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ELIO GASPARI
Uma nova postura: ministros agachados
Marinho e Furlan festejaram Lula em um jantar de magnatas numa posição que o cerimonial não prevê
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A HISTÓRIA fez uma trapaça com
"nosso guia". Na semana em que
morreu Joe Rosenthal, o autor
da foto da colocação da bandeira americana no topo do monte Suribachi, em
Iwo Jima, dois ministros do seu governo fizeram-se fotografar por André
Dusek agachados, aos pés de alguns
magnatas da indústria.
Agacharam-se os ministros Luiz Marinho, do Trabalho (repetindo, Trabalho), e Luiz Fernando Furlan, do Desenvolvimento. De pé, ficaram Lula e
outros nove convidados do jantar oferecido por Furlan ao patronato. Nenhum empresário se agachou. Entre
eles estavam Roger Agnelli (Vale) e Horácio Lafer Piva (Klabin).
Há fotografias que congelam instantes, como a de Kennedy em Dallas.
Há outras que preservam sentimentos.
Rosenthal captou uma cena plasticamente linda. Um gesto anônimo e
pouco relevante encarnou o triunfo
americano. (A batalha pela ilha estava
longe do fim e quatro dos soldados
fotografados morreriam antes que
ela acabasse.)
Os ministros agachados estiveram
numa situação diferente. Agacharam-se para sair melhor na fotografia onde
estavam "nosso guia" e os magnatas.
Ninguém achou impróprio, pois o grupo mostrou-se feliz e risonho. Há poucos dias, quando um hierarca do Ministério da Fazenda falou em "baixar as
calças", foi considerado um mal-educado. Pode ser, mas o cerimonial da Presidência não prevê que ministros do governo da República se agachem, muito
menos que o façam abaixo da linha da
cintura de empresários.
Marinho entrou na fotografia de um
ágape do grande patronato no mesmo
dia em que a Volkswagen ameaçou fechar a sua fábrica de São Bernardo do
Campo, aquela em cujo refeitório jantava, como operário.
Os americanos abriram um tesouro
O Arquivo Nacional americano colocou um tesouro na
internet. São 5.000 documentos da sua diplomacia no Brasil durante a ditadura. Cobrem os anos de 1973 e 1974
e contêm preciosidades. Revelam telegramas do embaixador John Crimmins mostrando a Washington que a intransigência da política nuclear
americana acabaria afastando
o Brasil dos Estados Unidos.
Documentam a virada da
política de apoio aos porões
militares.
Meia dúzia de telegramas
lembram a esquecida figura
de Frederic Chapin, cônsul
em São Paulo nos anos 70. Era
um presbiteriano praticante.
Em 1976, tentou impedir a
operação que matou os comunistas Pedro Pomar e Angelo
Arroyo numa casa da Lapa.
Veio à tona um telegrama
de Chapin, do dia 8 de maio de
1973, intitulado "Prisões políticas e tortura em São Paulo".
É pau puro, denunciando assassinatos, choques elétricos e
paus-de-arara. Mostra que
havia um "padrão" de extermínio de presos considerados
perigosos. Entre 1969 e 1971, a
Embaixada em Brasília mentia para Washington. (Ou
Washington preferia ter em
Brasília uma Embaixada que
não contasse o que sabia.)
Narrando um arrastão
ocorrido na USP e o assassinato de um estudante, Chapin
revela que Roberto Civita, dono da editora Abril, encontrou-se com um funcionário
do consulado, narrou a dureza
da censura e previu que os
protestos contra a repressão
militar culminariam "numa
missa que acabará com todas
as missas" em defesa dos direitos humanos.
Chapin comentou que "provavelmente isso é um exagero". Era exagero profético.
Dois anos depois, diante da
morte do jornalista Vladimir
Herzog, D. Paulo Evaristo celebrou na catedral da Sé um
culto ecumênico que se tornou a missa que acabou com
todas as missas.
SERVIÇO - Chega-se à página do National Archives pelo endereço:
http://aad.archives.gov/aad/series-description.jsp?s=4073&cat=all&bc=sl
Cáfila reformista
Habitualmente, associam-se
as reformas da Previdência a
uma atividade política civilizadora. Fizeram-se três em dez
anos, sempre com prejuízo para
o andar de baixo. A de Lula aumentou o valor máximo da contribuição, prometendo o paraíso
para daqui a 30 anos, quando,
depois da 116ª reforma, a Previdência estará extinta. Até agora
são 84 os mensaleiros e sanguessugas listados pelo Ministério
Público. A reforma da Previdência de Lula teve o apoio dessa
bancada por 59 votos contra 12.
Sem o apoio da cáfila de reserva
da bancada petista, "nosso guia"
não aprovava a reforma.
Ache o seu
Há um livro útil na praça e um
bom endereço na Internet. É
"Políticos do Brasil", do jornalista Fernando Rodrigues. Cinco
anos de trabalho e muita paciência para dobrar tribunais que
tentavam esconder os dados
permitiram-lhe levantar tabular
3.500 registros com o desempenho profissional, eleitoral e patrimonial dos 1.780 políticos
eleitos em 1998 e dos 1.790 vitoriosos em 2002. Isso e mais os
balanços de suas campanhas.
São 281 os milionários assumidos. Traz novidades e comprova
velhas suspeitas. Mesmo não
sendo ricos, os petistas foram os
que tiveram maior desenvolvimento patrimonial (84%, na
média). Os suplentes de senador
têm patrimônio 46% superior ao
dos titulares. Não é a toa que cerca da metade dos doutores passavam a cadeira ao suplente. Os
patrimônios declarados estão na
internet. De Lula (R$ 423 mil
em 2002) ao campeão Ronaldo
Cezar Coelho (PSDB-RJ), com
seus R$ 297 milhões.
O endereço de Políticos do Brasil é
www.politicosdobrasil.com.br
Samba em Berlim
Começou a temporada de caça às encomendas de brindes
de fim de ano. Começou mal,
pela mão do embaixador do
Brasil na Alemanha, Luiz Felipe Seixas Corrêa. Em papel
timbrado da Viúva, ele enviou
correspondência a empresários
brasileiros informando que a
Embaixada editará, pela quarta
vez, uma agenda de mesa "destinada a personalidades proeminentes do mundo econômico, político, social e jornalístico
da Alemanha e do Brasil". Até aí
tudo bem. Adiante o embaixador informa que a iniciativa é
da empresa Marktforschung &
Kommunikation, que "em breve entrará em contato com
Vossa Senhoria para conversar
sobre possíveis formas de cooperação". O negócio fica meio
girafa, mas vá lá.
Ao final, o embaixador pisa
na jaca: "Seria motivo de grande prazer para mim se um
anúncio de sua empresa pudesse enriquecer o calendário".
Enriquecer o calendário e os
maganos que buscam anúncios
no Brasil. Na hora de puxar a
rede, eles ligam para o empresário/vítima usando o nome de
Seixas Corrêa.
Ave, banca
Governo que gosta de banqueiro funciona assim: em fevereiro, o então secretário do Tesouro, Joaquim Levy, anunciou que a Viúva leiloaria a concessão do atendimento bancário dos aposentados. São 24 milhões de benefícios, que movimentam R$ 11 bilhões por mês.
Os bancos fazem essa intermediação no beiço e detestaram a
idéia. Em São Paulo, o atendimento da folha da prefeitura
(60 mil funcionários) foi comprada por R$ 510 milhões. O
ano vai terminar e o assunto
continua patinando. O ministro da Previdência, Nelson Machado, diz que precisa de mais reuniões. Quantas?
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