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Se Itália pedir, Condor pode ser investigada, diz ministro
Justiça italiana emitiu mandados de prisão referentes a ações de ditaduras no Cone Sul
Brasileiros são acusados de
participação no seqüestro
e desaparecimento de dois guerrilheiros argentinos
no início da década de 80
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PORTO ALEGRE
DA REPORTAGEM LOCAL
O governo federal analisará
um pedido de abertura de inquérito sobre os militares e os
policiais brasileiros acusados
de participar da Operação Condor, que uniu ditaduras do Cone Sul em ações de repressão,
caso a Justiça italiana faça a solicitação. A chance de a iniciativa prosperar, contudo, esbarra
em diversos pontos legais.
O ministro da Justiça, Tarso
Genro, afirmou que, em tese,
poderia haver o pedido da Itália, país no qual corre um processo movido por vítimas de cidadania italiana da operação.
Na segunda-feira, a Justiça expediu um mandado de prisão
contra 140 pessoas -inclusive
11 brasileiros, segundo disse à
BBC Brasil o procurador italiano Giancarlo Capaldo. O número diverge dos 13 divulgados dia
24 por agências internacionais.
Tarso afirmou que não havia
recebido pedido formal da Itália até ontem. Lembrou que a
Constituição impede a extradição de brasileiros, mas citou o
tratado firmado entre Brasil e
Itália que permite a ambos solicitar abertura de inquérito na
nação alheia.
Se houver o pedido, o ministro da Justiça analisará o caso e
encaminhará despacho ao STF
(Supremo Tribunal Federal).
Tarso lembrou, contudo, que
é preciso analisar se os crimes
imputados aos brasileiros já
não teriam prescrito e se a Lei
de Anistia também não os livraria dos crimes atribuídos. O ministro deu a entender que dificilmente haveria algum tipo de
punição aos brasileiros.
"Se o Brasil for demandado
[pela Justiça italiana], o tratado
nos permite instaurar ou não
um inquérito. Mas existe a
prescrição em concreto e a Lei
de Anistia, que têm de ser consideradas", disse o ministro.
Para o ativista Jair Krischke,
presidente do Movimento de
Justiça e Direitos Humanos do
Rio Grande do Sul, os brasileiros deverão responder a processo no Brasil. Ele atua desde
2005 como consultor informal
da Justiça italiana no caso.
Também foi testemunha das
famílias dos ítalo-argentinos
Horacio Campiglia e Lorenzo
Viñas, que desapareceram no
Brasil em 1980, o que motivou a
abertura do processo na Itália.
Krischke disse acreditar que
o procedimento natural é que o
STF encaminhe a questão à
Procuradoria Geral da República que, então, deverá pedir
abertura de processo para julgá-los no Brasil.
Para ele, a Lei de Anistia brasileira não se aplica no episódio, pois são crimes internacionais. "No direito internacional
não existe anistia. Dos três crimes pelos quais são acusados,
homicídio, tortura e desaparecimento, apenas homicídio já
prescreveu. Pelos demais, eles
têm que ser julgados."
Falando em Roma à BBC
Brasil, Capaldo afirmou que
quer a colaboração do governo
brasileiro, mas não disse se já
elaborou algum pedido formal.
"Esse processo nasceu na
Itália porque os países unidos
em torno da Operação Condor
decidiram não abrir investigações sobre o assunto. A Itália
está fazendo o possível para
evitar a impunidade e para que
operações como essa não voltem a acontecer." Ele disse que
a lista tem 11 brasileiros, dois a
menos do que havia sido divulgado inicialmente.
Desaparecimentos
Os brasileiros contra os quais
foram emitidas ordens de captura internacional correspondem à cadeia de comando dos
órgãos de segurança do Brasil e
dos Estados do Rio de Janeiro e
do Rio Grande do Sul à época
do desaparecimento dos ítalo-argentinos Lorenzo Ismael Viñas (26 de junho de 1980) e Horacio Campiglia (12 de março
de 1980).
Outros estrangeiros desapareceram no Brasil no contexto
da Operação Condor, mas o
processo da Itália alcança apenas os que detinham também a
cidadania italiana.
Viñas, 25, que integrava o
maior grupo guerrilheiro argentino, os Montoneros, foi detido num ônibus quando cruzava a fronteira da Argentina, em
Paso de Los Libres, com o Brasil, em Uruguaiana (RS), e foi
visto pela última vez, segundo
testemunhas, numa prisão argentina, três meses depois.
Também guerrilheiro montonero, Campiglia, 31, sumiu no
aeroporto do Galeão, no Rio de
Janeiro, junto com a guerrilheira Monica Pinus de Binstock. Para chegar aos nomes
dos brasileiros, a Justiça italiana baseou-se no depoimento
dado em 1999 e na descrição
feita em 2005 por escrito por
Jair Krischke. Alguns dos citados já morreram, como o ex-presidente João Figueiredo
(1918-1999).
(LEONARDO SOUZA, SIMONE IGLESIAS E RUBENS VALENTE)
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