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Sarney vendeu terras sem pagar imposto
Como 318 dos 540 hectares negociados por R$ 3 mi nunca foram registrados em seu nome, senador se livrou de parte dos tributos
Fazenda na divisa de GO com o DF foi comprada em 2002 por empresa que tem Sarney como sócio, mas mantém áreas em nome de terceiros
ALAN GRIPP
FERNANDA ODILLA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente do Senado, José
Sarney (PMDB-AP), vendeu
terras na divisa de Goiás com o
Distrito Federal que nunca foram registradas em seu nome,
artifício que o livrou do pagamento de impostos.
Sarney comprou a Fazenda
São José do Pericumã no início
dos anos 1980 e a vendeu em setembro de 2002. Mas levantamento feito pela Folha em cartórios da região mostra que o
senador nunca foi o proprietário, no papel, de 318 dos 540,2
hectares negociados por ele
por R$ 3 milhões.
A área foi vendida para a Divitex, empresa que tem o próprio Sarney como sócio. O negócio foi feito por meio de um
compromisso de compra e venda, registrado em dois cartórios
de Brasília em setembro de
2002. No documento, ao qual a
Folha teve acesso, Sarney e a
mulher, Marly, constam como
"os legítimos possuidores e
proprietários do imóvel".
Contudo, sete anos depois de
Sarney negociar o Pericumã,
pelo menos 245 hectares continuam em nome de terceiros,
entre eles o de Roseana Sarney.
Ela informou, por meio da assessoria do governo do Maranhão, ter passado 190 hectares,
em 2001, para o nome do pai,
que venderia as terras. Sarney
não explicou por que nunca
transferiu essas glebas para o
nome dele antes de negociá-las.
Se fosse denunciado por má-fé à época, afirmam especialistas consultados pela Folha, o
presidente do Senado poderia
ser acusado de ilícito fiscal e
multado por deixar de transferir glebas para o próprio nome
para não pagar tributos referentes à aquisição de parte das
terras. Só que a cobrança prescreveu após cinco anos.
A Prefeitura de Luziânia, cidade a que pertencia parte do
Pericumã à época em que Sarney adquiriu a propriedade, informou que, sem o registro do
imóvel em cartório, não há
chance de ter sido pago o ITBI
(Imposto Sobre Transmissão
de Bens Imóveis).
O secretário de Finanças de
Luziânia, Edson Brás, diz que
os negócios feitos por meio de
contratos de gaveta desfalcam
uma importante fonte de arrecadação do município.
"Se o cartório [onde foi registrada a compra e venda] nos informasse do negócio feito de
forma particular, teríamos a
obrigação de tributar, mas isso
nunca acontece. Agora, este
imposto já deve estar até prescrito", disse Brás.
Na lista de terras negociadas
por Sarney que têm terceiros
como proprietários no papel,
há ainda um terreno registrado
em nome dos aposentados Emmanuel de Sá Roriz e José Andrade, que venderam a maior
parte do Pericumã a Sarney
nos anos 80. Segundo eles, o senador pagou tudo, mas nunca
oficializou parte da aquisição
-4,93 hectares- no cartório
de registro de imóveis.
Sem transferir para seu nome a propriedade de pelo menos oito áreas, Sarney deixou
de pagar ITBI. O ex-chefe da
Receita Everardo Maciel está
entre os que classificam a estratégia, chamada de elisão fiscal, como artimanha do "contribuinte esperto".
Cruzamento das terras listadas no compromisso de compra e venda com registros em
cartórios revela que Sarney
também negociou uma área
que está em nome da Terracap
(a companhia imobiliária do
governo do DF), na cidade de
Santa Maria (DF) e 14 hectares
que, desde 1985, estão em nome de Maurícia Gonçalves Soares, que já morreu.
A única fatia do Pericumã
hoje legalmente no nome da
Divitex é um terreno de 33,8
hectares. O registro da área,
encontrado pela Folha no cartório de Luziânia (GO), revela
que um antigo dono, Wanderley Ferreira de Azevedo, a
transferiu diretamente para a
empresa em 2007. Para efeitos
legais, é como se Sarney jamais
tivesse sido proprietário da terra, apesar dela estar listada no
compromisso de compra e venda que firmou com a Divitex.
O não registro agora cria problemas para a Divitex. A empresa tem planos transformar a
fazenda num condomínio de
luxo, mas está impossibilitada
pelo fato de não possuir os registros de parte significativa da
propriedade, 170 hectares.
Para tentar resolver a situação, a Divitex move uma ação
de usucapião contra o próprio
Sarney. O lucro obtido com a
venda do Pericumã foi a explicação dada por Sarney para os
R$ 2,2 milhões sacados de uma
conta dele no Banco Santos um
dia antes de o banco de Edemar
Cid Ferreira quebrar, em 2004.
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