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ELIO GASPARI
E se Mares Guia fosse um sindicalista?
O silêncio dos tucanos diante do seu mensalão mostra
o oportunismo com que manipulam a moralidade alheia
SE O MINISTRO da Articulação
Política do governo fosse um
petista saído do movimento
sindical, o céu já teria desabado sobre Brasília.
Imagine-se um companheiro metido numa reunião para definir a arrecadação da caixinha eleitoral de
um candidato que acabou derrotado
na eleição de 1998. Some-se um empréstimo pessoal feito por esse mesmo petista ao candidato, depois de
sua derrota. Walfrido Mares Guia
fez tudo isso, mas o tucanato trata o
assunto com um silêncio retumbante, indicador do oportunismo com
que manipula a moralidade alheia.
Mares Guia não é um sindicalista,
mas próspero empresário; não está
no ABC, mas na plutocracia mineira; não se meteu na campanha dos
companheiros, mas na do então governador Eduardo Azeredo, que viria a ser presidente do PSDB. Sua
praia é outra, a do tucanato que considera falta de educação tratar das
maracutaias do andar de cima.
A principal gracinha propagada
pelos defensores de Eduardo Azeredo é a teoria do "não sabia". Se ele
não sabia que sua campanha era
azeitada por recursos tungados à
Viúva e entregues a Marcos Valério,
qualquer tentativa de associá-lo à
roubalheira é injusta. Afinal, Lula
diz que não sabia das mesmas trambicagens, praticadas quatro anos depois pela direção do PT com o mesmo Marcos Valério. Nas palavras da
assessoria do tucano: "As questões
financeiras da campanha não foram
de [sua] responsabilidade".
Seria um caso clássico de dois pesos e duas medidas. Todavia, o argumento é falso. Para que fosse verdadeiro, precisaria aparecer um empréstimo pessoal de R$ 511 mil, feito
por Lula junto a um petista amigo
que participou da coordenação de
sua campanha. (Em 2003, Paulo
Okamotto, atual presidente do Sebrae, pagou uma conta de R$ 29 mil
de Lula, mas não esteve na banca petista de 2002.) Isso não permite sugerir que Lula não sabia dos malfeitos de Delúbio Soares, ou que não
sabe de onde veio o dinheiro de Okamotto. Indica apenas que não se
acharam as suas impressões digitais.
No caso de Azeredo, elas estão lá, no
empréstimo de Mares Guia.
Quando um petista é confrontado
com as mutretas de seus companheiros, se enraivece e atribui a referência a algum tipo de conspiração
elitista. Quando um tucano fica na
mesma situação, ofende-se e corre
para a blindagem do silêncio. Assim
desconversou-se em 2000, quando
apareceram as planilhas da segunda
campanha de FFHH. Elas indicavam um caixa clandestino de pelo
menos R$ 8 milhões. Uma parte desse dinheiro passara pela destilaria
de Marcos Valério, cuja tecnologia
financeira foi adquirida pelo PT na
eleição seguinte.
Vice-governador de Eduardo
Azeredo, ministro de Lula, Mares
Guia é uma encruzilhada de gentilezas. Foi na sua vizinhança (e de Lula) que se disparou a demissão do
engenheiro Dimas Toledo de uma
diretoria de Furnas. Essa foi a faísca
que incendiou os sentimentos do
deputado Roberto Jefferson e a crise do mensalão.
O PT já buscou a indulgência de
seus crentes com a teoria do "fizemos-o-que-todo-mundo-faz". A novidade no desdobramento das investigações do mensalão tucano está
na paralisia mental do PSDB.
O comando tucano diz que vai discutir a situação de Azeredo. Vai nada. Se falasse sério, teria feito isso há
dois anos. Correm atrás do prejuízo
que poderá advir de uma denúncia
do procurador-geral da República
contra o ex-governador.
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