São Paulo, segunda-feira, 29 de agosto de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ RUMO A 2006

Presidente pede que recursos fiquem concentrados em obras e programas em andamento

Lula evita novos projetos e prioriza as inaugurações

KENNEDY ALENCAR
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu que o Orçamento Geral da União de 2006 não terá obras e programas novos de grande porte. No entanto, Lula busca o maior volume possível de inaugurações no próximo ano, de eleições presidenciais.
Para isso, Lula pediu que os seus auxiliares fizessem um pente-fino para concentrar recursos nas obras e programas já em andamento ou que não saíram do papel em 2005.
As exceções ficaram por conta de três novos trechos de ferrovias e obras pequenas, consideradas pelo próprio governo de pouca relevância orçamentária. Tais obras custam até R$ 10,5 milhões e nem chegam a ser analisadas pela equipe econômica.
A Folha apurou que Lula recusou cerca de 200 grandes projetos novos apresentados por ministros. Além disso, recomendou prioridade aos projetos em fase mais adiantada de execução.
"Não quero começar nenhum projeto novo", disse o presidente em conversas reservadas, quando ministros levaram propostas de obras ou programas novos em 2006. "Temos de terminar o que já está em andamento para não haver desperdício", afirmou o presidente, segundo relatos de auxiliares à Folha.
Para tentar superar a crise política e recuperar prestígio para eventual campanha de reeleição, Lula aposta em um crescimento econômico significativo, na limitação dos efeitos das denúncias ao ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e em um pacote de obras.
De acordo com as últimas pesquisas Datafolha e Ibope, Lula não seria reeleito se a eleição fosse hoje. O pleito está marcado para daqui a 14 meses.
A proposta de 2006 será enviada na quarta-feira ao Congresso, conforme prazo previsto em lei.

Pressão por verba
O governo pretende destinar cerca de R$ 14 bilhões para investimentos, mas este número ainda poderá subir na reunião final que o presidente fará até quarta-feira, dia em que enviará a proposta orçamentária ao Congresso. No ano passado, o governo enviou uma proposta que previa R$ 14,47 bilhões para 2005.
A Folha apurou que há pressões de última hora para que as áreas social (sobretudo da educação) e de infra-estrutura recebam mais recursos.
Da verba total para 2006, R$ 3 bilhões fazem parte do PPI (Projeto-Piloto de Investimentos), cujo valor é excluído do cálculo do superávit primário -toda a economia do setor público para pagar juros de sua dívida. Apesar de o Brasil não ter mais acordo com o Fundo Monetário Internacional, esta regra de exclusão foi acertada com o FMI.
No projeto-piloto, estão as únicas três novas obras previstas para o ano que vem. São trechos ferroviários tidos como emergenciais para o governo. Eles se localizam nos Estados da Bahia (contorno de São Félix), Rio Grande do Sul (contorno de São Francisco) e Rio de Janeiro (ajustes na ferrovia em Barra Mansa).
No PPI, o governo também decidiu destinar R$ 1 bilhão para a finalização de metrôs em quatro capitais: Belo Horizonte (MG), Recife (PE), Fortaleza (CE) e Salvador (BA). No caso das três últimas, o governo federal está em fase final de negociação com os Estados para incluir as obras dos metrôs ainda no PPI deste ano.
Foi decidido também que o governo estreará as PPPs (Parcerias Público-Privadas) com cinco projetos. São eles: a ferrovia Norte-Sul, o trecho na Bahia da rodovia federal BR-116, o anel ferroviário de São Paulo, o arco rodoviário do Rio de Janeiro e um trecho da ferrovia Guarapuava-Ipiranga para melhorar o acesso ao porto de Paranaguá (PR).
Por último, Lula deseja que seja priorizado um pedaço da obra de transposição das águas do rio São Francisco. Essa obra já estava prevista para ter início neste ano, mas atrasou e foi eleita como uma das prioridades do ano que vem a fim de que Lula possa inaugurar parcialmente uma promessa da campanha eleitoral de 2002.
O forte aperto fiscal deste ano, bem superior à meta de superávit primário oficial de 4,25% do PIB (Produto Interno Bruto), é uma mistura de cálculo político e ineficiência de alguns ministérios para gastar o dinheiro liberado.

Ano perdido
A equipe econômica preferiu dificultar a liberação de recursos neste ano, já dado como perdido politicamente por conta da crise. Para o ano que vem, a intenção é um aperto fiscal menos rigoroso e que possa ficar mais próximo da meta oficial de superávit.
Entre janeiro e julho deste ano, o superávit primário acumulado ficou em 6,27% do PIB. Reservadamente, o governo federal já admite que o superávit terminará o ano em aproximadamente 5% do PIB -objetivo para o qual trabalha a equipe econômica, sem admissão pública.
Em 2003, primeiro ano do governo Lula, o superávit primário ficou exatamente na meta de 4,25%. Em 2004, a meta foi elevada para 4,5% e terminou o ano em 4,6% do PIB.
Na avaliação da equipe econômica, se a elevação do PIB no primeiro semestre de 2006 for tão forte como a esperada, Lula recuperaria a popularidade que está perdendo com a crise política. Aliaria crescimento da economia a um pacote de obras.
Obviamente, o sucesso dessa estratégia dependerá do desfecho da crise política. Se não ficar provado nada contra o presidente, ele poderia usar o discurso eleitoral de que enfrentou forte investigação política e não perdeu as rédeas da economia.

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