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ENTREVISTA
BLAIRO MAGGI
"Com roupa de policial, garotos acham que vêm salvar o mundo"
Governador critica atuação da PF em operações contra o desmate na Amazônia
Ednilson Aguiar - 28.set.2007/Secom-MT
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O governador Blairo Maggi visita obra de pavimentação da rodovia MT-251, no trecho de Chapada dos Guimarães a Campo Verde
RODRIGO VARGAS
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CUIABÁ
Após se envolver em polêmicas com o novo ministro Carlos
Minc (Meio Ambiente), o governador de Mato Grosso, Blairo Maggi (PR), resolveu centrar
fogo no combate da Polícia Federal à devastação da Amazônia. Em entrevista à Folha, criticou os agentes que chegam
com "metralhadoras na mão" e
disse que os dados divulgados
pelo Inpe (Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais) -"que
não existem"- forçam operações como a Arco de Fogo.
"Você pega uns garotos novos, que vêm do Sul e Sudeste,
dá uma roupa de policial, uma
metralhadora, e ele chega aqui
achando que vem salvar o
mundo. Bate uma foto e mostra
para a mãe lá no Sul: "Estou salvando a Amazônia'", disse Blairo, para quem Mato Grosso
"não deveria sofrer a pressão
que vem sofrendo, já que os números não estão corretos".
Na entrevista, o governador
disse ainda que se decepcionou
com o novo ministro -que
chegou a dizer que Blairo, se
pudesse, plantaria soja "até nos
Andes"- e negou que tenha
pressionado pela saída de Marina Silva do Meio Ambiente.
FOLHA - Como recebeu as críticas
do novo ministro?
BLAIRO MAGGI - Ele me decepcionou, de certa forma, porque
eu não conheço o Minc. Ele não
me conhece, não conhece Mato
Grosso e a Amazônia. Portanto,
ele não conhece as causas dos
problemas amazônicos nem
ações que o governo de Mato
Grosso e os setores produtivos
têm feito para minorar esse
problema do desmatamento. E
os números mostram que temos tido um ganho substancial
nessa questão de 2005 para cá,
quando tivemos redução de
mais de 70%. Espero que, com
o tempo e as oportunidades que
ele terá de vir à região, a gente
possa se conhecer.
FOLHA - O sr. diz que Mato Grosso
é vítima de preconceito. O que o leva
a pensar assim?
BLAIRO - As pessoas que vivem
nesta região vieram dentro de
um programa de governo. Elas
produzem alimentos -e não
coisas desnecessárias para a
humanidade. Tudo o que se
produz aqui é necessário em alguma parte do Brasil. Então,
não há um reconhecimento
disso. Simplesmente, de um dia
para o outro, alguém chega e
diz: "Vocês não são importantes, não são necessários, podem
ficar de fora, podem quebrar
suas economias, explodir as cidades de vocês, podem fechar
as escolas que são mantidas
com o dinheiro dos impostos da
produção agrícola".
FOLHA - A posição não se baseia no
fato de que há desmatamento?
BLAIRO - As pessoas precisam
voltar a entender que não se faz
omelete sem quebrar ovos e
que existe a necessidade de
ocupação do espaço. Não se faz
nenhum alimento, em nenhum
lugar do mundo, sem que os
biomas não sejam alterados.
Precisamos ter reconhecimento da importância do agronegócio, desde as grandes propriedades até a agricultura familiar.
FOLHA - O sr. diz que é inevitável a
abertura de áreas na Amazônia para
conter a crise de alimentos.
BLAIRO - Quando eu disse aquilo, me referi a um futuro em
que, se o mundo tiver muita necessidade de comida, lá na frente, 10 a 20 anos, terá que se estudar alguma forma de se aproveitar mais áreas. A Amazônia
continua sendo importante
nesse jogo da produção de alimentos, mas não acho que temos clima, determinação política, para se liberar novas áreas
para a produção de alimentos.
Agora, entendo que dá para fazer um aumento substancial de
produção sem novas aberturas.
FOLHA - Não há risco de expansão
da soja para além das fronteiras de
cultivo?
BLAIRO - De onde estamos produzindo hoje para o Norte, eu
diria que o espaço de crescimento dessa cultura não é muito grande. Um exemplo é Itacoatiara, no Amazonas, onde
existe um porto de escoamento
e terras para a produção. O porto está disponível há dez anos e
nenhum pé de soja está plantado naquela região. É muito
mais uma questão cultural das
pessoas que estão aqui trabalhando e da topografia dessas
terras. As pessoas que vivem
aqui têm uma cultura quase
que genética. São descendentes
de alemães, italianos, que têm a
agricultura no sangue. Todos
que vivem nesta região têm esse desejo, essa ansiedade, de
produzir e fazer um futuro melhor, e aí essa carga de informação com a qual ele foi educado
está fazendo esse contraponto
hoje com a questão ambiental.
É dentro dessa perspectiva que
Mato Grosso tem que ter um
tratamento diferenciado.
FOLHA - O sr. pleiteia Mato Grosso
fora da Amazônia Legal?
BLAIRO - Eu não tenho uma
opinião formada, mas acho que
é uma questão que deveria ser
discutida com mais amplitude,
técnica e economicamente. O
que acontece com Mato Grosso
é que nós não fazemos parte só
da Amazônia. Dois terços de
nosso território fazem parte do
Centro-Oeste. Então, temos
duas políticas aqui dentro.
FOLHA - Por que não quer colaborar com a Guarda Nacional Ambiental?
BLAIRO - A idéia até que é boa. O
que quis dizer é que não podemos criar uma força dessas e
achar que Mato Grosso vai ter
de colocar homens para ficar
cumprindo a determinação do
governo federal e cuidar de
seus parques nacionais, de suas
reservas extrativistas. Eu jamais faria isso, porque tenho
que cuidar da segurança pública. Agora, já que a Amazônia é
de todos e todos têm muita
preocupação com ela, defendo
que esses homens venham de
outros Estados, venham da região Sul, do Nordeste, de áreas
que não têm floresta, mas que
têm preocupação com a floresta. A idéia é bem-vinda, terá colaboração do Estado, mas não
quero que Mato Grosso e os outros Estados amazônicos paguem essa conta.
FOLHA - O sr. ainda sustenta que o
desmatamento detectado pelo Inpe
é irreal, superdimensionado?
BLAIRO - Eu vi outro dia o ministro dar uma declaração de
que ele não brigaria com o termômetro. Algo assim: se eu estou com febre, estou com febre.
Eu também concordo, mas antes precisamos aferir o termômetro para que ele não nos leve
a tomar decisões erradas. E o
Inpe, nos últimos tempos, tem
feito a divulgação de índices de
desmatamento muito elevados
em relação ao que temos encontrado no campo.
FOLHA - O Inpe afirma que Mato
Grosso erra ao considerar só o corte
raso como desmate.
BLAIRO - Não se pode misturar
degradação progressiva de floresta com desmatamento efetivo. Eu não afirmo que não haja
desmatamento. Eu afirmo que
o Estado vem combatendo isso,
inclusive fazendo embargos e
aplicando multas pesadas. O
que não aceito é misturar números que não existem. Isso é o
mesmo que pegar a imagem de
Mato Grosso e do Brasil e jogar
na lata do lixo. Nós temos problemas, mas eles não são do tamanho que eles são alardeados.
FOLHA - O sr. exerceu algum tipo
de pressão para a saída de Marina?
BLAIRO - Não fiz pressão alguma contra as políticas do ministério. O que falei, na reunião
antes do anúncio do PAS [Plano
Amazônia Sustentável], junto
com os governadores, foi sobre
a Operação Arco de Fogo e sua
atuação ostensiva. Quem vai fazer fiscalização não precisa
chegar com 10, 12 camionetes,
com armamento para fora, entrando em bares e restaurantes
com metralhadoras na mão, como a Polícia Federal fez. Foram
essas as reclamações. Eu nunca
reclamei da fiscalização, mas da
forma como estava sendo feita.
Você pega uns garotos novos,
que vêm do Sul e Sudeste do
Brasil, dá uma roupa de policial, uma metralhadora, e ele
chega aqui achando que vem
salvar o mundo. Bate uma foto
e mostra para a mãe lá no Sul:
"Estou salvando a Amazônia".
Outra coisa que reclamei com o
presidente foi em relação aos
números do Inpe -até porque
foram esses dados que levaram
a ministra as tomar as decisões
que tomou. Então, se esses números não estão corretos, Mato
Grosso não deveria sofrer a
pressão que vem sofrendo. A
quem tenho que recorrer? Ao
presidente. Tenho de dizer a
ele: "Estão fazendo uma intervenção no meu Estado, estão
quebrando o meu Estado". Tenho o dever de fazer a defesa.
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