|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIO GASPARI
O Bolsa Ditadura tornou-se uma indústria
O assalto à bolsa da Viúva conseguiu o que 21 anos de perseguições não conseguiram, avacalhou
a velha esquerda
SE ALGUÉM QUISESSE produzir um
veneno capaz de desmoralizar a
esquerda sexagenária brasileira
dificilmente chegaria a algo parecido
com o Bolsa Ditadura.
Aquilo que em 2002 foi uma iniciativa destinada a reparar danos impostos
durante 21 anos a cidadãos brasileiros
transformou-se numa catedral de voracidade, privilégios e malandragens. O
Bolsa Ditadura já custou R$ 2,5 bilhões
à contabilidade da Viúva. Estima-se
que essa conta chegue a R$ 4 bilhões no
ano que vem. Em 1952, o governo alemão pagou o equivalente a R$ 11 bilhões (US$ 5,8 bilhões) ao Estado de Israel pelos crimes cometidos contra os
judeus durante o nazismo.
O Bolsa Ditadura gerou uma indústria
voraz de atravessadores e advogados
que embolsam até 30% do que conseguem para seus clientes. No braço financeiro do pensionato há bancos comprando créditos de anistiados. O repórter Felipe Recondo revelou que Elmo
Sampaio, dono da Elmo Consultoria,
morderá 10% da indenização que será
paga a camponeses sexagenários, arruinados, presos e torturados pela tropa do
Exército durante a repressão à Guerrilha do Araguaia. Como diria Lula, são 44
"pessoas comuns" que receberão pensões de R$ 930 mensais e compensações de até R$ 142 mil. Essa turma do
andar de baixo conseguiu o benefício
muitos anos depois da concessão de indenizações e pensões aos militantes do
PC do B envolvidos com a guerrilha.
O doutor Elmo remunera-se intermediando candidatos e advogados. Seu
plantel de requerentes passa de 200. Ele
integrou a Comissão da Anistia e dela
obteve uma pensão de R$ 8.000 mensais, mais uma indenização superior a
R$ 1 milhão, por conta de um emprego
perdido na Petrobras. No primeiro grupo de milionários das reparações esteve
outro petroleiro, que em 2004 chefiava
o gabinete do advogado Luiz Eduardo
Greenhalgh na Câmara. O Bolsa Ditadura já habilitou mais de 160 milionários.
É possível que o ataque ao erário brasileiro venha a custar mais caro que todos os programas de reparações de todos os povos europeus vitimados pelo
comunismo em ditaduras que duraram quase meio século. Na Alemanha,
por exemplo, um projeto de 2007 dava
algo como R$ 700 mensais a quem passou mais de seis meses na cadeia e tinha renda baixa (repetindo, renda baixa). Na República Tcheca, o benefício
dos ex-presos não pode passar de R$
350 mensais.
No Chile, o governo pagou indenizações de 3 milhões de pesos (R$ 11 mil) e
concedeu pensões equivalentes a R$
500 mensais. Durante 13 anos, entre
1994 e 2007, esse programa custou US$
1,4 bilhão. No Brasil, em oito anos, o
Bolsa Ditadura custará o dobro. O regime de Pinochet matou 2.279 pessoas e
violou os direitos humanos de 35 mil.
Somando-se os brasileiros cassados,
demitidos do serviço público, indiciados ou denunciados à Justiça chega-se
a um total de 20 mil pessoas. Já foram
concedidas 12 mil Bolsas Ditadura e há
uma fila de 7.000 requerentes.
Os camponeses do Araguaia esperaram 35 anos pela compensação. Como
Lula não é "uma pessoa comum", ficou
preso 31 dias em 1979 e começou a receber sua Bolsa Ditadura oito anos depois. Desde 2003, o companheiro tem
salário (R$ 11.239,24), casa, comida,
avião e roupa lavada à custa da Viúva.
Mesmo assim embolsa mensalmente
cerca de R$ 5.000 da Bolsa Ditadura.
(Se tivesse deixado o dinheiro no banco, rendendo a Bolsa Copom, seu saldo
estaria em torno de R$ 1 milhão.)
O cidadão que em 1968 perdeu a parte inferior da perna num atentado a
bomba ao Consulado Americano recebe pelo INSS (por invalidez), R$ 571
mensais. Um terrorista que participou
da operação ganhou uma Bolsa Ditadura de R$ 1.627. Um militante do PC do
B que sobreviveu à guerrilha e jamais
foi preso, conseguiu uma pensão de R$
2.532. Um jovem camponês que passou
três meses encarcerado, teve o pai assassinado pelo Exército e deixou a região com pouco mais que a roupa do
corpo, receberá uma pensão de R$ 930.
Nesses, e em muitos outros casos,
Millôr Fernandes tem razão: "Quer dizer que aquilo não era ideologia, era investimento?"
MADAME NATASHA
Madame Natasha sabe que o
ministro Gilmar Mendes não é
"uma pessoa comum", muito
menos "um juiz qualquer", mas
julgou conveniente oferecer-lhe uma de suas bolsas de estudo para habituá-lo a falar um
idioma de cada vez em seus textos. Outro dia o doutor escreveu um artigo referindo-se a
um "turning point" e acrescentou: "a virada". The senhora
acha que se ele tivesse falado só
in portuguese conseguiria the
mesmo resultado. O ministro já
fez a mesma coisa em alemão.
Falou em "projeto" e informou,
entre parênteses: "Entwurf".
Algo como dizer Volkswagen
para acrescentar: "carro do povo". Madame Natasha tropeçou
num "Bundesverfassungsgericht" e pensou que o teclado do
ministro estava com algumas
vogais travadas. Em português
isso seria "Corte Federal Constitucional".
CONVERSA DE PM
Depois de mandarem a PM
ao campus da USP, o governador José Serra e a reitora Suely
Vilela acharam melhor esfriar
os ânimos e retiraram a tropa.
Menos de uma semana depois,
por conta de uma baderna numa escola pública de Osasco, a
PM paulista entrou no estabelecimento, à sua maneira. Alguns alunos disseram que foram maltratados e um deles
deu queixa à Polícia Civil. Um
PM disse que as reclamações
eram "conversa de criança". No
último dia 12, o professor Vladimir Safatle escreveu um artigo denunciando que havia PMs
com metralhadoras no campus
da USP. No dia 16, o capitão Dorival Mignanelli desmentiu-o.
Safatle manteve o que disse.
Matou a cobra e mostrou a fotografia de um sargento com
uma submetralhadora a tiracolo. O desmentido do capitão era
conversa de adulto.
JOSÉ DE LAMBALLE
Com os pedidos para que se
afaste da presidência do Senado, José Sarney saiu da fase Du
Barry e entrou no zodíaco da
princesa de Lamballe. Madame
Du Barry, namorada de Luís 15,
saiu de Paris logo depois da
Queda da Bastilha e foi viver
em Londres. Não entendeu o
que estava acontecendo, voltou
e foi passada na lâmina. Aos 43
anos, a princesa de Lamballe
era a viúva mais bonita, elegante e rica de Paris. Ela também
fugiu para Londres, mas a lealdade à sua amiga Maria Antonieta chamou-a de volta. Foi
presa em 1791 e seus juízes exigiram que condenasse a família
real. Como sucede a Sarney
com seus amigos do Senado, ela
se recusou. Entregaram-na à
choldra. Do que lhe sucedeu há
duas versões:
Na leve, foi linchada, mutilada e decapitada. Na pesada, foi
linchada, mutilada e levaram
sua cabeça a um cabeleireiro
para um último penteado.
Nas duas versões, puseram-na na ponta de um pau e ergueram-na até a janela onde estava
presa Maria Antonieta. (O criado de Luís 16 viu a cena e registrou que os cabelos louros da
princesa "flutuavam em torno
do espeto").
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota comum
e apiedou-se do doutor Agaciel
Maia, que pediu licença remunerada para cuidar do "desgaste emocional". O que o cretino
não entende é porque Agaciel
mandou tocar a música do filme "O Poderoso Chefão" no casamento de sua filha, há poucas
semanas. Certa vez, enquanto
esperava um bonde na Lapa,
Eremildo ouviu um comentário de Madame Satã: "O Rei dos
Malandros é um otário", mas
como é um idiota, achou que
fosse bobagem.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Janio de Freitas: Os fiscais de Lula Índice
|