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GASTO SOCIAL
Projeto de Orçamento para 2001 não prevê verba para programa
Governo corta distribuição de cestas básicas a pobres
MARTA SALOMON
SECRETÁRIA DE REDAÇÃO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A distribuição mensal de cestas
de alimentos a cerca de 8,6 milhões de pessoas que moram em
bolsões de pobreza, assentamentos rurais e comunidades indígenas será suspensa em pouco mais
de um mês por decisão do governo. Até agora não foi criado substituto para o programa.
O Prodea (Programa de Distribuição de Alimentos) foi cortado
do Orçamento da União para
2001 e não pode mais ser ressuscitado no Congresso mediante
emendas de parlamentares. Sem
autorização legal para gastos, o
programa deixa de existir.
O corte de verbas do Prodea significa, na prática, o fim de um
programa listado entre as prioridades do ""Avança Brasil" -documento que reúne os compromissos de campanha da reeleição
do presidente Fernando Henrique Cardoso. O objetivo era diminuir a parcela da população que
não tem renda suficiente para comer. ""A persistência de focos de
fome e miséria extrema no Brasil
é motivo de vergonha e indignação. Isso vai acabar", afirma o documento.
Distribuir cestas de alimentos
não é apenas uma promessa de
campanha. O compromisso virou
lei ao ser reiterado no ano passado no PPA (Plano Plurianual),
uma espécie de superorçamento
que o governo prepara para um
período de quatro anos.
O PPA prevê a distribuição de
cestas básicas ""em focos agudos
de fome" até 2003, ano em que
FHC não estará mais no Planalto.
No período, são previstos gastos
de R$ 489 milhões no Prodea.
Isso é menos de 65% do custo
estimado por eleição da proposta
de financiamento público das
campanhas políticas de acordo
com o projeto em discussão no
Congresso. Sairia também mais
barato que o valor proposto para
investir no ano que vem em obras
consideradas irregulares pelo Tribunal de Contas da União.
O cálculo teria de considerar
que o programa gastaria todo o
dinheiro reservado para ele no
PPA, o que raramente acontece.
No Orçamento deste ano, por
exemplo, da dotação de R$ 100,5
milhões, foram liberados até a última quinta-feira R$ 38,7 milhões.
A um mês do término do ano, o
programa desembolsou menos
de 40% do gasto autorizado, segundo dados do Siafi (Sistema Informatizado de Acompanhamento de Gastos Federais).
Decisão discreta
O fim do Prodea é uma decisão
tomada discretamente pelo governo antes mesmo de definir
uma alternativa ao programa que
considera exageradamente assistencialista, socialmente equivocado. ""O programa mata a fome,
mas não ajuda a diminuir a pobreza nem estimula a economia
das regiões mais carentes", avalia
Osmar Terra, secretário-executivo da Comunidade Solidária.
O grupo de estudo que analisa
alternativas ao Prodea ainda não
chegou a uma conclusão, informa
a Casa Civil da Presidência da República, que coordena os trabalhos. Uma das propostas em estudo é permitir que os beneficiados
comprem mercadorias nos próprios municípios em troca de serviços prestados à comunidade.
São dois os argumentos principais do governo para pôr fim ao
programa. O primeiro deles é que
a distribuição gratuita de alimentos estaria prejudicando o comércio local nos 1.350 municípios
atendidos pelo Prodea, já que parte das compras é feita mediante
leilões eletrônicos em bolsas de
mercadorias e não diretamente de
pequenos produtores.
O outro é que as famílias beneficiadas tendem a se acomodar numa situação de pobreza disfarçada. Em vez de uma ajuda emergencial, a distribuição de alimentos seria uma forma de assistência
permanente e pouco eficaz.
A tese do governo é contestada
por pesquisa feita pela Conab
(Companhia Nacional de Abastecimento), estatal que administra o
Prodea e é vinculada ao Ministério da Agricultura. A empresa entrevistou mais de 36 mil das 1,7
milhão de famílias atendidas pelo
programa, além de prefeitos e varejistas dos municípios mais atingidos pela fome.
Resultados preliminares dessa
pesquisa mostram que 65% dos
varejistas avaliaram que a distribuição de cestas não afeta o seu
comércio. Dos prefeitos, 86% têm
a mesma opinião, endossada por
92% das famílias entrevistadas.
Na mesma pesquisa, 96% das
famílias afirmam que o programa
melhorou sua qualidade de vida, e
foi computado até impacto positivo no desempenho escolar. As famílias atendidas ainda convivem,
porém, com graves problemas de
falta de saneamento básico.
A página eletrônica da Conab
reconhece que o programa não
resolve a fome, mas faz uma ressalva: ""Não (é solução), apenas
cumpre o papel de minorar as dificuldades existentes. Enquanto o
"ensinar a pescar" não produz os
resultados esperados, o Prodea é
uma alternativa a mais do governo para fazer chegar comida a
quem tem fome".
Projeto inicial
O Prodea foi criado em 1993,
durante o governo Itamar Franco.
Na ocasião, pretendia atender populações atingidas pela seca.
Desde o início do governo Fernando Henrique Cardoso, o Prodea foi considerado um dos itens
da agenda básica do programa
Comunidade Solidária e dirigido
aos municípios selecionados de
acordo com o Mapa da Fome
-um estudo do Ipea (Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada)
que localizou os principais bolsões de pobreza do país.
O programa experimentou sua
fase mais próspera no ano da reeleição de FHC, quando foi estendido a municípios atingidos pela
seca e chegou a distribuir quase 30
milhões de cestas.
O ajuste nas contas públicas no
ano seguinte determinou a suspensão da distribuição das cestas
por três meses. É provável que
muitos municípios voltem a ficar
sem as cestas neste final de ano
por falta de repasse de verbas.
A composição da cesta também
tem variado bastante nos últimos
anos. O objetivo nunca foi proporcionar uma dieta equilibrada e
rica em nutrientes, mas lançar
mão dos estoques oficiais de alimentos e de compras de produtos
que não afetem a inflação para reduzir a fome.
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