-que volta, se a política econômica é o continuísmo da "herança maldita"? Não faz mal, a sinceridade tudo compensa. E tem
ainda valor histórico. Desde os
generais-ditadores não se ouviam frases assim, "eu não mudo
nada", "não tem volta", "comigo
não terá vez", frases tão democráticas.
Mas Lula bem que poderia levar sua sinceridade um pouquinho além, apenas um complemento: "Eu não mudo porque
não posso mudar".
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