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Estados maquiam gasto com pessoal para cumprir a LRF
Entre artifícios usados estão exclusão de despesas com pensões e supressão do IR pago
Diferentes aplicações da lei dificultam avaliação da real situação financeira dos governos diante da previsão de queda de arrecadação
CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL
ANA MARIA DE FREITAS
DA REDAÇÃO
Do Oiapoque ao Chuí. E, com
aval -ou até mesmo por força- de decisões dos tribunais
de contas, pelo menos 21 Estados adotam interpretações legais que aliviam, no papel, o peso dos gastos com pessoal. Da
exclusão de despesas com aposentados à supressão do Imposto de Renda pago, artifícios
acabam por maquiar o impacto
da folha sobre a arrecadação
para a apuração da LRF (Lei de
Responsabilidade Fiscal).
A LRF fixa diferentes tetos
de gastos com a folha de pagamento para os três Poderes.
Um governo estadual pode gastar, por exemplo, até 49% do
que arrecada com pessoal.
Superados os limites -aplicáveis ao Judiciário, ao Ministério Público, às Assembleias e
aos TCEs (Tribunais de Contas
Estaduais)- o Estado tem um
prazo de até dois quadrimestres para corte de gasto. Do
contrário, perde direito às
transferências voluntárias da
União e a empréstimos.
Mas as diferentes aplicações
da mesma lei podem dificultar
a avaliação do real comprometimento dos Estados neste ano
pré-eleitoral.
Uma delas é a retirada do Imposto de Renda do cálculo de
despesa. Como empregador, o
Estado paga ao servidor um salário bruto, do qual parte é retida para o IR. Só que, como são
os Estados que ficam com o dinheiro, alguns não o computam
como gasto nem como receita.
Em resposta a questionários
enviados pela reportagem a governos e TCEs, Rio Grande do
Sul, Paraná, Tocantins, Goiás e
Rondônia informaram que tiram o IR da conta.
Já o Rio Grande do Norte
chegou a ser alvo de ação do
procurador-geral junto ao
TCE-RN, Carlos Thompson
Fernandes, pela adoção da
mesma prática.
Secretário-executivo e titular do Ministério do Planejamento durante a implantação
da LRF, o hoje secretário estadual Guilherme Dias (ES) explica, com um exemplo hipotético, que a dedução pode funcionar como artifício para que o
Estado declare um comprometimento menor com pessoal.
Se um Estado arrecada R$
100 e gasta R$ 65 com pessoal,
sendo R$ 10 de IR, as despesas
somam 65%. Mas, se o Estado
excluir esses R$ 10, o percentual cairá para 61% (R$ 55 correspondem a 61% de R$ 90).
"Essas manobras são como
tirar o sofá da sala, porque a
baixa capacidade de investimento do Estado continua",
afirma Guilherme Dias.
Estados como Goiás e Rio
Grande do Sul não incluem os
gastos com pensões. E, a exemplo de Rondônia e Tocantins, o
TCE-MG exclui inativos e pensionistas do cálculo, sob o argumento de que "não podem ser
contingenciados [congelados]
pelos administradores".
Embora o secretário de Finanças de Minas, Simão Cirineu, afirme que o Estado declara os gastos com aposentadorias e pensões, os outros Poderes -inclusive o TCE- estão liberados. Com isso, Minas -onde até o Executivo chegou à beira do limite prudencial- viu
adiada a ameaça de retenção de
repasses ao governo do Estado.
Mas o próprio Cirineu reconhece que, com a queda de receita, o Estado está prestes a estourar o teto prudencial (de
46,55%), a partir do qual reajustes e contratações ficam
proibidos. "O gasto com pessoal vai aumentar. Porque a receita está caindo, mas as despesas com pessoal não", explica.
Na prestação de contas ao
Tesouro, o governo do Amazonas também não declara gastos
com inativos e pensionistas.
Inspirado na Paraíba, o TCE-RN concentra no Executivo os
registros de gastos com aposentadorias de outros Poderes.
E, no Rio de Janeiro, a decisão do governo de engrossar,
desde 2008, os cofres do fundo
de previdência com royalties
acabou afetando a relação do
pessoal sobre a receita. Como o
fundo cobriu os gastos com a
aposentadoria e pensões, o dinheiro -que chegou a R$ 4,3
bilhões no ano passado- não
foi registrado como despesa do
Estado com inativos. Mas foi
mantido entre a receita.
"Essa é uma incongruência
da lei. Mas, mesmo que se exclua da base essa receita, o Rio
fica bem abaixo dos limites",
alega o subsecretária de Política Fiscal do Rio, George André
Palermo, que chegou a fazer
um cálculo, segundo o qual o
gasto do Estado com pessoal
passaria de 23,91% a 27,64%.
No Espírito Santo e no Ceará,
o registro da "receita cheia"
-sem a declaração de benefícios fiscais concedidos- também alivia o impacto da despesa sobre a folha.
Além de excluir verbas indenizatórias, como diárias e auxílio-alimentação, Santa Catarina descarta as despesas com
"locação de mão-de-obra - serviços terceirizados".
Está aí um dos pontos mais
controversos. Pela LRF, "os
contratos de terceirização de
mão-de-obra que se referem à
substituição de servidores e
empregados públicos serão
contabilizados como "outras
despesas de pessoal". O manual
do Tesouro dispensa os contratos que não se refiram a atividades fins de Estado.
Com isso, Estados como São
Paulo, Piauí, Amapá, Mato
Grosso do Sul, Acre e Roraima
não declaram qualquer gasto
de mão-de-obra terceirizada.
"Não estamos substituindo servidores por terceirizados", justifica o secretário de Fazenda
do Estado de São Paulo, Mauro
Ricardo Costa.
"Um dos problemas no cumprimento dos limites de despesa com pessoal é a diversidade
de posicionamentos, todos visando sempre a flexibilizar os
parâmetros", disse Thompson.
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