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ELIO GASPARI
As liquidações dos "formiguinhas"
Se os tucanos tivessem juízo, mandariam seus sábios visitar
os grandes entrepostos de materiais de construção
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COMEÇA HOJE a temporada de
liquidações em quase todas as
grandes revendedoras de
materiais de construção. Se o PSDB
tivesse juízo, mandaria seus sábios
visitar os grandes galpões dessas
empresas. Entenderia por que perdeu a eleição e por que perderá as
próximas. Um bom pedaço dos
clientes dessas liquidações vem do
andar de baixo.
Gente que compra uma caixa
d'água de 500 litros e um novo piso
para a cozinha esperando gastar
R$ 200 em dez prestações, sem juros. Chama-se a esse consumidor de
"formiguinha".
Abastece-se no crédito consignado e, nesse mercado, um aumento
do salário mínimo de R$ 30 mensais
dá para pagar o novo piso e ainda sobram uns R$ 10 para cobrir o aumento das tarifas tucano-pefelês
dos ônibus do Rio e de São Paulo.
A repórter Cibele Gandolpho
revelou que quatro grandes entrepostos planejam oferecer descontos
de até 70%.
Com sorte, juntando-se o aumento de dois salários mínimos e mercadoria barata (talvez de uma ponta de
estoque), consegue-se um novo banheiro.
Esse pedaço do Brasil é olhado
com desconfiança pelo andar de cima. Quando Lula baixou os impostos sobre os materiais de construção, viu-se na providência um estímulo à favelização.
Se o problema habitacional brasileiro pudesse ser resolvido pela elevação do preço do saco de cimento,
as coisas seriam muito mais fáceis.
Pior: o medo descende do pavor oitocentista dos escravos livres, desorganizando os bulevares e embebedando-se pelas ruas.
Uma pesquisa patrocinada pelo
sindicato da indústria, com números de 2002, ensina que as famílias
com renda de até três salários mínimos consomem apenas 8% da produção nacional de cimento.
Um saco consumido numa casa situada nessa faixa de renda é parte de
uma obra que muda a vida da família. A conjunção do salário mínimo
com o acesso ao crédito e o interesse
do comércio em vender para as faixas de menor renda estão provocando mudanças na maneira de viver (e
de votar) do brasileiro.
Assim como há no andar de baixo
muita gente que precisa tomar banho de loja, há no de cima quem precise de banho de entreposto. O
PSDB tem uma certa incapacidade
neurológica para absorver avanços
sociais produzidos pelo PT.
Um bom exemplo dessa demofobia está na incapacidade dos tucanos
de reconhecer a revolução ocorrida
nos transportes públicos de São
Paulo durante a gestão de Marta Suplicy. Outro é a confusão do "puxadinho" com a favelização.
São atitudes irracionais, pois enquanto houver sufrágio universal, a
política de satanização do andar de
baixo produzirá apenas demagogia e
triunfos eleitorais de demagogos.
É nesse sentido que faria bem ao
cardinalato tucano passar uma tarde num entreposto de materiais de
construção.
Descobrirão o que pensam e como
agem os trabalhadores que planejam ampliar sua casas com algumas
centenas de reais, a boa vontade dos
vizinhos e a ajuda dos parentes.
Vivem naquele pedaço do Brasil
onde os ônibus atrasam, são inseguros e maltratam os passageiros, mas
ninguém quer ouvir falar disso. Em
2008, eles vão votar de novo.
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