São Paulo, quinta-feira, 26 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006/ CRISE DO DOSSIÊ

PF ignorou regra interna ao não exibir dinheiro

Desde agosto de 2004 há instrução para mostrar quantias apreendidas

Instituição sustenta que decisão foi tomada para não prejudicar investigações e para evitar o uso eleitoral das imagens do dinheiro


RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO

A Polícia Federal descumpriu a instrução normativa 006/DG/DPF -assinada em 26 de agosto de 2004 pelo seu próprio diretor-geral, Paulo Lacerda- ao proibir a apresentação de imagens do dinheiro apreendido com ex-petistas na operação do dossiê contra o candidatos do PSDB.
O documento, que "institui a política de Comunicação Social do Departamento de Polícia Federal", determina que materiais apreendidos sejam exibidos para ilustrar reportagens e evitar estimativas equivocadas.
O inciso VII do artigo 31 da norma é explícito: "Em consonância com os princípios, diretrizes e fundamentos jurídicos e regimentais da política de Comunicação Social do DPF, deverão ser adotadas as seguintes condutas na divulgação: A apresentação de material apreendido em operações policiais, visando ilustrar reportagens, evitando-se em tais atribuir-se valores estimativos."
A instrução descumprida está em vigor, segundo a assessoria de imprensa da PF e delegados consultados pela Folha.
Durante a crise desencadeada pela prisão de implicados na compra do dossiê, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, alegou diversas vezes que a PF não exibiria imagens do dinheiro pois não se envolveria em questões eleitorais.
Em setembro, disse: "Existe uma vontade de exploração política desse fato, que quer gerar imagem para prejudicar claramente a campanha presidencial do presidente Lula, que está com 50% dos votos. (...) Não vamos admitir isso. Não adianta querer gerar imagem só porque a oposição quer. (...) Hoje não é mais como naquele tempo em que se faziam imagens para jogar na TV e destruir candidaturas. Ninguém está fora nem acima da lei."
O delegado federal Edmilson Bruno, que dirigiu a operação inicialmente e depois vazou as fotos da pilha de dinheiro, está afastado. Segundo a regra, porém, ele cumpriu as "condutas na divulgação" expressamente determinadas e em vigência.
Em 5 de setembro, dez dias antes da apreensão do R$ 1,7 milhão, o mesmo artigo 31 da instrução normativa 006 foi usado na defesa do ex-diretor-executivo da Superintendência do Rio Roberto Prel, em outro caso, acerca a apresentação de dinheiro à imprensa.
Trata-se do furto de cerca de R$ 2 milhões -retidos em operação contra tráfico internacional de drogas- dentro da sede da PF no Rio, em setembro de 2005. Prel foi acusado de peculato culposo (por negligência).
Então superintendente em exercício no Rio, Prel apresentou o dinheiro à imprensa e perdeu o prazo de depositá-lo no banco, deixando o dinheiro em cofre da PF. Os R$ 2 milhões foram furtados, e só se recuperou 40% até hoje. A Promotoria denunciou Prel.
A alegação do cumprimento da instrução normativa foi um forte motivo para a Justiça recusar a denúncia, na opinião do procurador da República no Rio Gino Liccione, que atuou no caso e recorre agora.
Para justificar a não-apresentação do dinheiro do dossiê, a assessoria de imprensa da PF alegou que a corporação se baseou no artigo 6º, inciso terceiro da instrução normativa, que permite vetar a exibição de imagens prejudiciais às atividades de inteligência policial.
Confrontada com o fato de que já era de conhecimento público o montante apreendido, a assessoria afirmou que a recusa em mostrar o dinheiro se deveu a evitar o uso eleitoral das imagens do dinheiro.
Procurado, o Ministério da Justiça não havia se manifestado até a conclusão desta edição.


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