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ACORDO NUCLEAR
Ministro afirma que acordo com AIEA foi fechado; agência, porém, diz que avaliação ainda não foi concluída
Brasil anuncia aval para enriquecer urânio
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Com o aval da AIEA (Agência
Internacional de Energia Atômica), começará a funcionar em dezembro a primeira fábrica de
enriquecimento de urânio no
Brasil, localizada em Resende
(RJ). O resultado da vistoria da
agência foi anunciado ontem pelo
ministro Eduardo Campos (Ciência e Tecnologia) como o cumprimento de uma etapa importante
do Programa Nuclear Brasileiro.
No entanto a AIEA foi menos
conclusiva. Por meio de seu porta-voz Mark Gwozdecky, disse
que o acordo ainda não foi finalizado. "A AIEA ainda está em processo de completar a avaliação",
segundo a Associated Press .
A agência autorizou, segundo o
governo brasileiro, o funcionamento do primeiro módulo da fábrica das Indústrias Nucleares do
Brasil (INB) sem que seus técnicos pudessem ver as centrífugas,
cujos formato e disposição são tidos como segredo tecnológico.
Os limites da inspeção -restrita a válvulas e tubulações da fábrica- foram negociados durante
meses com a AIEA e deram margem a especulações na imprensa
internacional sobre o uso da energia nuclear para fins não pacíficos
no Brasil. "O mundo nunca teve
essa dúvida, em nenhum momento o Brasil foi questionado
por outro membro da agência ou
país vizinho", disse Campos.
Com o licenciamento internacional aprovado, a fase de testes
da fábrica de Resende deve começar em três semanas, de acordo
com nota conjunta divulgada pelos Ministérios das Relações Exteriores e da Ciência e Tecnologia.
Essa fase dura até oito meses.
Provavelmente a partir de agosto do ano que vem, o país começará a enriquecer uma primeira
parte (menos de 15%) do urânio
usado como combustível nas
duas usinas nucleares em funcionamento no país -Angra 1 e Angra 2, também localizadas no Rio
de Janeiro.
Atualmente, o urânio bruto, extraído na Bahia, é purificado e enviado, de forma concentrada
(chamado "yellow cake"), para
enriquecimento no exterior (Alemanha, Holanda e Inglaterra),
antes de ser transformado nas
pastilhas que abastecem as usinas.
A meta do governo é enriquecer
60% do urânio consumido pelas
usinas até o final do mandato do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso representaria uma economia de US$ 11 milhões por ano-
custo do enriquecimento feito no
exterior. Mas o cumprimento da
meta depende ainda da construção de mais três dos quatro módulos da fábrica de Resende.
As usinas de Angra 1 e Angra 2
são responsáveis pela produção
de cerca de 4,5% da energia consumida no Brasil. A construção
do primeiro módulo da fábrica de
Resende consumiu R$ 250 milhões em investimentos públicos.
O dinheiro para concluir a fábrica
ainda não está garantido. Nem há
compromisso oficial de poupar o
projeto do aperto fiscal nos dois
últimos anos de mandato do presidente Lula.
A médio prazo, até 2010, o Brasil
pretende enriquecer todo o urânio usado pelas usinas no Brasil.
Mas, segundo insistiu Eduardo
Campos, não há planos de exportação de urânio bruto nem de urânio enriquecido depois que o país
alcançar a auto-suficiência no
enriquecimento.
Na agenda nuclear do governo,
está prevista para dezembro a decisão sobre a retomada das obras
de Angra 3. O resultado do trabalho de um grupo interministerial
coordenado pela ministra Dilma
Roussef (Minas e Energia) será
encaminhado nas próximas semanas ao presidente Lula. Ontem, Campos evitou o tema, considerado polêmico na Esplanada.
Segredo
A decisão da AIEA, comunicada
formalmente ao governo anteontem e antecipada a Lula na segunda-feira, foi interpretada como
uma vitória dos brasileiros -ontem, porém, a agência não confirmou a finalização do acordo. A
agência, da qual o Brasil é sócio e
um dos fundadores, pleiteou
acesso irrestrito às instalações de
Resende. O governo negou.
"Aquela tecnologia não será de
forma nenhuma devassada", insistia Eduardo Campos às vésperas da chegada dos técnicos ao
Brasil, em meados de outubro,
defendendo um meio-termo entre as intenções iniciais da AIEA e
do governo. "Foi em torno dessa
proposta intermediária que se
construiu o entendimento, não se
fez necessária a visualização do
corpo da centrífuga", contou ontem o ministro.
Críticos da postura brasileira
alegam que o segredo pode ter
mais a ver com a tentativa de esconder alguma pirataria na construção do equipamento, talvez
oriunda do mercado negro nuclear que era comandado a partir
do Paquistão. O governo nega.
Os técnicos voltaram na semana
passada antes de uma palavra final da agência. "A visita foi considerada plenamente bem-sucedida por ambas as partes e a ata do
evento, de circulação restrita, cita
que todos os procedimentos estabelecidos para a visita de verificação foram cumpridos, não tendo
sido deixado nada por fazer", relata a nota divulgada ontem pelo
governo.
O principal argumento para
preservar a tecnologia de enriquecimento de urânio desenvolvida
pela Marinha é o reduzido consumo de energia no processo, calculado em 25 vezes menor do que as
centrífugas desenvolvidas pelos
norte-americanos.
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