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Há resistência ao Brasil, afirma Ellen Gracie
Derrotada ao tentar vaga em corte de apelação da OMC, ministra do Supremo afirma que país é o "new kid on the block"
Ex-presidente do STF isenta Itamaraty e nega que lhe faltasse conhecimento do tema: "Respondi a todas as perguntas que foram feitas"
U.Dettmar-13.mai.09/STF
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A ministra Ellen Gracie, que disputou uma vaga na corte de apelação do OMC, em sessão do STF
RENATA LO PRETE
EDITORA DO PAINEL
Para Ellen Gracie Northfleet,
ministra do Supremo Tribunal
Federal, o Brasil "foi mais prejudicado por suas qualidades
do que por seus defeitos" na escolha do novo membro da corte
de apelação da Organização
Mundial do Comércio. O cargo,
pleiteado por ela, acabou ficando com o advogado mexicano
Ricardo Ramirez. "O Brasil é o
"new kid on the block'", afirma.
"E isso gera resistências."
Em sua primeira entrevista
sobre o episódio, Ellen rejeita
atribuição de culpa ao Itamaraty -sobre o qual pesam outras derrotas recentes em disputas por cargos internacionais. Segundo ela, o time do
chanceler Celso Amorim "foi
impecável". "Essas escolhas
não são simples. Não são um
Gre-Nal", compara a gaúcha.
Ela também refuta a ideia de
que lhe faltava conhecimento
específico, em contraste com o
currículo de Ramirez. "É um
cargo de juiz. E isso eu faço há
mais de 20 anos. Me preparei
durante estes últimos seis meses com a seriedade necessária.
Respondi a todas as perguntas
que me foram feitas. Não houve
nada que me embaraçasse."
Ellen minimiza o incômodo
manifestado por colegas com
suas ausências frequentes durante a campanha. "Pessoalmente, nunca recebi reparo."
Nega ter buscado, antes da
OMC, vaga na Corte Internacional de Justiça, em Haia.
Aos 61 anos, a primeira mulher a ingressar no STF -em
2000, por indicação do então
presidente Fernando Henrique
Cardoso- diz que não pretende mais deixar a Corte. "Agora
retomo o meu trabalho, que,
aliás, nunca foi interrompido",
diz ela, que antecedeu Gilmar
Menes na presidência do STF.
FOLHA - A sra. considera a escolha
do mexicano Ricardo Ramirez para a
corte de apelação da OMC uma derrota sua ou do governo Lula?
ELLEN GRACIE NORTHFLEET - Nem
uma coisa nem outra. Cerca de
um ano atrás, o professor Luiz
Olavo Baptista me procurou
para dizer que pretendia deixar
o cargo. Ele considerava importante o Brasil manter a posição.
Uma candidatura de alta hierarquia poderia contribuir para
isso. Ele me conhece há 30
anos. Não foi escolha aleatória.
Depois disso, fiz contato com
o chanceler Celso Amorim, para verificar a viabilidade do
projeto do ponto de vista do
Itamaraty. Ele concordou e trabalhou pela candidatura. Quero registrar que o Itamaraty foi
impecável ao longo de todo o
processo. O próprio presidente
da República se empenhou.
Essas escolhas não são simples. Não são um Gre-Nal. O
Brasil foi mais prejudicado por
suas qualidades do que por seus
defeitos. O Brasil é o "new kid
on the block". E isso gera resistências, vide a posição dos EUA
e da China a favor do candidato
do México. Houve também resistência regional -a Argentina lançou seu próprio candidato. O Brasil já havia ocupado o
cargo por oito anos. Prevaleceu
a ideia de rotação.
FOLHA - A sra. discorda, então, da
interpretação de que lhe faltava conhecimento específico, na comparação com o currículo de Ramirez?
ELLEN GRACIE - Os quatro candidatos eram altamente habilitados [além de Brasil, México e
Argentina, também a Costa Rica lançou um nome]. E trata-se
de um posto de natureza quase
judicial. É um cargo de juiz. E
isso eu faço há mais de 20 anos.
Me preparei durante estes
últimos seis meses. Respondi a
todas as perguntas que me foram feitas. Não houve nada que
me embaraçasse. E vale lembrar que o órgão já foi composto anteriormente por dois ministros de Corte Suprema [da
Austrália e das Filipinas].
Não é como na história da raposa e das uvas. Não vou sugerir que as uvas estavam verdes.
É claro que eu gostaria de ter sido escolhida. Mas não me sinto
pessoalmente derrotada.
FOLHA - Sua escolha era dada como quase certa no noticiário local.
Houve exagero na descrição de suas
chances ou reversão de favoritismo?
ELLEN GRACIE - Acho que a atitude positiva da imprensa é natural. E, até as vésperas da escolha, as sinalizações vindas de
Genebra eram favoráveis. Uma
motivação mais ampla, de ordem de geopolítica, deve ter determinado essa reversão.
FOLHA - Colegas de STF estavam
incomodados com suas ausências
durante a campanha pela vaga na
OMC. Alegavam que a situação era
demeritória para o Supremo.
ELLEN GRACIE - Li isso na imprensa. Pessoalmente, nunca
recebi reparo. Até porque comuniquei a eles antes de autorizar o lançamento da candidatura. Antes e agora, só recebi
manifestações de apreço. Divergências de opinião acontecem em qualquer família. Sempre fui ciosa das minhas atribuições e constante na minha
produção. Viajei por absoluta
necessidade. Não havia como
disputar o cargo sem essas viagens. Não prejudicaram em nada o andamento do tribunal.
FOLHA - O fato de que a sra. já tentou sair por duas vezes não pode levar à conclusão de que agora ficará
no STF apenas por falta de opção?
ELLEN GRACIE - A história de Haia
foi noticiada e continuou sendo
repetida, mas jamais postulei
aquela vaga. Desde início estava claro que o candidato brasileiro à Corte Internacional de
Justiça era o professor [Antonio Augusto] Cançado Trindade. E eu iniciava minha gestão
na presidência do STF.
Talvez a ideia tenha se propagado porque formei no STF um
grupo de estudos sobre a Convenção de Haia a respeito de sequestro de menores. As pessoas
confundiram. Chegou a haver
manifestação de apoio do presidente da República. Mas eu
própria nunca pleiteei.
FOLHA - Por que quis sair do STF?
ELLEN GRACIE - No âmbito nacional, o Supremo é o máximo a
que se pode aspirar. Mas a vaga
na OMC é uma posição importantíssima no que diz respeito
ao comércio internacional. Especialmente em tempos de crise, com o protecionismo em alta, esses mecanismos têm de
funcionar para impedir retrocesso. Minha candidatura foi
ditada pelo interesse nacional.
FOLHA - Ainda quer sair?
ELLEN GRACIE - Não. Esta foi uma
conjuntura especial. Agora retomo o meu trabalho, que, aliás,
nunca foi interrompido.
FOLHA - O ministro Gilmar Mendes
imprimiu um estilo bastante diferente do seu à frente do STF, mais
exposto hoje. Isso é bom ou ruim?
ELLEN GRACIE - Diferenças de estilo são normais. Não significa
que um seja mais ou menos eficiente do que o outro. O ministro Gilmar Mendes está fazendo uma bela gestão, dando continuidade a muitos avanços,
tanto no STF como no Conselho Nacional de Justiça.
Ele é mais aberto, conversa
mais com jornalistas. Eu sou
até criticada por não fazer isso.
FOLHA - O que a sra. achou da primeira indicação feita por Barack
Obama para a Suprema Corte?
ELLEN GRACIE - Sandra Day
O'Connor [que se aposentou
em 2006] é minha amiga. Ruth
Ginsburg [integrante da Corte]
também. Não conheço a juíza
Sonia Sotomayor, mas sei que é
altamente qualificada. E, para o
presidente Obama, será importante ter ali a representante de
uma minoria que já quase deixou de ser minoria nos EUA.
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