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ENTREVISTA DA 2ª/TASSO JEREISSATI
Decepcionado, PSDB passa por depressão pós-eleitoral
Senador disse, pela primeira vez, que quer deixar presidência da sigla antes do prazo
APÓS DUAS derrotas consecutivas para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PSDB enfrenta um período de "depressão" e "ressaca pós-eleitoral", reconhece seu presidente, o senador Tasso Jereissati (CE). Além disso, vive o dilema entre ser oposição e atender aos crescentes
assédios do Planalto. Tasso diz que, se for chamado,
não se furtará ao "diálogo institucional" com Lula, mas
reage à desconfiança de que o partido esteja moderado: "Somos incooptáveis".
(SILVIO NAVARRO E VERA MAGALHÃES)
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DO PAINEL, EM BRASÍLIA
Enquanto tenta explicar não
só a derrota nacional como a de
seu próprio grupo político, no
Ceará -após dar as cartas no
poder estadual desde 1987-,
Tasso admite, pela primeira
vez, deixar o comando do partido em meados do ano que vem,
quando pretende transferir ao
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) a
missão de "atualizar" as diretrizes do programa idealizado para a sigla há 20 anos.
"Não vejo ninguém nesse
país mais preparado para fazer
um trabalho de organizar o
programa do que o intelectual
Fernando Henrique Cardoso",
diz Tasso, que defende ser preciso evitar o clima de "banalização da delinqüência" no país.
O tucano reconhece que, até
2010, os governadores José
Serra (SP, eleito) e Aécio Neves
(MG, reeleito) travarão uma
disputa interna inevitável para
decidir quem disputará a Presidência. Acha o conflito "saudável" e avalia que, juntos, poderiam até formar uma chapa
"eleitoralmente imbatível".
FOLHA - O PSDB perdeu a eleição
presidencial, mas vai governar São
Paulo e Minas Gerais. Qual será o papel do partido nos próximos anos?
TASSO JEREISSATI - A população
foi bem clara: nos colocou na
oposição e nosso papel será fazer oposição. Vamos continuar
na mesma linha do primeiro
mandato: oposição dura, mas
não irresponsável. Quando o
assunto for de interesse nacional, vamos discutir e votar os
projetos. A diferença é que, ao
longo do primeiro mandato, as
nossas diferenças com o governo aumentaram. No primeiro
biênio, não eram tão visíveis os
defeitos.
FOLHA - Quais foram os defeitos?
TASSO - O primeiro, sem dúvida, foi a corrupção. O nível de
corrupção é altíssimo, e o que
me preocupa não é a corrupção
apenas, mas a divulgação da
corrupção como um assunto
banal. Em função disso, a sociedade tende a ser mais permissiva de maneira geral. Vamos pagar muito caro e por muito
tempo por esse clima de banalização da delinqüência.
FOLHA - O sr. atribui a vitória de Lula exclusivamente a essa banalização? Não faltou ao PSDB ter mostrado um programa claro para o país?
TASSO - Não culparia só o
PSDB. O que existe é uma coisa
a mais que realmente não sei
explicar, diria que é necessário
um estudo aprofundado. Depois que intelectuais, artistas,
gente de alto nível de formação
colocou tudo o que aconteceu
no governo Lula como razoável
e normal, realmente é preciso
uma revisão.
FOLHA - O sr. acha que o segundo
mandato será diferente?
TASSO - Nada faz crer que será
diferente. Houve erros brutais
na economia, o Brasil perdeu
um dos momentos mais brilhantes e felizes da economia
mundial nos últimos 50 anos.
Jogamos for terra a oportunidade de crescer.
FOLHA - Mas o PSDB soube apresentar uma alternativa?
TASSO - Não é por culpa nem
do candidato nem de ninguém.
Todos nós devemos ter cometido algum tipo de erro. Perdemos as eleições diante de um
governo que teve o maior número de casos de corrupção na
história, um crescimento medíocre comparado ao mundo e
a deterioração do serviço público -está aí o apagão aéreo.
FOLHA - Geraldo Alckmin era o nome certo para o contraponto?
TASSO - Não dá mais para discutir isso. Seja quem fosse o
candidato, o Brasil quis eleger
Lula.
FOLHA - O partido tem dois candidatos para 2010, José Serra e Aécio
Neves. Mas terá um programa novo
a apresentar?
TASSO - O PSDB vai se debruçar sobre isso não daqui a quatro anos, mas já. Temos consciência de que um dos problemas é que não ficou claro para a
população, além da questão ética, por que trocar. A questão da
privatização foi colocada de
uma maneira confusa. Vamos
buscar, a partir do início do ano
que vem, rediscutir nosso programa, feito há 20 anos. O
mundo hoje é outro. A social-democracia é outro conceito.
Temos de deixar claro qual é a
nossa diferença em relação ao
PT. O PT era um partido socialista, marxista, hoje se diz um
partido social-democrata também. Ficou muito perto de nós.
FOLHA - É a refundação?
TASSO - A nossa proposta é começar a correr o Brasil inteiro
juntando pensadores de todas
as regiões numa coordenação
bem estruturada para desaguar, até a metade do ano que
vem, num congresso que escreva o nosso programa. Não sei se
a palavra correta é refundação,
mas a atualização do programa
e das pessoas.
FOLHA - O PSDB perdeu a interlocução com as camadas mais pobres
da sociedade?
TASSO - A ponta da sociedade
não tem formação política ou
militância em torno de uma
proposta teórica. Por isso, lhe
interessam os programas que
tenham a ver com seu dia-a-dia.
O Plano Real nos deu enorme
acesso às bases mais excluídas.
Agora, o projeto Bolsa Família
fez esse papel e se contrapôs à
questão da corrupção. A universidade é difusora de opiniões e visões, passando pelos
extratos das forças liberais, da
classe média. É esse caminho
que temos de voltar a percorrer, inclusive pelo sindicalismo.
FOLHA - Como o partido se prepara
para enfrentar o desgaste de uma
disputa acirrada entre Serra e Aécio
para 2010?
TASSO - Não podemos evitar
que isso ocorra. Trata-se de um
ótimo problema, um problema
de um partido que tem quadros
e expectativa de poder. Ruim
seria se não tivéssemos nomes
para apresentar. Essa disputa
interna vai acontecer de maneira equilibrada e saudável,
como em todos os grandes partidos do mundo.
FOLHA - PSDB e PFL continuam juntos?
TASSO - No Congresso, continuamos muito unidos. Somos
fortes, principalmente no Senado, mas só se unidos. Definir
alguma coisa para daqui a quatro anos é muito difícil. Até a
chapa Serra-Aécio, Aécio-Serra
é possível. Eleitoralmente, hoje, parece imbatível.
FOLHA - O fim da reeleição é uma
pauta para o próximo ano?
TASSO - A reeleição no Brasil
não deu certo. Nós fomos os
pais do projeto, mas persistir
no erro é um equívoco.
FOLHA - O sr. fica na presidência do
PSDB até o final do mandato, em novembro de 2007?
TASSO - Não precisa ser até o
fim do ano que vem. Queria terminar [o mandato] nesse congresso [do partido], perto do meio do ano.
FOLHA - Alckmin poderia sucedê-lo
no cargo?
TASSO - É normal que surjam
especulações, pretendentes e
favoritos de determinados grupos. Ele se firmou como liderança nacional, mas disse para
mim que não tem esse desejo.
FOLHA - O sr. sofreu uma dura derrota no Ceará. O partido conseguirá
se reerguer no Estado?
TASSO - No Ceará, mais do que
no resto do Brasil, o PSDB precisa de reciclagem. Nenhum
partido no Brasil conseguiu ser
poder por 20 anos consecutivos. Nós mudamos o Estado do
Ceará, mas cometemos uma série de equívocos políticos, e não
administrativos, que levam a
uma mudança no humor do
eleitorado. Estamos pagando
por isso.
FOLHA - O sr. acha que o presidente
Lula fará um sucessor nos próximos
quatros anos?
TASSO - Acho muito difícil o
Lula fazer um sucessor. Ou ele
faz uma mudança radical em
relação ao primeiro governo ou
não vai precisar nem de PSDB
nem de PMDB nem PFL. O governo, no primeiro ano, desfrutou da herança bendita. Agora a
herança é dele mesmo.
FOLHA - A oposição está dando
uma trégua ao governo?
TASSO - Não é uma trégua. Mas
acusações gravíssimas rodaram o país quase diariamente,
alertamos a população, mas ela
resolveu dar crédito ao governo. Isso nos decepcionou e estamos num período passageiro
de depressão pós-eleitoral, de
ressaca. É tempo de nos reorganizarmos também.
FOLHA - Enquanto isso o presidente acena para uma conversa com o
PSDB...
TASSO - Quero dizer uma coisa
definitiva sobre isso. Essa tentativa de diálogo, nós sempre
dialogamos, no Congresso nada
se aprovou sem que houvesse
diálogo. Agora, existe uma diferença gigantesca entre diálogo
e cooptação. Existem os cooptáveis que vão pelos caminhos
dos cargos, do Orçamento, até
do mensalão. Nós somos incooptáveis.
FOLHA - O sr. disse que o partido
pode, eventualmente, conversar sobre temas. Ou seja, o senhor aceitaria ir ao Planalto?
TASSO - De uma maneira formal, se houver a necessidade de
atravessar a rua, isso pode ser
feito, mas o palco natural da negociação é o Congresso.
FOLHA - O que acha de os governadores do PSDB irem ao Planalto?
TASSO - Uma coisa é o governador Aécio ou o Serra se encontrarem com o presidente da República. Mais do que natural, é
necessário. Seria irresponsabilidade e até prevaricação se não
houvesse, é uma conversa institucional. Ali são interesses de
Estados e não existem partidos
políticos. Agora, uma negociação entre presidente e senador,
pode até haver, mas com características bem definidas.
FOLHA - Esse conselho de ex-presidentes da República, proposto pelo
presidente Lula, pode dar certo?
TASSO - É factóide. Porque é
uma instância desnecessária à
democracia. Se estivéssemos
num momento de guerra...
FOLHA - Como deve ser a discussão
para as presidências da Câmara e do
Senado? O PSDB apoiaria o PFL no
Senado?
TASSO - A posição do PSDB será de não forçar situações e tentar construir uma solução que
dê mais independência às Casas. Se o PFL tiver um candidato com condições de pleitear,
com a adesão de mais partidos,
é nosso parceiro natural.
FOLHA - O Senado será a Casa de
resistência da oposição?
TASSO - O Senado tem sido o
grande ponto de resistência e
equilíbrio ao governo do PT e
ao tipo de exercício de poder
que o PT faz. Certos excessos
que o governo tem vontade de
cometer foram evitados devido
a esse número expressivo de senadores de oposição.
FOLHA - Na eleição, falou-se muito
que o presidente Lula era o candidato dos pobres contra as elites. O país
ficará dividido?
TASSO - O Lula vai ter que mudar muito, porque do ponto de
vista histórico e político, quando a classe média tem uma visão negativa sobre um governo,
ela acaba preponderando sobre
a sociedade. Hoje a visão da
classe média é muito negativa,
principalmente na visão da
questão da honestidade, e isso
tende a se espalhar.
FOLHA - Qual seria o melhor nome
para conduzir esse processo de revisão programática do partido?
TASSO - Não vejo ninguém nesse país mais preparado para fazer um trabalho de organizar o
programa, com visão moderna
do mundo do que o intelectual
Fernando Henrique Cardoso.
Estou num processo de convencimento para que ele coordene essa discussão.
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