São Paulo, quarta-feira, 29 de junho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/O PARTIDO

Instituição é a mesma na qual Marcos Valério fez saques em dinheiro totalizando R$ 21 mi

PT emprestou R$ 3,6 mi do Banco Rural no governo Lula

CLÁUDIA TREVISAN
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

O PT conseguiu no Banco Rural em 2003 e 2004, os primeiros da gestão Luiz Inácio Lula da Silva, empréstimos cujo saldo atingia R$ 5,167 milhões em dezembro do ano passado. Sediado em Belo Horizonte, o Rural tem relações com o publicitário Marcos Valério de Souza, apontado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) como um dos operadores do "mensalão" -o suposto pagamento de parlamentares em troca de apoio político ao Planalto.
Em 2002, o PT só tinha contas bancárias no Banco do Brasil, em agências de São Paulo e Brasília. No ano seguinte, o partido passou a ser cliente de outros bancos e abriu uma conta no Banco Rural, onde conseguiu financiamento de R$ 3,597 milhões, apesar de registrar patrimônio líquido negativo de R$ 4,196 milhões.
Isso significa que se o PT vendesse seus ativos e recebesse os créditos a que tinha direito, ainda faltariam R$ 4,196 milhões para pagar suas obrigações.
Nas poucas vezes em que se manifestou sobre as acusações que pesam contra ele, Valério reconheceu que tem relação bastante próxima com a diretoria do Rural. Em entrevista à revista "Veja" desta semana, o publicitário disse que era amigo do dono do banco, José Augusto Dumont, morto no ano passado. "Éramos muito amigos. Quando ninguém me dava crédito, ele me emprestava dinheiro", declarou.
Valério reconheceu na mesma entrevista que esteve "várias vezes" no BC (Banco Central) na companhia de Dumont. Segundo ele, o Banco Rural era seu cliente e queria adquirir o controle dos bancos Mercantil de Pernambuco e Econômico, que estão em processo de liquidação no BC.
O publicitário disse ainda à "Veja" que conheceu o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, "em meados de 2002". É "meu melhor amigo, um bicho do mato como eu", afirmou, sobre Delúbio. Ao "Jornal Nacional", Valério disse que viajou duas vezes em avião do Banco Rural.
No depoimento que deu no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, Jefferson afirmou que recebeu R$ 4 milhões de Valério em maços de R$ 50 e R$ 100 envoltos em cintas do Banco Rural e do Banco do Brasil. O pagamento seria parte de um acordo de ajuda do PT ao PTB nas eleições municipais de 2004.
Os dados sobre os empréstimos do banco mineiro estão nas prestações de contas de 2003 e 2004 que o PT apresentou ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), assinadas por Delúbio e pelo presidente do PT, José Genoino.
A documentação registra financiamento do Banco Rural de R$ 3,597 milhões, concedido no dia 28 de novembro de 2003. No ano seguinte, em 21 de dezembro, o valor subiu para R$ 5,167 milhões, o que colocou o banco na condição de maior credor do PT. O balanço também registra débito de juros de R$ 137 mil em 21 de dezembro de 2004.
A assessoria de imprensa do PT informou que o aumento do valor se deve à rolagem do empréstimo, com a incorporação ao principal dos juros e encargos.

Crédito na praça
O Rural não foi o único banco que aumentou o crédito ao PT nos últimos dois anos. O BMG, também de Belo Horizonte, concedeu empréstimo de R$ 2,4 milhões no dia 17 de fevereiro de 2003. No balanço do PT de 2004, o valor deste financiamento subiu para R$ 2,741 milhões.
O Banco do Brasil, que em 2002 era o único credor do PT, também aumentou seus empréstimos ao partido. Os financiamentos passaram de R$ 705 mil, em 2002, para R$ 1,05 milhão em 2003 e, em 2004, chegaram a R$ 3,5 milhões.
Somados, os saldos dos empréstimos dados ao PT pelas três instituições financeiras atingiram R$ 7,047 milhões em 2003 e R$ 11,860 milhões no ano seguinte. Neste período, a situação financeira do PT piorou e seu patrimônio líquido negativo passou de R$ 4,2 milhões para R$ 24,7 milhões.
Analista financeiro ouvido pela Folha disse que não é usual a concessão de crédito a um cliente que apresenta situação financeira semelhante à do PT. Em sua opinião, a operação pode ocorrer se for apresentada uma "garantia muito forte". No caso do PT, as garantias são fracas, já que o partido tem poucos imóveis em seu ativo. Uma saída seria a apresentação de aval ou fiança fortes.
O PT afirma que a garantia do empréstimo são as receitas do partido, que subiram de R$ 13,53 milhões em 2002 para R$ 32,74 milhões em 2003 e R$ 48 milhões no ano seguinte. O analista ouvido pela Folha observou que o aumento da receita foi acompanhado da elevação dos gastos do partido, o que levou o patrimônio líquido a ficar negativo.
A assessoria do PT informou ainda que os empréstimos não foram pagos e continuaram a ser renegociados. A determinação da direção do partido é quitar todas as dívidas até o fim deste ano.


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