São Paulo, terça-feira, 28 de março de 2006

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Com Palocci, mercado deixou de ver PT como ameaça

GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Segundo ministro da Fazenda mais longevo desde a redemocratização do país, Antonio Palocci obteve, com boa ajuda da sorte, a melhor combinação de resultados do período. Seu principal feito foi esterilizar o debate sobre alternativas de política econômica.
Graças a Palocci, o PT deixou de ser visto como ameaça ou esperança de mudanças na orientação neoliberal que dá as cartas na economia desde a década passada.
Mesmo com sua substituição por Guido Mantega, um crítico à esquerda de suas diretrizes, ele deixa para o sucessor um arranjo institucional que dificilmente poderá sofrer alterações substantivas sem submeter o governo ao risco de uma crise financeira.
Mantido desde o segundo mandato de FHC, o tripé básico da política econômica -superávit fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante- está sujeito a alterações de grau, mas nenhum grupo demonstra hoje amparo político e acadêmico suficiente para alterá-lo em sua essência.
Sob Palocci, os resultados desse arranjo, se estiveram longe de ser brilhantes, bastaram para que o governo Lula se considerasse na clássica situação futebolística do time que está ganhando e não deve ser mexido. A ortodoxia deu ao governo três anos de inflação em queda, confiança dos mercados, elogios dos países ricos e recordes nas exportações. O crescimento foi modesto, mas serviu para atenuar o desemprego e alimentar a campanha reeleitoral.
Em 2004, pela primeira vez desde a industrialização do país, um governo pôde comemorar ao mesmo tempo inflação de um dígito, superávit comercial elevado e expansão econômica vigorosa. O antecessor de Palocci na Fazenda, Pedro Malan, praticamente só pôde celebrar a queda da inflação em seus oito anos no cargo.
Ironicamente, a sobrevalorização cambial, tão criticada pelo PT nos anos FHC, foi a maior aliada de Palocci. Sem incertezas e crises internacionais para atrapalhar, e com juros altos para ajudar, o dólar despencou. Assim elevou-se renda do país e reduziram-se a inflação e a dívida pública.
Enquanto teve força, Palocci venceu praticamente sozinho todas as pressões contra a política econômica que personificou. Quando atacado pelo PT, ganhava o apoio da oposição, satisfeita com a ausência de novidades na política econômica.

Agenda interrompida
Ainda que tenha consagrado o continuísmo, porém, Palocci deixa desde seu enfraquecimento dúvidas quanto à continuidade de sua agenda. No fim do ano passado, ele perdeu para a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) o embate em torno do que deveria ter sido sua primeira grande contribuição às diretrizes herdadas: um ambicioso plano fiscal.
Conforme o consenso firmado entre os economistas liberais, a Fazenda tentou implantar um programa de longo prazo, baseado no controle de despesas permanentes -ou na tentativa de deter o crescimento dos gastos sociais. Até os especialistas mais conservadores já apontam a exaustão do atual modelo fiscal, em que o governo cumpre suas metas de superávit sacrificando os investimentos necessários ao crescimento econômico.
Antes do abandono do novo programa fiscal, a conveniência política de Lula já havia transformado em conversa fiada as reformas que Palocci e sua equipe consideram essenciais para o desenvolvimento do país. Estão nessa lista as reformas tributária, trabalhista e sindical, além da conclusão da previdenciária; a autonomia do Banco Central, com mandatos fixos para seus dirigentes; as novas regras das agências reguladoras e da defesa da concorrência.
A última vez em que o governo empenhou-se em pôr de pé a pauta legislativa da equipe econômica foi em 2004, quando o Congresso aprovou a nova Lei de Falências e as Parcerias Público-Privadas.
Vive-se um cenário em que a ortodoxia liberal é preservada por falta de alternativas palpáveis, mas sem força para dar novos passos.


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