São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2004

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LONGE DO GABINETE

Comportamento de "ministro-premiê" incomoda presidente

Lula vai enquadrar Dirceu por "atropelar" ministros

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Assim que voltar do exterior, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai enquadrar o ministro José Dirceu (Casa Civil), por avaliar que ele está extrapolando a ordem para se dedicar exclusivamente ao gerenciamento do governo.
Segundo a Folha apurou, já chegou ao Palácio do Planalto a contrariedade de Lula com as atropeladas que outros ministros sofreram de Dirceu nos últimos dias, além de seu incômodo com a publicidade dos novos poderes do ministro -que vem se comportando de fato como chefe de governo na ausência do presidente.
Em visita à Índia (7 horas e 30 minutos adiante do horário de Brasília), Lula acompanhou os fatos políticos da semana. Chateou-se, por exemplo, com a declaração de Dirceu dizendo que o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) não é contra o projeto de lei do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), que amplia benefícios fiscais na região Norte.
De uma só tacada, Dirceu atropelou Palocci, que se opõe ao projeto, e Aldo Rebelo, porque falou de um assunto que deveria ser conduzido a partir de agora pelo novo ministro da Coordenação Política e Assuntos Institucionais. Rebelo teme que Dirceu não desencarne da coordenação política.
Lula também não gostou da afirmação de Dirceu de que reformularia órgãos do governo, como Funai e Embrapa, que estão lotados em outros ministérios. Alguns ministros viram a declaração como uma espécie de autorização para intervenções públicas em outras pastas.
Não foi isso o que Lula combinou com Dirceu quando tirou da Casa Civil as funções políticas e levou para a pasta a parte de gestão governamental que estava no Planejamento. Dirceu tem poder delegado por Lula para se dedicar ao gerenciamento de governo, mas não para se comportar publicamente como primeiro-ministro.
Segundo a Folha apurou, Lula disse a Dirceu desejar que ele atue "para dentro do governo", acompanhando melhor as ações ministeriais e a execução orçamentária. Lula quer ainda que Dirceu saia dos holofotes.

Estilo Dirceu
Sua contrariedade se deve mais ao estilo de Dirceu do que ao conteúdo das decisões de governo propriamente ditas. Exemplo: o ministro da Casa Civil disse publicamente que o governo não enviaria ao Congresso em 2004 o projeto de autonomia do BC (Banco Central). É o que deve acontecer, mas não era para ser dito. Palocci reclamou, e Dirceu recuou depois de ser enquadrado por Lula no Palácio da Alvorada.
Políticos ligados a Dirceu avaliam que ele precisa tomar o cuidado de não repetir Clóvis Carvalho, ministro da Casa Civil no primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-1998). Ou seja, com uma eventual reeleição de Lula, não reassumir a Casa Civil.
Carvalho começou como um discreto chefe da Casa Civil, que se orgulhava de governar com os secretários-executivos (aqueles que são a segunda posição em cada ministério). Nunca falava de política. No entanto, terminou o primeiro mandato com fama de homem forte, mais até do que Pedro Malan (Fazenda), que enfrentaria desgaste logo em seguida, com a desvalorização do real.
No início do segundo mandato, Carvalho, à época no Ministério do Desenvolvimento por manobra de FHC para afastá-lo do Palácio do Planalto, trombou com Malan e acabou caindo.


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