São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2000


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GOVERNO

Queda de Calabi mostra força de ministro
Crise afirma estilo Malan de política

MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília

Apontado como um dos personagens que ganhou com a substituição no comando do BNDES, o ministro Pedro Malan (Fazenda) vem consolidando um modo de fazer política. Um estilo que ajuda a explicar sua longevidade no comando do Ministério da Fazenda -um recorde na história recente do país- e a expectativa crescente de que Malan poderá sair candidato à sucessão do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Mas a vitória de Malan com a saída de Andrea Calabi do BNDES e a indicação de Francisco Gros para o cargo pode não ter sido tão grande quanto pareceu durante a semana passada.
Como a substituição de Calabi foi acompanhada por medidas que fortalecem o Ministério do Desenvolvimento e seu titular Alcides Tápias, a manobra avalizada por FHC pode forçar Malan a aceitar ajustes -ou mais ousadia- na política econômica que defende com ênfase no ajuste das contas públicas.
Isso significaria, em outras palavras, o enquadramento de Malan, em vez de uma simples vitória sua no debate que trava no governo contra a corrente dita nacionalista, que defende empresas nacionais e uma abertura econômica mais ponderada.
Essa avaliação é sustentada por interlocutores de FHC que não têm Malan propriamente como um ídolo. Assessores de Malan insistem em negar que o ministro tenha ascendência sobre o novo presidente do BNDES. Garantem também que será o melhor possível o relacionamento do chefe com Tápias, que pretende tirar poder do Ministério da Fazenda sobre comércio externo.
Sobre esse estilo de Malan fazer política, cada vez mais temido na Esplanada, resume um amigo comum do ministro e de FHC: ""Cuidado com ele". Os que acreditam que Malan é apenas um burocrata, não sabe fazer política, nem tem apego ao poder, diz, estão enganados.
Sobre as consequências de suas quase sempre discretas movimentações, pode-se concluir que são poucos os adversários em confrontos diretos com Malan que conseguem resistir aos seus ataques.
O ministro da Saúde, José Serra, é uma exceção, apesar de já ter sofrido derrotas e ter deixado de interferir publicamente na discussão da política econômica, a pedido de FHC. Como seu principal trunfo contra Malan, Serra contabiliza a desvalorização do real, medida que defendia muito antes de vencer a resistência do ministro da Fazenda.
O ex-presidente do Banco Central Francisco Lopes e o ex-ministro Clóvis Carvalho são algumas das vítimas mais notáveis de Malan. Lopes ficou poucos dias no cargo depois de desafiar recomendações do FMI (Fundo Monetário Internacional) endossadas por Malan.
Carvalho, braço direito de FHC no Planalto durante o primeiro mandato, não resistiu no cargo de ministro do Desenvolvimento depois de defender mais ousadia na execução da política econômica. Malan não gostou.
Na troca do comando do BNDES, Malan não atuou diretamente pela queda de Andrea Calabi. Mas trabalhou para que o presidente o enquadrasse, principalmente depois que Calabi passou a defender restrições a empréstimos ao capital estrangeiro por parte do BNDES.
Com a demissão de Calabi, Malan ganhou motivos para comemorar o afastamento do governo de mais um opositor de sua política econômica. Motivo maior de comemoração é o fato de o demitido ser afinado com seu principal adversário, José Serra.
Há tempos, Serra deixou de dar palpites sobre política econômica publicamente. Mas não deixou de polemizar com Malan. A mais recente celeuma pública entre os dois teve como tema o reajuste dos preços de medicamentos.
FHC teve de intervir para acalmar os ânimos no mês passado, quando Malan e Serra já se desentendiam pelos jornais. O titular da Fazenda se referiu ao colega da Saúde como ""aquele ministro". Serra respondeu: ""Para mim, PM (as iniciais do ministro da Fazenda) significa prescrição médica".
Os dois se desentendem desde o início do primeiro mandato de FHC sobre a condução da política econômica. No início, a discussão era se o real deveria ou não ser desvalorizado. Agora, o mote do debate que tem Malan e Serra como principais pólos é a defesa das empresas nacionais.
Árbitro da polêmica sobre política econômica do governo, FHC comemora o fato de contar com Malan como guardião da confiança externa que a economia brasileira precisa. Mas acredita que, apesar do discurso pró-estabilização da economia, conseguirá atender às pressões por mais crescimento econômico e por uma abertura mais cautelosa.
A polêmica ameaça chegar à sucessão de FHC. Questionado sobre sua preferência, o presidente já declarou que quer ter um representante da área social do governo como candidato. Mas as declarações foram interpretadas por vários aliados de FHC como uma forma de preservar Malan dos ataques de uma campanha eleitoral precipitada.



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