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ENTREVISTA DA 2ª
Para presidente da Febraban, pré-candidato petista estava "com cara de light" em evento da CNI
Bancos acenam com apoio a Lula, se eleito
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
No debate com os presidenciáveis promovido pela CNI (Confederação Nacional da Indústria),
no início deste mês, um Luiz Inácio Lula da Silva (PT) descontraído e de tom moderado recebeu
muitos aplausos e arrancou risadas da platéia, composta por
grande parte dos maiores empresários do país.
E em um encontro com banqueiros e executivos do mercado
financeiro, teria o pré-candidato
petista o mesmo tratamento?
"Com certeza. Não há diferença
expressiva entre banqueiros, executivos do mercado financeiro e
empresários dos demais setores.
Todos somos iguais no sentido de
que almejamos um Brasil mais
justo, com crescimento e oportunidades de melhoria de vida para
todos."
A opinião é de Gabriel Jorge
Ferreira, 77, presidente da Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos), a entidade
de classe do setor bancário mais
respeitada do país. Ferreira, um
advogado (comanda o departamento jurídico do Unibanco)
com mais de 44 anos de banco, assistiu atentamente, na primeira fileira, aos discursos dos pré-candidatos no debate da CNI.
Ele diz que Lula, que "estava
com cara de "light'" (na CNI), se
eleito, terá a colaboração do setor
bancário, ""seja para reduzir os juros, para aumentar empréstimos
ou para tudo o que for necessário
para melhorar o Brasil".
Mas, não só em relação a Lula,
como a todos os outros pré-candidatos, o presidente da Febraban
tem preocupações relacionadas
"à política de alianças para assegurar a governabilidade e à forma
de execução da política de redução de juros", por exemplo.
Ferreira desfaz a idéia de que os
bancos querem a manutenção
dos juros altos, diz que o pré-candidato do PPS, Ciro Gomes, tem
de explicar melhor seu projeto de
reforma tributária e faz um pedido aos presidenciáveis, para que
tornem as propostas mais claras.
Sobre o financiamento privado
de campanha, o presidente da Febraban diz que não vê problemas
nas doações. No entanto Ferreira
defende o financiamento público
como ideal -um "fator de fortalecimento da democracia".
Na semana passada, por iniciativa de Ferreira, a Febraban iniciou, com o pré-candidato do
PPS, uma série de encontros com
os presidenciáveis. No início do
mês que vem, será a vez de Lula.
Leia a seguir a entrevista que
Ferreira concedeu à Folha na semana passada.
Folha - O sr. assistiu ao debate
dos pré-candidatos à Presidência
na CNI. O que achou da apresentação de cada um deles, tanto no aspecto político quanto no do conteúdo das propostas?
Gabriel Jorge Ferreira - As propostas foram genéricas, como era
esperado, e todos manifestaram
suas intenções de fazer um Brasil
melhor. [...] Todos almejam reduzir juros. A Febraban e os bancos
também querem.
A questão é como fazer isso de
maneira inteligente, atuando nos
diversos fatores responsáveis pelas altas taxas de juros, sem rupturas de contratos ou com intervenções que desestimulem os investidores ou que comprometam outras metas essenciais, como a estabilidade de preços.
Quanto mais altos forem os juros, mais elevados serão o custo
do crédito, os índices de inadimplência e o desemprego, pois haverá menos investimentos produtivos. [...] Para isso [redução dos
juros], é necessário que o candidato a ser eleito, seja ele quem for,
batalhe por uma política macroeconômica consistente, por uma
tributação justa e eficiente que
maximize receitas tributárias ao
longo do tempo.
Folha - Das propostas apresentadas, o sr. destaca um ou dois pontos que lhe agradaram (do ponto
de vista técnico) do programa de
cada um deles?
Ferreira - Destaco três pontos
que me agradaram: o equilíbrio
demonstrado pelos candidatos; o
compromisso de que se cumpram
os contratos, seja em relação à dívida interna ou externa, pois qualquer quebra de contratos só desmoralizaria e comprometeria o
futuro do país, e o compromisso
com a estabilidade da moeda, sem
o qual perderíamos a maior conquista do Brasil nos últimos anos,
a redução da inflação.
Folha - Quais propostas o sr. gostaria que os candidatos tivessem
detalhado mais?
Ferreira - Tenho especial preocupação com os seguintes assuntos: a política de alianças para assegurar a governabilidade; a autonomia do Banco Central para executar a política monetária de
combate à inflação; a forma de
execução da política de redução
de juros e a forma de assegurar
superávits fiscais e de ajustar o balanço de pagamentos.
Folha - Qual a sua avaliação da
proposta de reforma tributária
apresentada pelo pré-candidato
Ciro Gomes?
Ferreira - Essa proposta foi apresentada de forma muito genérica.
Precisamos ter mais informações,
especialmente em relação ao objetivo manifestado pelo candidato
de "onerar o consumo e os ganhos de capital e criar um imposto financeiro". Sem uma definição da base de incidência e da alíquota desses impostos, que permita mensurar seus impactos sobre a intermediação financeira e o
custo do dinheiro para os bancos
e os tomadores de empréstimos,
fica difícil uma avaliação.
Em princípio, todos somos favoráveis a uma tributação mais
justa, sem cumulatividade, que
estimule a produção. A questão é
termos uma proposta viável do
ponto de vista técnico e político, e
definir uma transição segura para
o sistema proposto.
Folha - O candidato do PT foi muito aplaudido pelos empresários na
CNI. No debate que será promovido
pela Febraban, o sr. acredita que
ele será aplaudido da mesma forma pelos banqueiros e executivos
do mercado financeiro?
Ferreira - De fato, ele foi muito
aplaudido mesmo. Ele estava
num dia muito feliz, estava descontraído, estava risonho, arrancou muitas risadas da platéia,
contou anedotas. Estava com cara
de "light" mesmo. Com certeza
[seria aplaudido também no debate da Febraban]. Não há diferença expressiva entre banqueiros, executivos do mercado financeiro e empresários dos demais
setores. Todos somos iguais no
sentido de que almejamos um
Brasil mais justo, com crescimento e oportunidades de melhoria
de vida para todos.
O papel dos bancos é fundamental nesse processo. Uma intermediação financeira eficiente
alavanca o sistema produtivo e o
crescimento do país. Lula é um
candidato que merece todo o nosso respeito e, se eleito, terá nossa
colaboração, seja para reduzir os
juros, para aumentar empréstimos ou para tudo o que for necessário para melhorar o nosso Brasil. Se mostrar propostas consistentes e bem fundamentadas para
alcançar esses objetivos, e outros
que são de interesse geral, provavelmente será aplaudido também
na Febraban.
Folha - O sr. considera correto
que os bancos estrangeiros recomendem a seus clientes que diminuam os investimentos em títulos
brasileiros por conta da posição
desse ou daquele candidato nas
pesquisas de intenção de voto?
Ferreira - É fundamental que as
opiniões desses profissionais não
sejam confundidas com as decisões de investimento das instituições nas quais trabalham.
Uma instituição financeira pode, inclusive, ter opinião contrária
à de seus analistas, mas ainda assim terá de preservar liberdade de
manifestação desses profissionais, essencial ao seu trabalho e
aos investidores. Essas instituições acreditam e investem no país
com uma visão de longo prazo. Já
a maior volatilidade observada no
mercado financeiro, em períodos
eleitorais, é um fenômeno comum em eleições, sejam no Brasil
ou em outros países.
Folha - Se o Lula detalhasse mais
suas propostas econômicas, o mercado financeiro poderia ter uma
avaliação mais positiva de sua candidatura?
Ferreira - Certamente o mercado poderia ter uma avaliação
mais acurada das suas propostas.
Mas isso vale para todos os candidatos. A falta de detalhamento
dos planos de governo dos candidatos dá espaço a incertezas que
permitem projeções otimistas ou
pessimistas. O detalhamento é
importante para todos os candidatos, por um lado, para diminuir
incertezas e, por outro, para permitir uma escolha melhor no dia
da eleição.
Folha - O candidato tucano José
Serra disse que a síntese de seu
programa é produção e emprego.
Em sua avaliação, esse é o caminho
correto a ser seguido pelo próximo
governo?
Ferreira - Esses são objetivos comuns a todos os candidatos. Todos queremos mais produção,
mais emprego, mais exportações,
menos miséria etc. A questão é ter
um plano consistente, do ponto
de vista técnico, e aceitável, politicamente. Estamos certos de que
os candidatos procurarão apresentar planos com essas características antes das eleições.
Folha - Os bancos registraram lucros expressivos durante os dois
mandatos do presidente Fernando
Henrique Cardoso devido, entre
outros fatores, aos juros altos. Se o
próximo governo priorizar o setor
produtivo, incluindo redução dos
juros, o ambiente pode ser desfavorável para o setor financeiro?
Ferreira - Correlacionar a taxa
de juros altos como fator responsável pelo lucro dos bancos eu
acho que não é um raciocínio correto. Sem dúvida nenhuma, acho
que, se tivermos uma política monetária consistente, que consiga
reduzir as taxas de juros dentro
daqueles cuidados, sem rupturas,
sem causar nenhuma insegurança quanto à preservação de contratos ou sem promover qualquer
tipo de ato que desestimule investimentos, será muito benéfico para a economia.
Quanto mais altos forem os juros, mais elevado o custo do crédito, mais alta a inadimplência e o
desemprego.
Folha - O sr. acredita que, dependendo do candidato eleito, o Brasil
pode se transformar em uma Argentina?
Ferreira - Eu acho que já respondi a essa pergunta nas questões
anteriores.
Folha - Os bancos estão entre os
principais doadores de campanha
do país. O que o sr. acha do financiamento privado de campanha no
Brasil, é algo que corresponde ao
processo democrático?
Ferreira - As regras que estão aí
hoje são claras, permitem contribuições de campanha. [...] Não
vejo nada de errado, não. Dentro
das regras, dos limites que a legislação prevê, porque essa é a legislação que nós temos.
Mas o ideal para isso é o financiamento público de campanha,
mas nós ainda não chegamos lá.
Acho que o financiamento público de campanha é, sem dúvida
nenhuma, um fator de fortalecimento da democracia.
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