São Paulo, segunda-feira, 27 de dezembro de 2004

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BRASIL PROFUNDO

Controladoria Geral da União encontrou diversas irregularidades na cidade-símbolo do Fome Zero

Verbas federais são desviadas em Guaribas

Lalo de Almeida - 20.mar.2003/Folha Imagem
A agricultora Maria Martins da Rocha, que recebe o Bolsa-Família, com seus filhos, em Guaribas


LEILA SUWWAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Faltou merenda escolar, o cadastro dos beneficiários do Bolsa-Família não existe, as crianças do Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil) não receberam os repasses e as verbas para a construção de módulos sanitários e sistema de água foram desviadas. Ironicamente, esses exemplos de má gestão de recursos federais ocorrem em Guaribas (PI), cidade-piloto do programa Fome Zero e município com o terceiro pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do país.
Por dificuldade de acesso, o município saiu do roteiro da "Caravana da Miséria" promovida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva há quase dois anos. Porém, em junho, a cidade entrou no roteiro de outro órgão federal, a CGU (Controladoria Geral da União), que promove caravanas de fiscalização em municípios sorteados.
A Folha teve acesso ao relatório, que foi finalizado neste mês.
Os fiscais encontraram irregularidades na aplicação de R$ 1,7 milhão de verbas federais repassadas em 2003. A mais grave diz respeito ao dinheiro sacado para a construção de sanitários e rede de abastecimento de água.
A CGU pede devolução dos cerca de R$ 472 mil que deveriam ter sido utilizados nas obras. Dos 220 sanitários que deveriam ter sido construídos, foram feitos apenas as paredes de 35 unidades. Para a rede de água, só havia sido perfurado um poço. Ambas as obras estão paradas desde 2003.
Outros R$ 240 mil, que iriam para a construção de 68 casas populares, também tiveram destino incerto. Menos da metade da obra, também paralisada, foi feita. A CGU avalia que 57% da verba não foi aplicada.
Os fiscais também não encontraram os cadastros dos beneficiários do Bolsa-Família, carro-chefe do governo. Sem eles, não é possível verificar se o dinheiro chega para quem mais precisa.
A merenda escolar falhou. A verba foi recebida, mas faltou comida em 2003, e mantimentos só foram entregues uma vez no segundo semestre.
As crianças do Peti também foram negligenciadas. No ano passado, nenhuma das 80 famílias recebeu o benefício, embora R$ 14,4 mil tenham sido sacados pela prefeitura. Não há comprovantes da aplicação do dinheiro.
Apenas cerca de 36% das crianças freqüentam aulas de jornada ampliada, requerimento do programa, porque não há salas de aula para todos. Além disso, os agentes jovens também alegaram não ter recebido o benefício.
Outra irregularidade: um dos médicos da cidade, que vinha recebendo salário de R$ 6.000 mensais do Programa Saúde da Família, trabalha em Teresina, a 653 km de Guaribas. Os fiscais também encontraram e fotografaram o posto de saúde desativado do município. Porém ele continua "funcionando" no cadastro do SUS (Sistema Único de Saúde).

Outro lado
Os fiscais da CGU cobraram explicações do município logo após a auditoria. Ouviram da atual prefeita, Elienes Francisca dos Anjos (ex-PMDB, hoje PT), que as irregularidades se referem à gestão de Reginaldo Correia da Silva (ex-PL, hoje sem-partido), eleito em 2000 e afastado em agosto de 2003 por improbidade administrativa. Elienes era vice-prefeita, eleita na chapa de Reginaldo. Ela foi derrotada nas eleições deste ano pelo candidato do PMDB. O ex-prefeito também é alvo de uma ação penal por ter supostamente "arrendado" a prefeitura para o ex-secretário de Educação e Finanças, José Ferreira Paes Landim Neto.


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