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Brasil negocia a compra de sistema antiaéreo da Rússia
Acordo pode elevar tensão militar na América Latina e criar atrito com os EUA
Tor-M2E é a mais recente geração de um sistema de defesa com mísseis terra-ar da Rússia; Chávez comprou um modelo mais antigo
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O Exército brasileiro negocia
com o governo da Rússia a
aquisição de um sistema de defesa antiaérea inédito no país.
Se realizada, a compra mudará
o Brasil de patamar em termos
de capacidade de defesa, acrescentará temperatura ao processo de militarização da América Latina e poderá provocar
reações em Washington.
Uma comitiva brasileira esteve em agosto na Rússia para
avaliar o sistema, o Tor-M2E.
Uma equipe de dez técnicos
russos irá expor mais detalhes
de sua proposta em uma reunião hoje no Quartel-General
do Exército, em Brasília.
O Tor-M2E é a mais recente
geração de um sistema de defesa com mísseis terra-ar desenvolvido na antiga União Soviética. É considerado o mais eficaz modelo em operação no
mundo. Ele serve para abater
aviões, helicópteros, armas de
alta precisão e mísseis, usando
radar. Sendo de curto alcance,
visa proteger cidades e instalações estratégicas.
Hoje, a defesa antiaérea quase inexiste no Brasil, sendo restrita a menos de 200 canhões
com projeto dos anos 50, 112
lançadores portáteis russos
Igla e alguns franceses Mistral.
Não há meios para abater mísseis e, se um avião supersônico
penetrar perigosamente o espaço aéreo brasileiro, irá ser
confrontado apenas por aviões
como o Mirage-2000 ou o F-5.
O diretor de Material do
Exército, general Sinclair Mayer, confirma o interesse, mas
diz que o negócio ainda está na
fase das "tratativas" e que depende de recursos hoje inexistentes: "Como sabemos, nossas
demandas de maior importância são grandes. Mas sim, do
ponto de vista de defesa antiaérea, estamos desguarnecidos".
Sistema caro
O Tor é uma arma cara. Uma
bateria completa, com quatro
lançadores, um veículo de comando, carros de apoio, logística e mísseis não sai por menos
de US$ 300 milhões (R$ 520
milhões). Mas como a tradicional anemia orçamentária militar brasileira está numa fase de
reversão, envolvidos no processo acreditam que o dinheiro poderá aparecer via créditos adicionais ou financiamentos de
longo prazo a serem incluídos
no Orçamento. No projeto de
lei do Orçamento enviado ao
Congresso, só R$ 640 milhões
dos R$ 24 bilhões destinados ao
Comando do Exército são para
investimentos.
O exemplo mais recente dessa reversão foi o acordo militar
com a França, no qual o Brasil
comprará submarinos e helicópteros de Paris a um custo de
mais de R$ 22,5 bilhões.
Está na reta final também o
negócio para a aquisição dos
novos caças da FAB, 36 unidades a cerca de R$ 10 bilhões.
Novamente, aqui os franceses
com seu Rafale são os escolhidos pelo governo, como disse
novamente ontem o ministro
Nelson Jobim (Defesa) -embora os concorrentes sueco e
americano ainda tentem reverter a decisão política.
Do ponto de vista militar, dependendo de sua alocação, o
sistema de mísseis mudaria o
patamar de defesa aérea do
Brasil, embora não altere o balanço estratégico regional. U-ma dúzia de países usa modelos
Tor. A Venezuela comprou 12
unidades duma versão anterior
à oferecida ao Brasil, o Tor-M1,
cujos primeiros lançadores serão entregues em 2010. O Chile
já opera há mais tempo um sistema menos capaz, francês, para proteger suas bases aéreas.
Politicamente, há possibilidade de uma eventual compra
transformar-se em mais um capítulo dos assuntos espinhosos
a serem tratados com os EUA.
No estágio inicial da licitação
dos caças, um dos motivos que
desclassificou o russo Sukhoi
foi uma pressão velada de Washington, que não gostaria de
ver um mercado de armas de
Moscou montado na região
-por conta de embargo americano, o venezuelano Hugo Chávez comprou bilhões de dólares
em armas da Rússia. De todo
modo, o Brasil fez posteriormente um negócio com os russos, comprando helicópteros.
Uma venda recente de modelos Tor-M1 para o Irã foi duramente criticada pelos EUA. O
sistema pode dissuadir um ataque com aviões de Israel a centrais nucleares iranianas.
Mesmo que tenha sido discreto sobre as intenções do
Exército, o general Mayer deu a
senha sobre os interesses na
negociação. "O problema desses sistemas é que eles se desatualizam rapidamente", disse,
defendendo a necessidade de
dominar novas tecnologias.
E citou também a China como país promissor no campo
de defesa antiaérea. Jobim acaba de voltar de uma viagem ao
país asiático justamente para
discutir parcerias militares.
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