São Paulo, domingo, 29 de setembro de 2002

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Justiça não seguiu rumos de CPI

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Fernando Collor de Mello traz em sua biografia política duas datas negras e uma terceira que ele apresenta como dignificante.
Há, no ano de 1992, o 29 de setembro, quando se afastou da Presidência da República porque a Câmara autorizou a abertura do processo de impeachment, e também o 29 de dezembro, quando renunciou ao prever a condenação pelo plenário do Senado.
Dois anos depois, em 12 de dezembro de 1994, o Supremo Tribunal Federal arquivou por insuficiência de provas a denúncia por corrupção passiva, feita pela Procuradoria Geral da República.
Mas não há duas condenações seguidas de uma absolvição. O julgamento de Collor pelo Congresso se baseava em provas bastante sólidas, reunidas pela CPI.
Essas provas, no entanto, não foram utilizadas no julgamento do STF. O advogado Miguel Reale Jr. diz que na época tentou convencer o procurador-geral Aristides Junqueira de incluir em sua denúncia não apenas o fato de o ex-presidente ter suas despesas domésticas custeadas por PC Farias. Teria sido também necessário dizer que, se o presidente fechava os olhos à corrupção, é porque ele era o grande beneficiado.

Mérito
Os advogados de Collor no STF perceberam a brecha. Entraram com habeas corpus no qual argumentavam que a denúncia da Procuradoria não descrevia "um fato típico". O Supremo acatou o argumento e arquivou o processo, sem entrar no mérito.
Outro advogado, Márcio Thomaz Bastos, na época também envolvido na movimentação jurídica, diz que a denúncia do procurador-geral "foi precipitada".
Fábio Konder Comparato, que redigiu para a CPI o trecho do relatório sobre o crime de responsabilidade, diz que os advogados que assessoraram o Congresso sugeriram ao procurador-geral que desencadeasse diligências no Uruguai, a fim de, com isso, comprovar a falsidade do empréstimo que Collor evocou para justificar a origem do dinheiro que gastava.
Evandro Lins e Silva, na época com 80 anos, decano do grupo e ex-ministro do STF, diz hoje que o censuraram por trabalhar pelo afastamento do presidente. "Mas é a Constituição que permitia que qualquer cidadão tomasse essa iniciativa", diz ele. O impeachment foi pedido por Barbosa Lima Sobrinho e de Marcelo Lavanère, como cidadãos e não como presidentes da Associação Brasileira de Imprensa e do Conselho Federal da OAB, respectivamente.
Reale menciona a exemplaridade do caso Collor. A corrupção, argumenta, talvez fosse hoje bem maior caso o impeachment não tivesse ocorrido.
Konder Comparato é mais pessimista. O Congresso há dez anos só se voltou contra o presidente, argumenta, porque os grupos dominantes na sociedade, com ramificações na mídia, decidiram pela solução impeachment.
Thomaz Bastos diz que o impeachment demonstrou como as instituições podem funcionar para afastar o presidente sem quebra da legalidade.


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