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ELIO GASPARI
Dr. Ulysses, velai por "nosso guia"
Em 1998, Lula ficou sonado durante o debate. Amanhã, fará melhor
se for à TV Globo
FALTAM POUCO mais de 24 horas para que Lula tome uma
decisão que poderá marcar
sua vida pública: vai ou não ao debate da TV Globo? "Nosso guia" está
numa situação parecida com a que
Ulysses Guimarães viveu na noite de
13 de maio de 1978, numa calçada do
Campo Grande, em Salvador, quando viu-se diante de uma tropa de soldados e cães da PMs. Ulysses teve
que tomar sua decisão num átimo.
Lula ainda tem o dia de hoje e a tarde
de amanhã para pensar.
É razoável que um presidente se
recuse a ir a um debate com três adversários? Em 1998, FFHH recusou-se, mas o formato do encontro
era outro, exigindo a presença de
dez candidatos zumbis. Na ocasião,
Lula e Ciro Gomes lançaram um
manifesto pedindo aos eleitores que
provocassem o segundo turno, para
permitir o debate da crise econômica. Boa idéia.
A decisão de ir ao estúdio ou deixar a cadeira vazia parece depender
de um cálculo político. Entrar numa
arena onde estarão três adversários
pode parecer suicídio. Admita-se
que, não indo, "nosso guia" arrisque
perder dois pontos percentuais. Indo, poderia perder quatro. Nesse caso, seria melhor não ir. Se os números forem trocados, melhor ir. Uma
coisa é certa: ninguém votará em
Lula porque ele não foi. Para seus
apóstolos de pouca fé, trata-se de escolher o caminho do menor prejuízo.
Enfrentar Geraldo Alckmin, Heloísa Helena e Cristovam Buarque
não é tão difícil quanto parece pois,
se eles se unirem contra Lula, ficará
exposta a demasia do três-contra-um. Uma pessoa que está sendo linchada pode esperar alguma solidariedade da platéia. (Num caso real,
ocorrido na sua juventude, Lula negou-a, mas essa é outra história: "Eu
achava que o pessoal estava fazendo
justiça".) No caminho inverso, a cadeira vazia estimula o massacre do
ausente soberbo.
O absenteísmo despreza a possibilidade de "nosso guia" prevalecer, e
isso não é pouca coisa. Lula ainda
tem tempo para receber a centelha
que, em 1978, fulgurou em Ulysses
Guimarães. Era uma época na qual
sempre que a PM vinha com seus
cães, a oposição parava, conversava
e recuava. Ulysses continuou caminhando, pediu respeito e foi em
frente. Só no dia seguinte, diante da
fotografia da cena nos jornais é que
ele e Tancredo Neves (que ficou um
pouco atrás), deram-se conta de que
haviam vivido um instante ilustrativo do declínio da ditadura.
Com mais de 30 anos de vida pública, Lula tornou-se um exemplo de
líder político audaz, instintivo. Em
duas ocasiões, contudo, no lugar da
faísca veio-lhe o branco. Talvez tenha sido o cansaço, mas "nosso guia"
apagou durante o debate com Fernando Collor em 1989. É dele o registro, passado a Ricardo Kotscho:
"Perdemos a eleição. Eu me senti
como um lutador sonado". O outro
apagão deu-se durante a greve de
1979, no dia seguinte à intervenção
no Sindicato dos Metalúrgicos. Lula
não apareceu na assembléia de 30
mil trabalhadores realizada no Paço
de São Bernardo. Só voltou à tona à
noite, no Sindicato dos Jornalistas.
Segundo uma narrativa de Osvaldo
Bargas -ele mesmo- e Luís Flávio
Rainho ("As Lutas Operárias e Sindicais dos Metalúrgicos de São Bernardo", página 140), nesse dia a atriz
Lélia Abramo diz a Lula que ele "estava se omitindo num momento em
que a classe operária estava escrevendo sua história".
Se doutor Ulysses puder, bem que
poderia mandar um sinal para Lula.
Gostava dele.
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