São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

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No Senado, ex-embaixador reforça críticas ao Itamaraty

Em depoimento, Roberto Abdenur aponta viés ideológico na diplomacia brasileira

Segundo diplomata, leituras indicadas defendem política protecionista e instigam a reação aos EUA, o que considera ultrapassado


CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em depoimento ontem na Comissão de Relações Exteriores do Senado, o ex-embaixador em Washington Roberto Abdenur reforçou suas críticas ao que entende por viés e direcionamento ideológico na execução da política externa e na formação e promoção de diplomatas no Itamaraty.
Em mais de seis horas de depoimento, Abdenur também criticou a ênfase da política externa brasileira à "diplomacia sul-sul", em detrimento à alocação de recursos para fazer promoção comercial nos EUA.
As críticas também foram feitas ao presidente Hugo Chávez, da Venezuela. "A Venezuela é verdadeiramente uma ditadura, portanto, não é compatível com o Mercosul."
No mês passado, ele disse à revista "Veja" que "há um substrato ideológico vagamente anticapitalista, antiglobalização e antiamericano totalmente superado na política externa", criticou a imposição de leituras feitas pelo secretário-geral Samuel Pinheiro Guimarães e disse que os que não compartilham da mesma visão ideológica da cúpula do Itamaraty são prejudicados nas promoções.
A entrevista gerou reação no Itamaraty e uma forte discussão entre especialistas, o que levou o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) a convocar Abdenur. Ele concedeu entrevista à revista dois dias depois de deixar o posto em Washington.
Na sessão, o presidente da Comissão de Relações Exteriores, Heráclito Fortes (PFL-PI), colocou Abdenur em uma saia-justa ao propor uma sessão secreta para que o embaixador detalhasse quando houve direcionamento ideológico nas promoções do Itamaraty.
Abdenur foi salvo pelo senador Romeu Tuma (PFL-SP), que sugeriu que a sessão seria constrangedora, e pela senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), para quem não era da competência da comissão propor tal sessão.
Segundo Abdenur, as supostas preferências ideológicas não prejudicam a qualidade dos serviços prestados pelo Itamaraty porque todos são bem preparados, mas reforçou: "Vi pessoas de alta competência deixarem de ser promovidas ou terem suas promoções atrasadas porque não eram vistas como aliados". A assessoria do Itamaraty informou que o órgão não comentaria o depoimento.
Os livros criticados por ele foram "Pensamento Econômico Brasileiro", de Ricardo Bielschowsky; "Chutando a Escada", de Ha-Joon Chang; e "Brasil, Argentina e Estados Unidos: Conflito e Integração na América do Sul -da Tríplice Aliança ao Mercosul", de Luiz Alberto Moniz Bandeira.
"A leitura obrigatória desses livros tem o objetivo de dizer que é hora de voltarmos ao Brasil do nacional desenvolvimentismo protecionista dos anos 60 e 70 e reagir ao imperialismo, uma visão ultrapassada."
Sobre a obra de Moniz Bandeira, Abdenur disse que o livro "tem um forte elemento doutrinário e até panfletário, porque atribuiu quase todos os conflitos na região aos EUA." À Folha Moniz Bandeira disse ter a impressão que "se promove atualmente uma espécie de terrorismo ideológico, acusando qualquer crítica aos EUA como anti-americanismo". Por causa da polêmica, o chanceler Celso Amorim suspendeu as leituras na semana passada.
Abdenur também elogiou Lula, dizendo que ele atuou para manter a segurança na economia, suas relações com autoridades americanas, a atuação do Brasil no G20, na Rodada Doha, na defesa por um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas e até a aproximação com a África.


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