São Paulo, segunda-feira, 29 de maio de 2006

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ENTREVISTA DA 2ª/PEDRO SIMON

Líderes governistas do PMDB são "diabólicos"

PEDRO SIMON diz ter levado "um susto" ao escutar a proposta de candidatura à Presidência pelo PMDB de seu vice na chapa, Anthony Garotinho. Sem estrutura de campanha, afirma que pode desistir caso um nome de consenso surja na sigla. Nesse caso, vai concorrer ao Senado. Sua maior preocupação, afirma, é evitar que as eleições sejam polarizadas entre PT e PSDB e que seu partido "se humilhe" ao abrir mão da disputa.

SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Recém-lançado pré-candidato do PMDB à Presidência, o senador Pedro Simon (RS), 76, rotulou como "diabólicos" os companheiros de partido contrários à candidatura própria. Destacou dois: o ex-presidente José Sarney e o presidente do Senado, Renan Calheiros. Ambos, diz, têm mais cargos no governo Lula do que qualquer petista. Por isso, lutam contra a candidatura própria do PMDB, pois lideram um grupo que "distribui favores, empregos, vantagens". Em entrevista à Folha na noite de quinta-feira, no Senado, Simon disse que até poderia desistir de sua candidatura, caso surja no partido um nome de consenso. Nesse caso, ou no de uma derrota na convenção, sua opção é o senado. "Formou-se um movimento, e eu aceitei porque me disseram isso: vamos aceitar o movimento porque o objetivo dele é ter candidato. Depois vamos ver quem será o candidato." O senador assumiu a pré-candidatura após a desistência do ex-governador do Rio Anthony Garotinho, seu vice na chapa. Logo depois, a ala governista do PMDB conseguiu adiar, de 11 para 29 de junho, a convenção que decidirá se haverá ou não candidato próprio. Como o governador de São Paulo, Cláudio Lembo (PFL), ele culpou as elites pela crise social. Disse que o PT, ao assumir o governo, passou a integrar essa elite, que "não está à altura da nação e do povo". A Folha tentou ouvir Sarney e Renan. A assessoria do ex-presidente informou que ele não falaria sobre as críticas. Renan não foi localizado.  

FOLHA - O adiamento da convenção do PMDB é um golpe, como afirmou Garotinho?
PEDRO SIMON
- Tenho que esclarecer que venho há muito tempo lutando pela candidatura própria do MDB. Quando ele [Garotinho] disse que renunciava à candidatura em meu favor, decidimos registrar a chapa. Mas eu buscava o entendimento com os governistas. Usava dois argumentos. Primeiro, para mim é muito mais grave do que está parecendo o que aconteceu em São Paulo. Para mim foi o primeiro aparecimento oficial da máfia superorganizada no Brasil. O segundo aspecto: uma campanha do PT e do PSDB, se não tiver uma terceira candidatura do PMDB, não sei como vai terminar.

FOLHA - O sr. teme que termine de que forma?
SIMON
- Um aspecto insurrecional. As agressões, os fatos, as gravidades. Onde tudo o que o PT disser do PSDB praticamente é verdade e tudo que o PSDB disser do PT é praticamente verdade. Se for um candidato do PMDB ele vai conduzir a campanha. Não vamos fazer campanha em cima nem do PT nem do PSDB. Como é que o PMDB, numa hora como essa, em que aparece diante dele um quadro em que sua posição é fundamental, na pior das hipóteses para decidir quem vai ganhar, como é que ele cai fora?

FOLHA - Como o partido está reagindo internamente?
SIMON
- O que está acontecendo é que tem gente com grandes cargos. Vocês da Folha, que gostam tanto de pesquisa, façam uma no PT para ver se tem alguém lá com tantos cargos no governo quanto o Renan e o Sarney.

FOLHA - Como o sr. sabe disso?
SIMON
- Os caras lá de dentro do próprio PT vieram me dizer que não tem. Lula não está preocupado com nosso apoio. O que ele quer é que não tenhamos candidato.

FOLHA - Aí ele pode ganhar no primeiro turno.
SIMON
- Se não tivermos candidato, assume imediatamente o ministro da Saúde, do Renan, e o dos Transportes, do Sarney, que já tem Minas e Energia, e sei lá mais o quê. É uma situação feia essa. O PMDB se desmoralizar, se humilhar.

FOLHA - O sr. vislumbra chance de vitória no dia 29, mesmo com o poder dos governistas no partido?
SIMON
- Uma coisa é a ala governista, outra são as bases do partido. É claro que a ala governista distribui favores, empregos, vantagens. Libera emenda tal, libera ambulância tal e mais não sei o quê. Isso influi.

FOLHA - Até a convenção o sr. roda o país inteiro?
SIMON
- Não sei. Fico aqui, pelo menos vou para a tribuna quase todo dia no Senado.

FOLHA - O sr. fica?
SIMON
- Fico e rodo. Mas vou manter aceso o debate. Podemos, com Garotinho, viajar para o interior.

FOLHA - Se a convenção derrota a candidatura própria, o sr. disputa o Senado?
SIMON
- Disputo.

FOLHA - O sr. disse, ao registrar a candidatura, que em seu governo a pessoa erra uma vez, não erra duas.
SIMON
- O que quis dizer é que tenho um estilo. Fui governador, ministro. Meu governo é o da seriedade. Muita gente eu tirei do governo na dúvida. Posso até ter cometido injustiça, mas errou, caiu fora.

FOLHA - A sua decisão de concorrer na convenção é irreversível ou poderá desistir? Garotinho já disse que, se o sr. mudar de idéia, ele volta a ser pré-candidato à Presidência.
SIMON
- É tranqüilo. Eu vou, Garotinho também vai. Eu posso até sair, fica o Garotinho, não tem problema. Mas eu vou.

FOLHA - Há quatro anos o sr. almejou ser o candidato do PMDB a presidente...
SIMON
- Não deixaram. Embora reconhecesse que a vez era do Lula. Eu era um sonhador de achar que o PT e o Lula fariam um governo fantástico.

FOLHA - E agora, o sr. quer?
SIMON
- Dessa vez eu estava na candidatura ao Senado. Vou ser sincero: quando Garotinho falou em meu nome eu levei um susto, tanto que nem respondi. Formou-se um movimento, e eu aceitei porque me disseram isso: vamos aceitar o movimento porque o objetivo dele é ter candidato. Depois vamos ver quem será o candidato.

FOLHA - Mas o sr. pode não levar sua candidatura adiante?
SIMON
- Não fecho a porta para isso. Se nós ganharmos [na Justiça] as duas decisões, de suspender a Executiva e as convenções estaduais não poderem ser realizadas antes da nacional, o pessoal governista é capaz de nos procurar.

FOLHA - Para compor com a candidatura própria?
SIMON
- Pode ser.

FOLHA - O sr. tem estrutura de campanha?
SIMON
- Não.

FOLHA - Garotinho tinha. Ele colocou à sua disposição?
SIMON
- Nem perguntei nem ele me falou. A única coisa que ele disse é que trabalha comigo por todo o Brasil.

FOLHA - O sr. falou em aspecto insurrecional. De onde partiria isso?
SIMON
- Estamos vivendo um momento de marasmo. Parece que o povo ficou entorpecido. Mas há um sentimento de mágoa em relação ao que está acontecendo no Brasil, no Congresso, nos partidos, em todos os lados. Isso pode explodir na campanha quando vierem os ataques, as denúncias de lado a lado, os dossiês. Quando aparecerem acho imprevisível o que pode acontecer.

FOLHA - O povo pode ir às ruas?
SIMON
- Pode ser. Já foi.

FOLHA - O que o leva a pensar isso?
SIMON
- É um povo sem referências. Lula, se não fosse candidato a presidente, seria a grande referência, mas ele está na jogada, o que é muito ruim, muito triste. É um candidato à reeleição que está no governo, usando a máquina do governo.

FOLHA - O sr. já pensou em disputar o segundo turno contra Lula?
SIMON
- Sinceramente, nunca pensei. Não entrei ainda nessa etapa. Como dizia o dr. Ulysses [Guimarães, fundador do PMDB, morto em 1992]: "Espera chegar na beira do rio para tirar a sandália".

FOLHA - O sr. está pessimista?
SIMON
- Sou um otimista. O Brasil tem tudo para ser uma grande nação. O que temos de mau é a elitezinha nossa. A elite brasileira não está à altura da nação e do povo brasileiro.

FOLHA - O PT é elite?
SIMON
- É elite. Entrou no governo, virou elite, virou isso aí.

FOLHA - O sr. também é otimista quanto ao atual momento do país?
SIMON
- Quero ser pessimista para não alimentar um otimismo exagerado. Sei que essa gente é diabólica. Tem o presidente do Senado, o líder da Câmara [Geddel Vieira Lima], o líder do Senado [Ney Suassuna], a maioria esmagadora da Executiva, cargos a distribuir, três, quatro, cinco ministros, diretores da Petrobras, da Eletrobrás, um troço que você nem tem idéia. Portanto, não pode alimentar esperança. Os caras estão pensando nos cargos. Eles não trocam isso pela nomeação de um presidente. (...) Sarney não teve tanto poder nem quando era presidente. Ele não tinha o poder que tem hoje.

FOLHA - Na questão da violência, o que o sr. faria na Presidência?
SIMON
- O que aconteceu em São Paulo foi o primeiro gesto de máfia organizada no Brasil. Igual à Itália e aos Estados Unidos. Eu pensaria na Operação Mãos Limpas da Itália e na Tolerância Zero, de Nova York.

FOLHA - O que o sr. faria em relação à dívida externa?
SIMON
- O Brasil deveria negociar com seus credores. É o país que paga os juros mais altos do mundo. Que parte desses juros sejam dedicados a equacionar os problemas sociais do Brasil.

FOLHA - O que o sr. acha da atuação do Brasil na chamada integração latino-americana?
SIMON
- O Brasil iniciou a integração da América Latina e tem todas as condições de levá-la adiante. Temos de ter um olhar mais dedicado ao problema social, com mais vigor. Não é o que a gente sente no governo Lula, surpreendentemente. Quanto à integração, ficamos quase sozinhos.


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