São Paulo, sexta-feira, 27 de outubro de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / PRESIDÊNCIA

Lula e Alckmin distorcem estatísticas

Presidenciáveis, que fazem o último debate hoje na TV, usam ao menos seis formas diferentes de manipular informações

Além de citar números falsos, candidatos expõem cifras para gerar conclusões erradas e dados que não têm como passar por checagem


GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Se pouco ou nada revelaram sobre seus planos de governo, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Geraldo Alckmin (PSDB), que fazem hoje seu quarto e último debate, mostraram nesta campanha amplo domínio da técnica de manipular dados e conceitos estatísticos para impressionar as platéias.
Da enxurrada de números exibidos no segundo turno, uma pequena parcela é simplesmente falsa. A maior parte é enganosa: as cifras têm conexão com a realidade, mas são apresentadas de forma a sugerir conclusões erradas -seja para exagerar os feitos de quem as cita, seja para maximizar os defeitos do oponente.
Do grosseiro ao sofisticado, os debates anteriores mostraram os truques mais comumente usados pelos rivais:
1) Ignorar o processo histórico - Há indicadores em permanente melhora e em permanente piora nos últimos anos. O salário mínimo, por exemplo, cresce acima da inflação desde o Plano Real. "O salário mínimo tem hoje o maior poder de compra dos últimos anos", gaba-se Lula -e o mesmo poderia ser dito no governo tucano. A carga tributária, igualmente, subiu sem parar no período. "Nunca se pagou tanto imposto como agora", ataca Alckmin -e o mesmo poderia ser dito no governo tucano.
2) Comparar valores distantes no tempo - A inflação e a expansão da economia ajudam a produzir a ilusão de grandes aumentos do gasto público, mesmo quando a despesa ficou estável ou até caiu. Lula não perde a oportunidade de medir o aumento dos gastos em saúde em bilhões de reais, enquanto Alckmin faz o mesmo com os gastos com juros, ao acusar o adversário de distribuir uma "Bolsa Banqueiro".
Medidas como percentuais do PIB (Produto Interno Bruto), as duas despesas mostram estabilidade nos governos tucano e petista.
3) Misturar metodologias -Para exibir a cifra de 7,6 milhões de empregos supostamente criados em seu governo, Lula utiliza uma combinação de dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e dos dois levantamentos oficiais do trabalho formal. Misturam-se, assim, informações obtidas por critérios, periodicidade e abrangência diferentes.
Já a campanha de Alckmin, quando quer apresentar a tese de que o crescimento econômico em São Paulo superou a média nacional, mistura dados apurados pelo IBGE e pela Fundação Seade -o primeiro mediu um resultado melhor em 2003, mas não tem dados para 2004 e 2005.
4) Usar conceitos para confundir - Acompanhadas de números, expressões como pessoas desempregadas e carga tributária podem produzir argumentos enganosos.
As estatísticas não consideram desempregadas as pessoas que desistiram de procurar trabalho. Se o mercado melhora e elas voltam a buscar uma vaga, o desemprego aumenta -ainda que tenha crescido a taxa de empregados. Alckmin usou o fenômeno para transformar em má uma boa notícia para Lula.
A carga tributária é a arrecadação de impostos, taxas e contribuições dividida pela renda nacional. Lula, criticado por elevar tributos, apontou o aumento da carga paulista no governo tucano, mas isso não necessariamente significa que houve elevação de impostos.
5) Usar falsas relações de causa e efeito - Sempre que sua política externa é atacada, Lula cita a duplicação das exportações em seu governo. Uma coincidência de eventos não significa, necessariamente, que um foi responsável pelo outro.
Nesse caso, basta notar que as exportações cresceram em todo o mundo a partir do final de 2002, e países como o Chile, de política externa totalmente diferente da brasileira, registraram altas ainda maiores nas vendas externas.
6) Citar números que não podem ser negados nem confirmados - O exemplo mais claro é a economia de R$ 4 bilhões que Alckmin diz ter obtido ao longo de sua gestão com o pregão eletrônico, mecanismo informatizado pelo qual o governo seleciona seus fornecedores.
A conta do tucano é apenas a diferença entre os preços obtidos nos pregões e os chamados valores de referência, que são uma estimativa prévia para o custo da operação. Economia efetiva haveria se os preços obtidos fossem inferiores aos de licitações convencionais.
Alckmin também insiste em mencionar a existência de 40 mil petistas empregados no governo federal. Não há nenhuma estatística sobre a filiação partidária de empregados em cargos de confiança ou em funções terceirizadas.


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