São Paulo, terça-feira, 28 de março de 2006

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CRISE NO GOVERNO/A VIOLAÇÃO DO SIGILO

Ex-presidente da Caixa relatou que os dados de caseiro foram entregues no dia 17; em carta a Lula, ministro nega ter ordenado violação de sigilo

Mattoso diz à PF que deu extrato a Palocci

ANDRÉA MICHAEL
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Jorge Mattoso era presidente da Caixa Econômica Federal até ontem. Pediu demissão depois de afirmar que entregou pessoalmente ao então ministro Antonio Palocci (Fazenda) o extrato bancário de Francenildo dos Santos Costa na mesma noite em que o sigilo do caseiro foi violado. No lugar de Mattoso entra Maria Fernanda Ramos Coelho, hoje superintendente de Desenvolvimento e Estratégia Empresarial.
Mattoso deixou a sede da PF em Brasília indiciado por quebra de sigilo de operações financeiras e por violação de sigilo funcional. As penas para tais crimes podem chegar a seis anos de prisão, além de multa, se ficar comprovado também o uso indevido dos dados acessados.
Em carta encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para oficializar seu pedido de demissão, Palocci nega ter sido o responsável pela quebra do sigilo bancário de Francenildo (leia a íntegra nesta pág.).
Em nota, Mattoso tenta descaracterizar seu gesto como violação do sigilo bancário. Diz que atuou "nos estritos limites da legalidade" ao levar informações de movimentações "atípicas" ao conhecimento do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), subordinado a Fazenda, e ao próprio Palocci: "Cumprindo meus deveres funcionais e sem que isso de forma alguma representasse quebra indevida de sigilo (...) comuniquei o fato à autoridade superior à qual a Caixa encontra-se vinculada."
A movimentação detectada pela Caixa são depósitos de R$ 25 mil feitos por aquele que seria o pai biológico de Francenildo. O caseiro teve o sigilo quebrado na noite de quinta (ocasião em que Palocci foi informado), mas o fato só foi comunicado ao Coaf na sexta.
Na segunda-feira, três dias depois de o caseiro ter seu extrato bancário divulgado, Mattoso mandou abrir uma investigação interna para apurar, em 15 dias, eventuais responsabilidades.
No depoimento em que revelou ter entregue o extrato a Palocci, Mattoso disse que havia pedido os extratos de Francenildo depois de ter sido informado de indícios de irregularidades na conta do caseiro. O consultor da presidência da Caixa Ricardo Schumman, egresso da administração da ex-prefeita Marta Suplicy, foi o interlocutor de Mattoso na operação. Ele confirma a versão do executivo.
Mattoso também disse à Polícia Federal que recebeu os documentos de Schumman em um jantar em Brasília. De posse dos dados, foi pessoalmente à residência de Palocci e entregou a ele um envelope com os extratos do caseiro. Somente no dia seguinte, uma sexta-feira, a Caixa tomou as providências burocráticas adotadas em casos semelhantes: Coaf.
O executivo assumiu total responsabilidade pelos atos praticados no âmbito da Caixa. Não fez qualquer referência ao assessor do ex-ministro Marcelo Netto, que estaria envolvido na operação montada para levar os extratos do caseiro à imprensa. "Foi um depoimento corajoso, mas de alguém que estava arrasado", afirmou o delegado Rodrigo Carneiro Gomes, que preside a investigação. Informado da disposição de Mattoso de contar em detalhes o episódio, Palocci pediu afastamento do cargo.
Ainda não há data definida para o depoimento do ex-ministro à PF. Antes de ouvir Palocci, os investigadores pretendem concluir a perícia do computador portátil por meio do qual os dados bancários do caseiro foram violados. Ouvido ontem pela PF, o consultor da presidência da Caixa para a área de recursos humanos Ricardo Schumman disse que entregou pessoalmente os extratos de Francenildo a Mattoso. O nome de Schumman surgiu em depoimentos do final de semana.
No domingo, o gerente da Superintendência Nacional de Pessoas da Caixa Jeter Ribeiro, um dos dois usuários do laptop com o qual o sigilo do caseiro foi violado, afirmou ter sido o responsável pelo acesso aos dados do caseiro.


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