São Paulo, Domingo, 28 de Novembro de 1999


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"Me ajeite R$ 50 mil", diz envolvido

FÁBIO GUIBU
da Agência Folha, em Teresina

Conversa telefônica gravada pela Polícia Federal entre Francisco Domingos de Sousa, o Domingão, suposto chefe do escritório do crime organizado no Piauí, e o prefeito de Canto do Buriti (PI), Eurimar Nunes (PPB), revela como funcionava o esquema para desviar dinheiro público das prefeituras com a utilização de notas fiscais frias.
Na ligação, grampeada em 13 de junho passado, Domingão e Nunes acertam a emissão de R$ 50 mil em notas frias para justificar uma falsa aquisição de materiais escolares e medicamentos pela prefeitura.
A Justiça decretou a prisão de Domingão, que está foragido. O prefeito Eurimar Nunes disse que é inocente. Ele afirma que foi "vítima" do crime organizado, e que foi "pressionado várias vezes" para desviar dinheiro.
"Todo mundo sabia que existia esse grupo aí, exterminando o povo. O prefeito ia morrer porquê?", diz Nunes.
Fazendo gravações de conversas telefônicas, a Polícia Federal descobriu que o grupo supostamente chefiado pelo coronel José Viriato Correia Lima desviava recursos de pelo menos 80 prefeituras no Piauí, Maranhão e Ceará usando notas fiscais frias.
Leia a seguir trechos da conversa gravada pela Polícia Federal:
Eurimar Nunes - O Domingão, por favor.
Francisco Domingos de Sousa, o Domingão - Quem fala?
Nunes - Eurimar.
Domingão - O seu Eurimar, como vai o sr.?
Nunes - Tudo bem.
Domingão - Antes de o sr. viajar para lá, eu queria que o sr. ajeitasse aí para eu pegar um negocinho para fechar. Ajude nós (sic), rapaz.
Nunes - (risos) Tá. Faz o seguinte: a que horas eu te acho amanhã?
Domingão - O rapaz que está com uns negócios está viajando hoje. Eu só tenho hoje à tarde.
Nunes - É mesmo, rapaz?
Domingão - É, rapaz, me ajude.
Nunes - Vou ajudar. Mas é o seguinte, amanhã é que pode ter um troquinho aí do ICMS.
Domingão - Rapaz, eu não estou falando disso não. Me ajeite aí... O sr. dá os prazos... Pelo menos R$ 50 mil, homem.
Nunes - Em nota?
Domingão - Sim, rapaz.
Nunes - (risos) Tá certo.
Domingão - Eu vou com o Marco, aí, agora, tá bom?
Nunes - Não, eu estou de saída, filho de Jesus. Faça o seguinte: você bota aí setembro, novembro e dezembro. Distribui aí. Tudo daquelas coisas sem licitação.
Domingão - Setembro, novembro...
Nunes - É, para o seguinte: negócio escolar, material escolar.
Domingão - Isso tudo, é?
Nunes - Tudo. Você divide. Bota tudo bonitinho aí, entendeu? E quanto é que fica isso aí?
Domingão - O sr. dá os 15% da gente, não é?
Nunes - Não, não. Você está doido, rapaz.
Domingão - Amanhã eu converso. Quando ajeitar aqui tudo... Tem que ajeitar, nós têm (sic) que ajeitar isso aí, tá bom?
Nunes - Tira os 50, viu?
Domingão - O que o sr. falou: 60.
Nunes - Cinquenta. Pode tirar 50.
Domingão - Tá bom.
Nunes - Mas não bote nenhuma repetida, daquelas que já foram para lá, não.
Domingão - Não, não, não. Ó, isso aqui é só de material escolar?
Nunes - É. Pode botar aí um pouquinho de saúde, medicamento.
Domingão - Tá bom, viu?
Nunes - Até logo.


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