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JANIO DE FREITAS
Silêncios e cobranças
Os brasileiros defensores dos
direitos humanos e dos direitos civis devem muito a
Jimmy Carter, que, na Presidência dos Estados Unidos, não
poupou meios diplomáticos de
pressão contra as barbaridades
da ditadura militar no Brasil.
Tornou-se odiado pelos comandos do regime, e particularmente por Geisel, então no poder.
Mas, quando lhe pareceu necessária a ação mais explícita, Carter não falou nem agiu pessoalmente. Mandou ao Brasil sua
mulher, Rosalyn, que remediou
a situação dos religiosos católicos sob crescente ferocidade dos
militares e seus agentes civis
(entre eles, alguns que hoje posam de democratas e íntegros no
Congresso).
Para todos os efeitos práticos,
Rosalyn Carter representava o
presidente Carter. Mas não representava o Estado norte-americano. O inteligente truque dos
Carter mostra que não é simples, nem mesmo quando se trata de uma superpotência em relação a um país secundário, a
ingerência do representante
maior de um Estado em assunto
interno de outro Estado.
Os pronunciamentos que muitos têm cobrado de Lula, nas visitas a Cuba e à China, não se
comparam ao caso de Carter
com o Brasil. Mas a essência é
muito semelhante, pela necessidade de um e outro considerarem, nas circunstâncias e acima
de tudo, os interesses dos seus
respectivos Estados.
Seja o que for que Lula pense
dos direitos civis e dos direitos
humanos em Cuba e na China,
e não faço idéia do que pense,
importante é que balize sua atitude pelos interesses brasileiros
legítimos. O que não impede,
forçosamente, cobranças por
pronunciamentos políticos nos
países visitados, mas desde que
tais cobranças indiquem fundamentação que vá além da satisfação com algumas palavras
sem mais efeito do que a retórica. De retórica que não chega
aos atos e manifestações que
não ultrapassam a própria festividade, no Brasil mesmo já temos para todos os gostos.
No caso da China, não há fundamentação para a cobrança.
Tratou-se, apenas, de ir, aceitando as realidades chinesas em
nome de conveniências comerciais e de política internacional,
ou não ir por não as aceitar. Ir
para criar um caso seria estúpido, nada mais.
Se não for assim, pelo menos
não esqueçamos que Fernando
Henrique Cardoso foi a Cuba, e
os cobradores de Lula não lhe fizeram as mesmas cobranças.
Fernando Henrique Cardoso foi
à China, em viagem sobretudo
de turismo oficial, e não de negócios como a atual, mas os cobradores de Lula não lhe fizeram as mesmas cobranças. E o
pior: Fernando Henrique Cardoso fez questão de ir à posse do
reeleito Fujimori, que fechara o
Congresso no decorrer do primeiro mandato, instaurara a
censura e prendera seus principais opositores políticos -e lá
Fernando Henrique Cardoso
definiu-o publicamente como
"um grande democrata". Mas
os cobradores de Lula nada lhe
cobraram então ou depois sobre
o hoje fugitivo Fujimori.
O tratamento equânime é
uma forma de respeitar e aplicar os direitos civis e os direitos
humanos.
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