São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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JANIO DE FREITAS

Entre a ação e o bocejo


A diminuição dos subsídios de quase todos os gabinetes seria a mais decente das providências para iniciar a moralização do Congresso

UMA IMPORTANTE proposta para atenuar a desmoralização do Congresso, com prováveis reflexos saneadores nos Estados, tende a se perder caso não haja um movimento em seu apoio na opinião pública, a partir de imprensa, CNBB, OAB, ABI e outras entidades com poder mobilizador (embora pouco ou nada exercido nos últimos anos).
Motivada como contraproposta à articulação para mais aumentos dos vários ganhos de deputados e senadores, a idéia que reúne um pequeno grupo de parlamentares consiste em duas providências concomitantes: sustar a discussão do "reajuste" e instituir, por meio de uma comissão especial, os estudos necessários para sanear e racionalizar o gasto com os congressistas e com atividades injustificáveis da Câmara, como a sua rádio só para as cercanias de Brasília, e do Senado.
Em nenhum sentido, o que inclui o salarial, a função de deputado equivale à de ministro do Supremo Tribunal Federal, como não é superior à de ministro do Superior Tribunal de Justiça. Dispensa considerações, portanto, o absurdo da articulação para que os subsídios de parlamentares equiparem-se, com aumento de 91,5%, aos do STF e sejam superiores aos do STJ.
Diminuir os vencimentos de parlamentares, isso sim, seria saudável. O desconto das faltas injustificáveis, considerada a semana normal do funcionalismo, e a conseqüente diminuição dos subsídios de quase todos os parlamentares seria, a rigor, a mais decente das providências para iniciar a moralização do Congresso. Nenhum dos presidentes da Câmara e do Senado, em anos a perder de vista, mostrou estatura para aplicar o regime legal de presenças e vencimentos. E não é prudente supor que apareça algum, no futuro previsível. Quem seria capaz de fazê-lo, por isso mesmo, não se elege presidente no Congresso.
Mas a proposta de racionalização dos gastos atuais aborda práticas não menos despropositadas, e vários dos privilégios. Como a verba "indenizatória", à falta de nome ainda mais disfarçante; a mais recente verba "de gabinete" e, além de outras de igual teor moral, também lembra Fernando Gabeira os milhares de reais mensais, para cada parlamentar, a pretexto de gasto com selos na era da internet. São os diversos penduricalhos, assentados em justificativas falseadas, que levam o gasto mensal com cada deputado a quase R$ 100 mil. Gasto, convém lembrar, que não resulta da divisão da despesa total da Câmara pelo número de deputados, mas de gasto direto, pessoal, com cada um deles.
Fernando Gabeira, Eduardo Suplicy, Chico Alencar, Jefferson Peres, Heloísa Helena e Júlio Delgado iniciaram o grupo da contraproposta. Nenhuma surpresa nesses nomes, nem nos que vêm aumentar o grupo. Mas, cá de fora, qualquer passo que os apoie para valer, com ação, será muito surpreendente. O que é tão deplorável quanto mais parece que um punhado de parlamentares batalhadores pode iniciar a luta, mas a maneira mais provável de vencê-la seria outra. Seria o projeto popular, como a Constituição prevê, proveniente de movimento de opinião pública. Se houvesse, cá fora, quem acordasse para acordá-la.


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