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"É um filme para o povo", diz escritora
Segundo corroteirista, produção não engana ninguém porque não é um documentário, mas uma ficção com foco no "drama familiar"
Denise Paraná diz que foi feita síntese da vida sindical de Lula, mas que o essencial foi mantido; "O Fábio fez
um grande filme", defende
DO ENVIADO ESPECIAL A RECIFE
A escritora Denise Paraná,
autora de "Lula, O Filho do Brasil" e corroteirista do filme homônimo, disse que o foco da
produção "é o drama familiar",
e não o sindicalismo. A seguir,
trechos da entrevista concedida à Folha.
(RV)
FOLHA - Há um momento no seu livro em que Lula tem dificuldades
para reunir pessoas no sindicato. Então ele ameaça cortar a assistência
médica dos sindicalizados, o que dá
resultado. Por que o filme não mostrou isso, que indicaria o pragmatismo do personagem?
DENISE PARANÁ - Acho que o
[sindicalista] Paulo Vidal já tinha modernizado o sindicato, e
o Lula entrou nesse esquema
de modernização. Eu não lembro exatamente de detalhes
disso, mas acho que foi, você está falando aí, uma estratégia de
chamar os operários, junto com
os boletins de história em quadrinhos e tal. Agora, a gente não
aprofundou a questão sindical
porque o foco do filme era mesmo a relação entre mãe e filho.
A gente queria contar uma
história universal que interessasse a todo mundo. (...) A gente
sabia que essas questões viriam. Se a gente fosse esmiuçar
o sindicalismo, teria que ser um
filme sobre essa questão.
FOLHA - Em julho de 78 ele fala em
PT. Mostra que a atuação dele no
sindicato já tinha olhar político-partidário. Isso o filme não mostra.
DENISE - Pelo mesmo motivo, o
foco é outro. Mas ele tinha muitas dúvidas em 78 e 79. Em uma
das primeiras entrevistas dele,
para o [programa de TV] "Roda
Viva", ele fala que trabalhador
tem que trabalhar, estudante
tem que estudar. Ele é muito
conservador. Pediu para o general Dilermando, do 2º Exército, ajudar a tirar os infiltrados
no sindicato.
FOLHA - Este é outro ponto. Embora tenha sido preso e o irmão, torturado, teve esse contato com o general. Por que isso não foi retratado?
DENISE - De todas essas questões sindicais nós tivemos que
fazer uma síntese. Mas acho
que o essencial está ali. Quando
Lula fala, "trabalhador não é de
esquerda nem de direita", que é
um resumo do discurso que o
Maurício Soares ajudou a redigir, é isso que ele lê. O filme tem
esse mérito de dizer que o Lula
não é um revolucionário. Não é
um militante de esquerda.
Primeiro, ele entra no sindicato porque foi o Frei Chico
que o levou. Ele preferia ver novela. Aí ele acha legal o sindicato porque aquilo parece um jogo de futebol. Foi a imagem que
ele fez, mesmo, de verdade.
Ele vai indo porque os trabalhadores estão exigindo, mas
não tem nenhuma exigência na
formação, ao contrário do Frei
Chico. E ele ganha pontos com
isso. Acho que não tem nenhum heroísmo aí. É um cara
que estava no sertão, de repente a mãe vem [para SP], ele vem
junto, e ele vai se adaptando à
vida. Não tem nenhuma predestinação, pelo contrário.
FOLHA - Como você qualifica o diálogo que ele teve com os militares?
DENISE - Que não entrou [no
filme]? Ele teve uma diferença
em relação aos outros sindicalistas. Mediante a ameaça de
greve, os empresários foram falar com o governo. Ele disse:
"Ah, se os empresários vão falar, por que os trabalhadores
não podem?". Esse que é o sangue novo. É uma cabeça [diferente]. Se fosse qualquer militante de esquerda, ia falar: "claro que não, eles estão do lado
dos empresários, é um governo
militar, vamos falar com ele?"
Mas o Lula tinha essa espécie
de olhos virgens. (...) O Lula
cresce por quê? Ele era muito
bem visto porque tinha um carisma brutal, uma capacidade
enorme de liderança dos trabalhadores, e ele é muito conservador. Por isso ele teve o espaço
que ele teve na imprensa, alguns órgãos de comunicação
conservadores começaram a
dar espaço, capa para ele.
"Olha, a ditadura já não nos
agrada mais, a crise do petróleo, classe média insatisfeita, a
gente está tendo que caminhar
para o fim desse regime, precisa
de um interlocutor na classe
trabalhadora, esse é o melhor
cara". Conservador e que não
era comunista. (...) Mas todo
mundo sabe que aquilo é cinema. Não estamos enganando
ninguém, dizendo que aquilo é
um documentário fiel e exato.
Acho que o Fábio fez um grande filme, que vai ser um sucesso
enorme. Esse é um filme pro
povo, não para intelectuais.
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