São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2000


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ESTADO

Executiva estadual do partido proíbe militância de falar sobre "desvios de conduta" do governador
PT impõe silêncio a militantes no MS

PAULO PEIXOTO
da Agência Folha,

em Campo Grande


A executiva estadual do PT do Mato Grosso do Sul proibiu os militantes do partido de falar sobre os "desvios de conduta" do governador José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT, cometidos ao longo de um ano e dois meses da sua gestão.
Na última quarta-feira, em Campo Grande, na sede do partido, a executiva se reuniu e impôs o silêncio.
Só está autorizada a falar a presidente da legenda no Estado, Elza Aparecida Jorge.
A determinação está ligada ao constrangimento dos petistas em relação aos erros de Zeca.
Os militantes acham que os desgastes poderiam ser evitados, mas, ao contrário, eles prosseguiram.
"Estamos implantando a República do Mato Grosso do Sul com novos valores, pondo fim à oligarquia arraigada no Estado. Mas também somos frutos dessa cultura, nossos erros estão inseridos nesse contexto", disse o deputado federal Ben-Hur Ferreira.
O deputado, que pertence à direita do partido (Democracia Radical, corrente do deputado José Genoino-SP) e é pré-candidato do PT à Prefeitura de Campo Grande, disse que o governador é um "abnegado que fica muito triste" com os erros do seu governo e paga um preço alto por eles.
A presidente regional do PT-MS afirmou que o partido sabe que os erros "não podem empanar o governo" e que, por isso, toda a legenda está unida em torno de Zeca.
A proibição, segundo ela, tem o único propósito de conseguir "uma posição unânime para fazer a defesa do governo".
Não se questiona no interior do partido a capacidade de governar de Zeca, muito menos a sua determinação e o desempenho do seu governo, tido pela militância como de grande avanço social.
Programas como o bolsa-escola, aumento de receita em 32% e queda do custeio em 35%, além dos programas de desenvolvimento econômico, ambiental e de recuperação de estradas se tornaram temas do discurso do PT.
Mas as críticas pelos erros cometidos ao longo dos 14 meses de governo ainda são contidas, tanto na direita do espectro petista quanto no centro e na esquerda, que historicamente sempre foi a que mais se manifestou.



Nepotismo
O primeiro pecado do governador foi ter nomeado seis parentes para o governo, prática conhecida como nepotismo, que o PT em todo o país combate duramente, e que Zeca também condenava quando era deputado estadual. Em 1997, ele votou contra o nepotismo, mas o projeto foi derrotado no Legislativo.
As relações suspeitas com os empreiteiros, que Zeca condenava, foram a razão de outro pecado seu. Em janeiro deste ano, foi flagrado em Natal descansando com a família na casa de praia de um empreiteiro que toca a maior obra do Estado.
Ele se tornou amigo do empreiteiro após ser eleito.
Além disso, dois atos administrativos supostamente irregulares estão sendo analisados pelo Tribunal de Contas do Estado, mas os petistas rebatem com veemência qualquer insinuação de corrupção no governo.
O articulador da corrente centrista PT na Base, vereador Cabo Almi, disse que trata-se de uma gestão "extraordinária e íntegra", mas que "é preciso estar corrigindo o governo para que ele não se perca".
Essa correção tem sido feita pelo conselho político do PT no governo.
O governador às vezes é intempestivo na reação às críticas, o que serve para pôr mais lenha no fogo. No episódio do descanso em Natal, ele chegou a dizer que poderia até voltar à casa do empreiteiro, já que não havia nenhuma imoralidade no seu ato.
"Tudo isso poderia ter sido evitado. Como não foi, há uma reação forte. E nós nunca agimos no sentido de passar a mão na cabeça. A gente tem que ser muito tolerante com os nossos críticos, até porque somos duros na crítica", disse Ben-Hur.

César
Secretário do Meio Ambiente do governo e coordenador da corrente de esquerda Muda PT, Egon Krakhecke disse: "À mulher de César não basta ser honesta, tem que parecer honesta. É preciso ter cuidado com as interpretações que a sociedade vai dar".
Para ele, alguns episódios "acabam provocando constrangimentos no próprio governo".
O Executivo, segundo Krakhecke, deve ser "cauteloso" com o lobby empresarial que tenta se aproximar do governo e não pode incorrer em "erros de avaliação" como no caso do nepotismo.
As reprimendas a Zeca ultrapassaram as fronteiras do Estado. Após o descanso do governador no Nordeste, José Genoino disse que "não é recomendável um governador ter uma relação desse tipo com um empreiteiro". Para ele, o administrador público deve "criar uma muralha entre o público e o privado".
Valter Pomar, da direção nacional do partido, disse que o PT "nunca foi favorável a esse tipo de comportamento" e definiu como um ato de "ingenuidade" o envolvimento do governador na casa de praia nordestina.


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