|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Ordens no Araguaia eram dadas por quatro generais
Militar Lício Maciel afirma que guerrilheiros do PC do B foram mortos em confrontos
O major Curió disse que militantes foram mortos quando já estavam presos, mas não citou qual militar teria dado essa ordem
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
O tenente-coronel da reserva
do Exército Sebastião Rodrigues de Moura, o "major Curió", guarda silêncio sobre um
ponto fundamental na história
da guerrilha do Araguaia: qual
oficial superior teria mandado
as equipes militares de campo
executarem guerrilheiros desarmados e prisioneiros.
Segundo as recentes entrevistas dadas ao jornal "O Estado de S. Paulo", Curió disse ter
recebido "ordens superiores",
de oficiais cujos nomes omitiu,
"para não deixar rastros da
guerrilha". Citou assassinatos
de duas prisioneiras, mas negou ter sido o autor. Também
não esclareceu os locais em que
os corpos de guerrilheiros teriam sido enterrados.
Dois oficiais do Exército que
tiveram papel destacado no
combate à guerrilha -mas que
negaram saber de ordem de
execução de prisioneiros- descreveram à Folha a cadeia de
comando militar das operações. Eles demonstraram irritação com as declarações de
Curió e negaram assassinatos
de guerrilheiros dominados.
Concederam entrevistas à
Folha, por telefone, o coronel
da reserva Gilberto Airton
Zenkner, 75, que foi o coordenador do plano de infiltração
"Operação Sucuri", a segunda
fase da campanha, e o tenente-coronel reformado Lício Augusto Ribeiro Maciel, 79, ferido
num tiroteio ao lado de Curió
no início da terceira campanha,
a "Operação Marajoara", que
exterminou a guerrilha.
O coronel Lício, autor de um
livro sobre o episódio, disse que
por volta do dia 7 de outubro de
1973 recebeu uma "ordem superior" para capturar os guerrilheiros "vivos ou mortos". Segundo Lício, a ordem não falava
de execução de prisioneiros.
A ordem, segundo ele, mudou todo o esquema dos militares para o combate. A partir dela, os guerrilheiros foram sendo
eliminados -segundo ele, sempre em confrontos armados. O
tenente-coronel disse que não
guardou nenhuma cópia da ordem nem se recorda do nome
de quem a assinou.
Ao longo dos quatro anos em
que durou o conflito, as Forças
Armadas lançaram três campanhas contra os militantes do PC
do B que pretendiam derrubar
a ditadura (1964-1985) e fundar
um governo comunista no Brasil. A cadeia de comando modificou-se ao longo desse período. A ordem de oficiais descrita
nas entrevistas corresponde à
época da "Marajoara", que se
estendeu de 1973 a meados de
1974. No período ocorreram 47
desaparecimentos de guerrilheiros, segundo o livro "A Lei
da Selva", de Hugo Studart.
De acordo com Lício, a cadeia
começava no presidente da República, Emílio Médici, passava
pelo ministro do Exército, Orlando Geisel, pelo general Milton Tavares de Souza, comandante do CIE (Centro de Informações do Exército), e chegava
ao chefe da seção de operações
do CIE, coronel Carlos Sérgio
Torres. Os quatro oficiais morreram entre o final do anos 70 e
o final dos 80.
Torres enviava as ordens para as equipes de campo, em sintonia com seu superior, Tavares, depois substituído na chefia do CIE pelo general Confúcio Avelino. "As ordens vinham
de Médici, de Geisel, de Milton
e de Torres. Os nossos relatórios faziam o caminho inverso",
disse Lício, para quem Torres
foi "um homem valoroso".
"O Curió demonstrou total
má-fé. Dizer que "respeita" os
bandidos. Eles tinham o dinheiro dos comunistas. Os próprios generais em Brasília ficavam revoltados. A tropa, andando na mata, eles matavam e
ficava por isso mesmo. Por
quê? Porque eles [militares]
não tinham [até 73] ordem para
revidar", disse Lício.
Texto Anterior: Saiba mais: Papel do Senado é atuar como força estabilizadora Próximo Texto: Entrevista: "Se houve excessos, foi dos dois lados" Índice
|