São Paulo, domingo, 27 de novembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ RUMO A 2006

Especialistas em imagem e marketing político acreditam que desgaste de ministros afetará imagem do presidente para 2006

Para analistas, fritura de equipe mina Lula

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O cai-não-cai a que o ministro Antonio Palocci esteve sujeito no início da semana passada é mais uma pedra (retirada) na desconstrução de uma das fortalezas do vitorioso Luiz Inácio Lula da Silva em 2002, que, segundo dois dos principais analistas de imagem e marketing político do país, fará falta em 2006 e tornará mais fraco o candidato-presidente.
O trunfo descartado por Lula ao consumir e fritar integrantes fundamentais de seu governo, como os ex-ministros José Dirceu (Casa Civil) e Cristovam Buarque (Educação), é o de uma equipe "petista" sólida e bem preparada, o de um político bem assessorado -características que se perdem para a próxima eleição.
Isso, para o sociólogo Antonio Lavareda e o cientista político Marcos Coimbra, é ainda mais importante para um candidato que, segundo eles, ainda em 2002 era percebido como tendo falhas em seus preparo e capacidade administrativa. A equipe, mais do que para políticos como Fernando Henrique Cardoso (ex-presidente) e José Serra (prefeito de São Paulo), estava ali para compensar as supostas limitações que o eleitorado via em seu líder (dos assessores, claro).
Não à toa, a imagem que sintetizava esse casamento, bolada por Duda Mendonça (outro membro da equipe que periga ter sido, ele também, descartado), abria quase toda inserção televisiva de Lula em 2002:
Era o locutor anunciar o programa -"atenção, Brasil; começa agora o programa "Lula presidente'"- e a câmera passeava horizontalmente diante de várias mesas, em que estrelas petistas reunidas apareciam com ar de grandes planos, compenetradas, discutindo, apontando canetas para papéis, lendo alguma coisa enigmática num laptop. Aí surgia o candidato, apoiando as mãos nos ombros de um ou dois especialistas, com gráficos e mapa do Brasil pregados na parede ao fundo.
"Um dos componentes mais importantes da imagem do Lula, quando, em 2002, ele se elegeu presidente, foi o de que ele possuía um grupo muito bom de pessoas em torno dele. Essa idéia foi decisiva para ajudar os eleitores a, digamos, relevar as deficiências de currículo que ele próprio tinha aos olhos de uma parcela muito grande da opinião pública brasileira", afirma Marcos Coimbra, cientista político e diretor de pesquisas do Instituto Vox Populi.
"Ao longo desses quase três anos, o que vimos foi de um lado a perda de imagem dessa equipe -o questionamento da competência em muitas áreas foi se tornando comum- e a simples destituição, demissão de outros ao longo do caminho."
Lavareda, sociólogo e "guru" de imagem e estratégia para pefelistas, concorda. Diz que a suposta "ausência de preparo e de solidez administrativa" de Lula era compensada "por uma expectativa generalizada de que teria uma boa assessoria, que ia montar ou realizar um ministério competente".
"Agora até as pessoas que defendem [a inocência de Lula nas acusações de corrupção e compra de votos em seu governo] têm a percepção de que Lula foi ou é mal assessorado", afirma Lavareda. "Isso prejudica demais."
"No caso do Lula, isso é extremamente danoso. É mais danoso do que para um candidato que não tenha esse déficit de imagem nessa questão", continua o sociólogo, para quem a sociedade "capta" a fragilidade do presidente no quesito "equipe" a partir "da queda de seus inúmeros assessores e ministros".

Palocci
Para Coimbra, ainda que não tenha caído, o caso do ministro da Fazenda joga água nesse moinho e torna Lula, cada vez mais, "um homem só".
"O Palocci hoje não é mais o de uma semana atrás. Fico sempre perplexo quando vejo essas coisas. É mais uma instância em que o PT mostra que sua capacidade de criar problemas para si próprio é sempre surpreendente. Você não pode ter um ministro da Fazenda em uma economia vulnerável como a brasileira cuja autoridade é pequena. E o único saldo de tudo que aconteceu é que o Palocci hoje é muito menor do que era", diz, sobre as críticas sofridas pela Fazenda por parte do governo -como a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) e o presidente do BNDES, Guido Mantega.
É preciso entender, diz o cientista político, que, "quando votaram em Lula em 2002, não votaram no salvador da pátria; votaram no Lula do PT". "E, hoje, da turma do PT, Palocci é provavelmente o que restou. Do ponto de vista popular, é o Palocci."
Coimbra afirma, portanto, que "Lula está ficando cada dia mais sozinho para disputar a eleição contra a turma do PSDB". "E isso é muito importante para o eleitor. Ele não imagina, por mais bonita que seja a biografia e por melhores que sejam as intenções, que alguém consiga fazer as coisas sozinho. A turma da aliança [dos partidos aliados] está toda acuada, para dizer o mínimo. E a turma do PT está a cada dia menor."
Questionado se a tal imagem de bem assessorado e de detentor de uma equipe competente e coesa não seria mais importante para o eleitor de classe média do que para os pobres, bastião da popularidade e de votos para Lula, Coimbra afirma que, de um lado, há eleitores bem informados em todas as camadas da população, que são geralmente formadores de opinião, e, de outro, que "não basta ter presença nessa faixa [dos mais pobres]". "É preciso muito mais do que isso para ganhar uma eleição majoritária."


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