São Paulo, quarta, 28 de janeiro de 1998


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PRESIDÊNCIA
Em entrevista à Folha, tucano deixa escapar confiança de sua reeleição
FHC afirma que manterá câmbio até 'outro mandato'

Sérgio Lima/Folha Imagem
FHC durante solenidade no Palácio do Planalto


VALDO CRUZ
da Sucursal de Brasília

O presidente Fernando Henrique Cardoso disse à Folha que não vai mudar o câmbio "nem neste nem no outro mandato", deixando escapar a confiança de que será reeleito na próxima campanha.
Fora esse deslize, o presidente procurou evitar durante a entrevista o clima de já ganhou. "Eleição não se ganha na véspera."
FHC rebateu as críticas de quem diz que ele está repetindo o erro de 85, quando se sentia eleito, sentou na cadeira de prefeito e perdeu a eleição para Jânio Quadros. "Foi uma ingenuidade minha, não foi pretensão."
Sobre a política de desvalorizações graduais do real, FHC disse que ela está estabelecida e será mantida. Segundo ele, o custo de uma mudança no câmbio recairia sobre os assalariados.
O presidente disse que pretende cumprir a promessa de dobrar o valor do salário mínimo. "É bom lembrar o que eu disse: dobrar até o final do quarto ano. Até o final."
FHC, que começa hoje uma visita à Suíça, disse que, em um eventual segundo mandato, gostaria de ter um "Real Social". A seguir, os principais trechos da entrevista:

QUEDA DE JUROS - "A política geral todo mundo sabe. O aumento foi emergencial. Agora, o ritmo de queda vai se dar à medida que a situação internacional permitir. Temos de olhar o cenário externo. E não é só a gente. É todo o mundo. Até os Estados Unidos."
Comentando a moratória da Indonésia, FHC disse que viu a notícia pelas agências de notícias no computador. "Eu vi na telinha. Acho que a reação está sendo até positiva. Deixa eu dar uma olhada de novo para ver se tem novidades (o presidente levanta do sofá, vai até a sua mesa, olha o computador e diz que até aquele momento não havia novidades)."


"O Congresso tem aprovado quase tudo o que o governo quer"
CÂMBIO - Questionado se o governo pode mudar o câmbio diante da instabilidade externa e para melhorar a economia em ano de eleição, FHC disse: "Essa matéria está estabelecida (referindo-se à política de desvalorizações graduais do câmbio). Não estou cogitando mexer no câmbio. Não vou mexer nem neste nem no outro mandato. Todo mundo já sabe que, ao fazer um ajuste da economia por meio de desvalorização cambial, no final, quem paga são os assalariados. Não temos de mudar nada. No momento, estamos numa posição boa. O FMI, o Banco Mundial disseram que agimos bem".
SALÁRIO MÍNIMO - Questionado se vai cumprir a promessa de dobrar o valor do salário mínimo -de R$ 64,79 na época da campanha para R$ 129,58 em maio próximo-, FHC disse: "Vou fazer tendo em vista a questão econômica. É bom lembrar o que eu disse. Dobrar até o final do quarto ano. Até o final. Pode não ser agora. Decisões desse tipo não podem ser demagógicas. Não vou brincar com isso. Em ano eleitoral, não vou fazer demagogia. Não cedo nada, tomo medidas impopulares se for necessário. Já tomei. É bom lembrar ainda que, quando fiz a promessa, a cesta básica custava R$ 104,00. Agora, se não me engano, custa R$ 114 (em São Paulo está custando R$ 117,87). Antes, não dava para comprar uma cesta básica com o salário mínimo. Hoje, o mínimo vale mais do que a cesta básica".
REFORMA DA PREVIDÊNCIA - "Sei que é importante aprová-la para sinalizar para os investidores estrangeiros. Vamos aprová-la até março. O Congresso tem aprovado quase tudo o que o governo quer. É claro que estamos negociando. Não podemos ficar com essa visão autoritária, tecnocrata, de que nada pode ser mudado."
REFORMA DO ESTADO - "Nós estamos mudando o Estado. Ficam mais preocupados em dizer que o governo é neoliberal. Isso é uma besteira. Estamos criando as agências, fazendo mudanças profundas. Olha só o caso das telefônicas. São 27, algo em torno de 135 diretores. Vamos reduzir para três, vão ser apenas 15 diretores. E estamos fazendo isso em ano eleitoral. Vamos ter menos cargos no próximo mandato, se a gente ganhar. Não estou alardeando isso porque pode ser ruim para o governo agora."


"Nunca tive idéia de fazer um ministério técnico. Canso de ler coisas que nunca disse"
REFORMA MINISTERIAL - Sobre a nomeação de um ministério técnico em abril, quando vários ministros deixam o governo para disputar a eleição: "Nunca tive essa idéia de fazer um ministério técnico. Canso de ler na imprensa coisas que nunca disse. Já avisei que tenho dois limites na escolha dos próximos ministros. Não posso colocar alguém que não possa tirar depois. É bom lembrar que posso perder a eleição. Se perder, a pessoa tem de sair. Se ganhar e o quadro político mudar, também tenho de mudar o ministro".
PMDB - "O PMDB tem de se definir. Se fica comigo ou não. Se não ficar, tem de entregar os ministérios. É claro que tem o lado que me apóia. Se eles continuarem me apoiando, ficam no governo."
REFORMULAÇÃO DO GOVERNO - "No fim-de-semana, li várias notícias dizendo que vou fazer isso, vou fazer aquilo. O Planejamento muda. O Orçamento sai de lá. Mentira. Não tem nada decidido. Sobre o André Lara Resende virar ministro do Planejamento, é claro que gostaria de tê-lo no ministério, como na verdade já o tenho. Ele para mim é um ministro. Funciona como tal."
ARTICULAÇÃO - FHC comentou as análises, de alguns aliados, de que ele se envolveu demais na negociação política, gerando desgaste na figura presidencial. "Como o regime é presidencialista, a coisa funciona quando o presidente atua. Não tem jeito. Agora, não se pode ter essa visão asséptica do poder, de que o presidente tem de ser preservado. Se acredito no que estou defendendo, jogo tudo. Não tem nada a ver com roubar, corrupção. É fazer pressão."



"O PMDB tem de se definir. Se não ficar (comigo), tem de entregar os ministérios"
CRESCIMENTO - FHC disse que não vai fazer aposta sobre quanto o país vai crescer neste ano. "Disseram que o Natal seria ruim. Não foi. Em janeiro, não foi a tremenda retração que estavam anunciando. Não gosto de fazer aposta. PIB (Produto Interno Bruto, a soma das riquezas produzidas num país) só se sabe depois, vamos esperar. Agora, seria um erro meu tomar medidas demagógicas só para fazer a economia crescer. Essa possibilidade está excluída. Perco a eleição, mas não faço isso."
ELEIÇÃO - Sobre a eleição presidencial e se se considera favorito: "Eleição não se ganha na véspera. (Ficam) lembrando o episódio em que sentei na cadeira de prefeito (na campanha pela Prefeitura de São Paulo em 85). Foi ingenuidade minha, não foi pretensão."
ÁREA SOCIAL -"É claro que vai sempre ficar essa sensação de que o governo não fez nada na área social, afinal o Brasil tem uma carência enorme. Mas é preciso lembrar que, se não temos estabilidade, inflação baixa, não temos mais nada. Não quer dizer que basta fazer a estabilização da economia. Precisa fazer muito mais, mas não aceito esse discurso de que não fizemos nada no social."
REAL SOCIAL - Sobre plano de governo num eventual segundo mandato, FHC disse que gostaria de ter um "Real Social". "Isso me agrada muito. Desde que não seja demagógico, medidas populistas. Mas é claro que precisamos tratar de outras questões, como a ambiental. Veja o desmatamento, está caindo. Temos que avançar na área social. É bom lembrar que tudo será possível porque, agora, começamos a ter a possibilidade de olhar para a frente. Antes, era só da mão para a boca."



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