São Paulo, quarta-feira, 29 de agosto de 2007

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Servidor se demite após manobra de Renan

Secretário-adjunto da Mesa toma decisão em protesto contra parecer que exige que votação no Conselho de Ética seja secreta

Presidente da Casa usa documento para tentar impedir que os relatores do processo recomendem a cassação de seu mandato

FERNANDA KRAKOVICS
SILVIO NAVARRO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O secretário-adjunto da Mesa Diretora do Senado, Marcos Santi, pediu demissão do cargo ontem em protesto contra um "parecer encomendado" que impede que a votação do processo contra o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) no Conselho de Ética seja aberta: "É uma interpretação encomendada. Estão querendo mudar a regra porque agora convém".
Para a oposição, o voto secreto beneficia Renan, já que amplia a possibilidade de "traições" em todas as bancadas.
Santi comunicou sua decisão à secretária-geral da Mesa, Cláudia Lyra, nomeada por Renan. Segundo a Folha apurou, ao saber da decisão, Renan se mobilizou para tentar demovê-lo temendo repercussão negativa na véspera da votação do relatório que recomendará sua cassação no Conselho de Ética.
Solicitada pelo presidente do conselho, senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO), a nota técnica redigida pelo consultor-geral do Senado, Bruno Dantas Nascimento, não só veta que a votação seja aberta mas também impede que os próprios relatores se pronunciem abertamente pela cassação do presidente do Senado, sob o argumento de que, como a votação é secreta no plenário, os relatores também não poderiam revelar seu voto.
"O relatório tem que ser descritivo, senão você está criando um voto de segunda categoria, que é o dos relatores. O que tem que ser votado é a representação do PSOL", disse o consultor-geral Bruno Dantas.
Respaldado por esse parecer, Renan conseguiu impedir que os relatores do processo recomendassem oficialmente a cassação de seu mandato. A orientação é inédita na história do Senado. Em 2000, Luiz Estêvão (PMDB-DF) teve sua cassação aprovada pelo conselho, em votação secreta, após recomendação de perda de mandato feita pelo relator Jefferson Péres (PDT-AM).

Reunião
O debate, que surgiu da dúvida se a votação deve ser aberta ou não, dominou a reunião dos relatores com Quintanilha. O presidente do conselho disse que "os profissionais da consultoria são respeitáveis" e que seguirá "o princípio da legalidade". Ele negou, no entanto, tentar interferir no voto dos relatores. "É uma decisão que vai acontecer lá [no conselho]", declarou Quintanilha.
A posição da consultoria legislativa gerou protestos dos relatores Renato Casagrande (PSB-ES) e Marisa Serrano (PSDB-MS), que pretendem pedir a cassação de Renan. Os dois redigiram pareceres preliminares diferentes, mas ontem anunciaram que pretendem superar as divergências e apresentar um único relatório.
Irritados com a manobra de Renan, Casagrande e Marisa argumentaram que seu trabalho teria sido inútil, porque bastaria votar a representação do PSOL, que originou o processo. "Eu posso ser impedido de dar o meu voto, mas eu vou manifestar a minha opinião para a sociedade", disse Casagrande. "Se o presidente do conselho optar pelo voto secreto, não vamos deixar de colocar nossa posição", disse Marisa.
Aliado de Renan, o terceiro relator do caso, senador Almeida Lima (PMDB-SE), comemorou: "A sociedade, a imprensa e a classe política precisam aprender a conviver com os instrumentos da democracia".
Integrante do conselho, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) anunciou que pretende recorrer da decisão durante a sessão de quinta. As bancadas do PSDB e do DEM também protestaram ontem.
Renan defendeu ontem que a votação seja secreta. O senador criticou a intenção de senadores do PSDB, DEM e PT de abrirem seus votos: "Voto secreto é coisa delicada. Já teve gente que teve que renunciar por causa de abertura de voto".
Ele se referia à violação do painel de votação da sessão que cassou Luiz Estêvão, que resultou na renúncia dos senadores Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA) e José Roberto Arruda (sem partido-DF).
Aliados de Renan ameaçam entrar com mandado de segurança no STF para anular a votação, caso ela seja aberta. A Constituição estabelece que os pedidos de perda de mandato serão submetidos a voto secreto no plenário do Senado, mas o regimento da Casa é omisso quanto ao voto no conselho.
Esta não foi a primeira manobra de Renan usando artifícios técnicos da Casa. Foi um parecer da mesma consultoria legislativa que apontou "vícios de origem" no processo e mandou o caso de volta à Mesa.


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