São Paulo, sábado, 26 de outubro de 2002

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PT

Candidato avalia que partido amadureceu, aposta no "efeito Lula" na reta final e defende a política petista de alianças

"Aprendemos com os erros", diz Genoino

DA REDAÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL

José Genoino, 56, deputado federal, é o primeiro candidato do PT ao governo do Estado de São Paulo a chegar ao segundo turno das eleições. Avalia que o partido amadureceu com os erros e está preparado para o poder. "O PT não é um partido perfeito. Há momentos em que nós erramos. E nós aprendemos com os erros. Mas, no fundamental, a história do PT o credencia para ser essa alternativa de poder que a população está legitimando", diz. Ex-preso político e ex-guerrilheiro, Genoino aposta no "efeito Lula" para captar votos de última hora e fazer as urnas, mais uma vez, contrariarem as pesquisas no maior colégio eleitoral do país. "Sou de um time. Nunca fiz política sozinho. O meu time é o PT, o Lula. Sou parte de um projeto, que é mudar o Brasil", diz ele. Em entrevista à Folha na última segunda de manhã, antes de receber o apoio do adversário histórico Paulo Maluf (PPB), Genoino defendeu a ampla política de alianças costurada por seu partido para tentar chegar à Presidência e criticou a propagação do medo como estratégia eleitoral. "Todas as vezes em que a humanidade quis mudar, evocou-se a tese do medo, do caos e da desconfiança para intimidar as pessoas." Evitando declarações polêmicas, ele limitou-se às críticas ao adversário Geraldo Alckmin, que avalia ser "pequeno de idéias" para o tamanho de São Paulo. Leia a entrevista: (FC, AI, SC e AG)

Folha - O sr., que foi a todos os debates, como vê a postura de Lula, candidato do seu partido à Presidência, que se recusou a fazê-lo?
José Genoino -
O Lula fez uma quantidade muito grande de debates e entrevistas no primeiro turno. No segundo turno, o tempo é curto, e nós, do PT, temos uma responsabilidade a mais. Além de eleger Lula, nós estamos disputando em oito Estados.
Se ele fosse a todos os debates, não poderia fazer campanha nos Estados, o que seria um prejuízo.

Folha - Não ir a debates não prejudica o esclarecimento do eleitor?
Genoino -
As pessoas conhecem o PT, conhecem o Lula. É a quarta eleição nacional que ele disputa. Portanto não há prejuízo nenhum, porque as propostas do PT já são conhecidas. Em relação à insistência do nosso adversário, em 98 a palavra de ordem era fazer debate e não houve nada.

Folha - O PT fez críticas ao pronunciamento da atriz Regina Duarte no programa de José Serra. O sr. não acha que o patrulhamento não contribui para a democracia?
Genoino -
Vamos separar o joio do trigo. O PT não está fazendo patrulhamento nem censura. A emenda constitucional que aboliu a censura é de minha autoria.
A Regina Duarte tem o direito de dizer o que ela quiser. Mas eu tenho o direito de dizer que eu fico triste de ver uma pessoa fazer campanha propagando o medo.
Quando eu conheci Serra no Congresso Nacional, ele carregava um livro: "Retórica da Intransigência", do Albert Hirschman. Disse: "Olha, Genoino, você não lê inglês, mas quando esse livro sair em português, faça questão de lê-lo". Diz que em todas as vezes que a humanidade quis mudar, evocou-se a tese do medo, do caos e da desconfiança para intimidar as pessoas. Eu nunca usei nem nunca vou usar a propagação do medo para mudar a cabeça das pessoas.

Folha - Mas na TV o sr. aparece dentro de um carro blindado atingido por tiros. Não é um apelo a partir da insegurança, do medo?
Genoino -
Não, não. Não estou propagando o medo. Estou mostrando uma realidade para apresentar uma proposta política.

Folha - O nome do seu programa de segurança -o "Linha Dura"- causou algum constrangimento no PT. De quem foi a idéia?
Genoino -
A idéia foi minha. O "Linha Dura" é um sistema integrado de segurança pública que usa a força, que é diferente da violência. Em relação a algumas opiniões de pessoas do PT -que não são todo o PT nem são a maioria do PT-, eu respeito, como elas me respeitam. Se eu fizesse política preocupado com termos, eu não teria chegado aonde cheguei.

Folha - O sr. não quer explicar o que é a operação "Linha Dura"?
Genoino -
É um sistema de segurança pública que começa com duas vertentes: a intervenção social do Estado nas áreas controladas pelo crime e a presença física da polícia. É preciso ter uma presença social e o uso da força física, intimidatória, concreta.
No Brasil, nós não temos polícia comunitária. O modelo mais adequado é o da França, que se chama polícia de proximidade. Ela não entra em conflito com o bandido. Fica ali para se comunicar com a força especializada. O que articula isso? Uma central de inteligência, que não existe em São Paulo. Um sistema de rádio que não seja interceptado, um sistema de computação que integre a PM e a delegacia, um mapa do crime.

Folha - Mas na TV é só ""Linha Dura", Rota na rua, tiro. Por quê?
Genoino -
Essa palavra de ordem, "Rota na rua", nunca saiu dessa boca aqui. O repórter perguntou: "A Rota no seu governo vai existir?". Eu disse: "Vai, para cumprir missão especial, com comando especial". Ela vai para a rua em alguns momentos e em outros não. Rota, GOE, Gate e Garra são forças especiais. Não servem para fazer ronda, para ficar na rua. A polícia tem que ter um tripé articulado: prevenção, inteligência e repressão.

Folha - No começo da campanha o sr. defendia os direitos humanos de presos, mas não voltou ao assunto no horário eleitoral. Isso pode assustar os votos conservadores, dos quais hoje o sr. depende?
Genoino -
O direito humano básico é o direito à vida. Quando eu falo que a polícia pode ser enérgica, é com base no Estado democrático de direito. A polícia não precisa sair matando.

Folha - Mortes são inevitáveis na ação enérgica da polícia?
Genoino -
Isso aí não é da minha boca que você vai tirar. Vou ser franco, olho no olho. O que é inevitável é ter uma polícia forte, que não deixa acontecer a tragédia.

Folha - O sr. sempre criticou a "política de condomínio" do PSDB, em que sempre cabe mais um nas alianças. Agora, dizendo que amadureceu, o seu partido fez uma aliança bem larga para tentar garantir a eleição do Lula. O PSDB amadureceu antes?
Genoino -
Quero responder sobre a minha candidatura.

Folha - O PT sondou o Maluf.
Genoino -
Mas não estou fazendo aliança com o Maluf. É um dever nosso pedir votos aos adversários. A base do nosso programa é uma aliança de esquerda com as forças progressistas que fazem oposição ao poder que está aí. Apoio e declaração de voto você recebe e não pode recusar.

Folha - O PL é força progressista?
Genoino -
Não, o PL está nos apoiando no segundo turno. Estamos recebendo o apoio do PL numa aliança política pontual. Nós não cedemos nada do programa nem de coisa nenhuma. E Lula fez a mesma coisa. Lula não está cedendo nada do programa.

Folha - Lula cedeu a Vice-Presidência ao PL, o que não é pouco.
Genoino -
Mas, se há uma coisa que o PT fez certo, foi dar a Vice-Presidência para José Alencar. Zé Alencar é muito maior do que o PL. É uma figura admirável. Não tinha um vice melhor.

Folha - Outro assunto recorrente na sua campanha são as críticas à progressão continuada no Estado. No entanto a ex-prefeita Luiza Erundina, então no PT, foi quem primeiro adotou o modelo.
Genoino -
Progressão continuada, sim. O aluno aprende, passa de ano sabendo. Aprovação automática, não. E o que existe em São Paulo é aprovação automática: o aluno passa sem ser avaliado porque há muitos alunos por sala.

Folha - No caso da educação, as bancadas do PT sempre foram contra a inclusão dos inativos nessa conta. Mas, quando a prefeita Marta Suplicy assumiu, ela usou esse mesmo expediente e ainda incluiu uniformes, transporte e programas sociais. O sr. fará o mesmo?
Genoino -
A educação tem que ser vista dentro de uma visão integral. Não é professor, sala de aula e aluno. É a idéia do desenvolvimento, de dar condições ao desenvolvimento do aluno. Isso é educação. Sobre os inativos, nenhuma prefeitura -nem do PT nem de outro partido- tem hoje condições de tirar os inativos.
A divergência com alguns companheiros é a questão do uniforme, do transporte. Eu defendo.

Folha - O sr. vai incluir transporte, material, uniforme e programas sociais na conta da Educação?
Genoino -
Vou, já falei.

Folha - Marta, para fazer isso, tirou dinheiro da construção e da reforma de escolas e de creches. O que é mais importante: dar uniforme e transporte ou colocar todas as crianças na escola?
Genoino -
As duas coisas são importantes. O Estado tem condições de fazer as duas coisas. Eu não quero governar São Paulo com o constrangimento desse Orçamento. Eu quero, com o crescimento, com a mudança desse modelo econômico, que São Paulo tenha uma arrecadação e um investimento maiores.

Folha - E se não houver aumento da arrecadação, qual a prioridade?
Genoino -
Eu não vou trabalhar com o "se". Se eu trabalhar com o "se", a política fica sem graça.

Folha - Mas o sr. está trabalhando com o "se" houver aumento. Aliás, com o "se" for governador.
Genoino -
Eu não estou trabalhando com o "se" for governador. Eu trabalho com a vontade de governar São Paulo.

Folha - E se só tiver dinheiro para uma coisa, qual será a sua prioridade: colocar todas as crianças na escola ou dar transporte e uniforme?
Genoino -
As duas coisas. Eu acho que dá para fazer. Eu vou criar condições de dinheiro para as duas. São Paulo entra com 42% dos impostos federais. Você precisa de um governo que defenda melhor os interesses de São Paulo para que os repasses sejam maiores para a educação, a saúde etc.
Nós vamos exigir esses recursos. Vamos discutir as transferências. Os índices de riqueza de São Paulo não podem ser absolutizados, porque temos índices sociais que não são considerados.
Eu tenho dito para Lula que há duas coisas que eu quero discutir como governador: o Banespa e a Ceagesp. O valor da venda do Banespa seria abatido da dívida de São Paulo, mas eles abateram só o valor avaliado, não o ágio. São R$ 5,2 bilhões que não foram abatidos. Eu não quero desestatizar o Banespa, quero apenas que abatam. A segunda questão é a Ceagesp, que federalizaram e não sabem o que fazer com ela. Vai morrer de "morte morrida". Temos de recuperá-la.

Folha - Como o governo vai acomodar tantas reivindicações e cumprir metas fiscais pesadas?
Genoino -
Não é reabrir a negociação da dívida. É você fazer um processo de compensação. Por exemplo: a presença do BNDES no Estado de São Paulo é, proporcionalmente, muito pequena. Podemos pensar nisso.

Folha - A Lei de Responsabilidade Fiscal foi um avanço?
Genoino -
Oitenta porcento dela.

Folha - E não seria justo o PT ter votado a favor dela já que discordava de apenas 20% do texto?
Genoino -
O PT governa desde 88 e nunca praticou farra fiscal. Nós só votamos contra por um item. Há uma indexação do endividamento com os juros e não há uma indexação de flexibilidade para programas sociais em situações de emergência.

Folha - Mas, mesmo sendo um avanço, o PT votou contra porque não ficou exatamente como o PT queria. Não é uma postura radical?
Genoino -
Não, não é radical, não é uma birra. Nós focalizamos uma questão central: para os juros, o bezerro de ouro é intocável; para a vida das pessoas, não. Nós pedimos apenas um tratamento igualitário. É verdade que a gente até modificou muitos aspectos da lei, mas votamos contra porque houve uma intransigência do governo nesse ponto.



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