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Militares acusam Exército de punir atuação política
Após as eleições, ao menos 50 oficiais e praças não-eleitos foram transferidos de guarnições
Apesar do rigor da disciplina, militares se organizam para entrar com ação coletiva exigindo voltar a postos que estavam antes de se licenciar
ANA FLOR
ENVIADA ESPECIAL A PORTO ALEGRE
Militares que concorreram
nas eleições municipais e não
se elegeram acusam o Exército
de boicotar suas aspirações políticas por meio de transferências que os tirem de seus redutos eleitorais.
Pelo menos 50 oficiais e praças não-eleitos acabaram em
guarnições diferentes daquelas
que estavam quando se afastaram para disputar o pleito de
2008. Entre eles estão militares que fazem parte de um movimento que se auto-intitula
"Capitanismo", grupo não reconhecido pelo Comando do
Exército que se organiza para
ter maior participação política.
Apesar do medo de punições,
militares nessa situação apresentaram queixa ao Ministério
Público Federal. Eles se organizam para entrar com uma ação
coletiva na Justiça exigindo o
retorno aos postos que ocupavam antes de julho, quando se
licenciaram para concorrer.
Os transferidos ganharam o
apoio da deputada federal Luciana Genro (PSOL-RS), que
enviou ofício ao Ministro da
Defesa, Nelson Jobim, pedindo
a revogação das transferências.
Segundo ela, a decisão tem "indícios de perseguição política".
Dois militares que concorreram a vereador e foram transferidos citam o alto custo das
transferências -calculadas por
eles em R$ 30 mil por militar,
em média-, que acarretariam
um custo de mais de R$ 1,5 milhão aos cofres da União.
A participação política e a
eleição de militares da ativa é
permitida pela Constituição.
Por estarem na ativa, eles são liberados da regra de filiação um
ano antes do pleito. Caso eleitos, precisam se desligar da corporação ou ir para a reserva.
Nas eleições municipais de
outubro, mais de 80 praças e
oficiais do Exército concorreram. Nem todos fazem parte do
"Capitanismo", e quem faz não
diz abertamente -também para evitar punições.
O grupo é liderado por capitães que dizem estar em um patamar intermediário entre "os
generais da ditadura" e "a geração democrática de não-oficiais". Eles têm reivindicações
internas, como o fim das punições por meio de restrição de liberdade (as prisões no quartel),
direito à liberdade de expressão e maior participação das
mulheres em todos os escalões
do Exército. Mas há também a
vontade de ampliar o papel das
Forças Armadas, com maiores
investimentos em Defesa, e
pautas internacionais, como a
integração da América Latina.
Desde 2004, o grupo debate
como participar mais da política partidária brasileira. Apesar
de trabalhar para eleger vereadores e prefeitos, o alvo não é
obter postos municipais, mas
construir a base para eleger
congressistas. "Queremos ter
participação nacional", diz Luis
Fernando Ribeiro de Sousa, capitão da ativa que se prepara
para ser candidato a deputado
federal e único que aceitou falar à Folha. Para 2010, diz ele, o
grupo planeja eleger um deputado federal por Estado.
Apesar de não se considerarem de direita ou de esquerda,
os "capitanistas" são simpáticos ao governo do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva. Entre
as razões, segundo Sousa, está
sua veia desenvolvimentista.
O grupo acredita que as Forças Armadas são contrárias ao
envolvimento político de seus
integrantes, ignorando que a
história dos militares no país é
repleta de exemplos de grandes
políticos. O duque de Caxias,
patrono do Exército, foi senador e presidente do Conselho
de Ministros. Vários generais
foram presidentes, a começar
por Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Hermes da Fonseca e Eurico Dutra foram eleitos diretamente.
O pesquisador Gláucio Ary
Dillon Soares, autor do livro "A
Democracia Interrompida",
afirma que há tradição antiga
de participação militar na política, mas o Exército atual
"aprendeu com a maré de desprestígio vinda com a ditadura
que o melhor é ser só militar".
O pesquisador diz, porém,
que decisões da atual administração têm irritado militares.
Ele dá como exemplo a percepção de que o Brasil é "usado"
por outros países da América
Latina, sem uma resposta adequada. "A ala nacionalista das
Forças Armadas sente-se quase insultada com a pusilanimidade do governo Lula."
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