São Paulo, domingo, 27 de dezembro de 2009

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Até capital do boné entra na agenda do Congresso

Projeto que obriga quem se casa ou quem se separa a plantar árvore também integra pauta

Instituição de homenagem obrigatória a "pai da aviação" em aeroportos foi tema de projetos votados tanto no Senado como na Câmara


JOHANNA NUBLAT
MARIA CLARA CABRAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em um ano de crises no Senado e na Câmara e com o foco principal voltado para propostas como a do pré-sal e a inclusão da Venezuela no Mercosul, deputados e senadores conseguiram também dedicar parte de seu tempo para aprovar projetos, no mínimo, curiosos.
As duas Casas se empenharam em estabelecer, simultaneamente, uma homenagem obrigatória nos aeroportos do país a Santos Dumont, o "pai da aviação" para os brasileiros. E a ideia não partiu só de um congressista: são dois projetos de lei de autorias distintas exatamente com o mesmo teor e que foram votados separadamente.
Outro tema que mereceu especial atenção neste ano foi o "Livro dos Heróis da Pátria". Pelo menos três projetos tramitam para alterar a estrutura do livro, permitindo, por exemplo, que estrangeiros possam ser nele incluídos. Mantendo a estrutura, diversas outras propostas instituem homenagens nesse livro a pessoas ilustres -ou quase ilustres.
O deputado Manato (PDT-ES) é autor de uma das centenas de propostas exóticas que andaram neste ano no Congresso -lado a lado com os sucessivos escândalos que eclodiram ainda no início do ano legislativo. Ele quer tornar obrigatório o plantio de árvores para quem se casa (dez árvores) e para quem se separa (25).
Também deverão plantar mudas os compradores de carros zero quilômetro (de 20 a 60, dependendo do tipo de veículo) e as construtoras (dez para cada unidade residencial e 20 para unidades comerciais).
Não satisfeito, o deputado pretende exigir, em uma emenda que fará, o mesmo dos compradores de gado. A alegação é que todos que prejudicam o ambiente devem recompensá-lo de alguma forma.
"Quando se casa ou se separa gasta-se mais com água, luz, construção de casa, agredindo assim o meio ambiente. Se não tivéssemos o divórcio, economizaríamos 7 milhões de imóveis no mundo", afirma ele.
Já o deputado Alex Canziani (PTB-PR) quer tornar Apucarana (cidade paranaense) a capital nacional do boné. Canziani afirma que, com a aprovação de um projeto neste sentido, a cidade -que já é um polo do produto, argumenta- pode ganhar grande recompensa financeira e social.
São inúmeros os projetos esdrúxulos que passaram por análise de comissões, foram objetos de pareceres e até análises no plenário. A última pauta do ano na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara, por exemplo, trazia uma proposta que tornava obrigatória a instalação de banheiros (masculinos e femininos) para uso dos clientes em bancos. Sua aprovação ou não ficou para 2010.
Outro que se destacou foi um projeto de lei que pretende trocar a palavra estupro por "assalto sexual".
Segundo especialistas ouvidos pela Folha, uma das explicações para o grande número de propostas como essas é parte da centralização das principais agendas legislativas no Executivo, por exemplo, por meio de medidas provisórias.
Para Helcimara Telles, cientista política da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), também é preciso levar em conta que uma parte importante do eleitorado dá grande valor a obras e outros benefícios, conseguidos, muitas vezes, via liberação de emendas de congressistas -o que faz com que muitos se concentrem nesta tarefa em vez de se esforçarem para aprovar projetos próprios de relevo.
"A gente sabe que tem um grupo pequeno de deputados, o alto clero, com quem o governo vai negociar. Aos demais, a função da representação é esvaziada", afirma Telles.


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