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ENTREVISTA DA 2ª
Impedido por alunos de defender sua tese sexta-feira, Rohrer diz que sofreu prejuízo "moral e financeiro"
Capitão da PM quer garantias da PUC
IURI DANTAS
DA REPORTAGEM LOCAL
O capitão da PM Francisco
Wanderley Rohrer, 47, quer que a
PUC-SP garanta a defesa de sua
dissertação de mestrado. "Como
vão fazer [a segurança", não é problema meu", afirmou à Folha.
Na sexta-feira, estudantes impediram a quarta tentativa de apresentação do trabalho. Ele foi chamado de "fascista" e atingido por
uma torta. Os alunos atribuem a
ele o comando da tropa que reprimiu protesto antiglobalização na
avenida Paulista, em 20 de abril,
que deixou dez feridos.
"Não estava lá [na PUC] como
capitão, mas como aluno, e a faculdade tem o dever de me dar essa garantia", afirmou. Roher afirma ter sido "vítima de um flagrante preconceito".
Um dia após o tumulto na PUC,
a mesa de sua casa no Tucuruvi
(zona norte de São Paulo) estava
cheia de jornais com o relato dos
protestos. O telefone, na hora e
meia em que a reportagem ficou
em no local, não parou de tocar:
eram políticos, policiais e representantes de comunidades com
mensagens de solidariedade.
Tranquilo, o capitão da PM falou da dificuldade de apresentação de sua monografia "A Identidade do Policial Militar Comunitário: Metamorfose e Emancipação" segurando seu filho Pedro
Paulo, de nove meses.
Ao lado do berço, um quadro
pintado por Rohrer traz a Estátua
da Liberdade estilizada, um presente ao filho, afirma.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
Folha - O direito dos estudantes
de se manifestar esbarra no direito
de o sr. defender sua dissertação.
Como resolver esse impasse?
Francisco Wanderley Rohrer - A
faculdade deve garantir a segurança. Como vão fazer, não é problema meu. Não estava lá como
capitão, mas como aluno, e a faculdade tem o dever de me dar essa garantia, e eu o direito de recebê-la. É um desrespeito com as
pessoas que foram convidadas.
Elas merecem a consideração de
fazermos a apresentação de forma aberta para que quem quiser
se manifestar, dentro das conformidades, possa.
Folha - O senhor vai pedir alguma
garantia da PUC para fazer a defesa
da dissertação?
Rohrer - A única coisa que quero
é exercer meu direito. E a universidade precisa me dar essa garantia sem que precise avocar. É o mínimo. Tenho certeza de que as
pessoas estão sensíveis com o que
aconteceu na sexta-feira. Faço
questão de defender perante o público, inclusive porque os opositores não sabem o que vou falar.
Folha - A atitude dos estudantes
é uma forma de patrulhamento
ideológico?
Rohrer - Tenho absoluta convicção, como também tenho de que
fui vítima de um flagrante preconceito e de calúnia e difamação.
As pessoas me chamaram de assassino, "filho da puta", fascista. A
minha história de vida não condiz
com isso.
Folha - Como o senhor vê esses
protestos contra sua dissertação?
Rohrer - Todo protesto é válido,
é positivo. Toda manifestação é
muito positiva porque é o exercício da democracia. A aprendizagem da democracia tem que passar por isso. Mas houve excessos.
Nisso cabe uma ação mais rígida
por parte da PUC.
Folha - Como?
Rohrer - É interessante. Disseram, na Paulista, que seria uma
manifestação pacífica. Quando
fui negociar, vi pessoas com escudos e sacos cheios de pedra.
Quem vai para uma manifestação
que se diz pacífica não leva isso.
Na PUC, pessoas disseram que o
ato seria pacífico e silencioso.
Quebraram vidros, atiraram pedras, jogaram um bolo no meu
rosto. Disseram que iriam se manifestar em silêncio, mas levaram
megafones.
Folha - O senhor foi discriminado
alguma vez na PUC por ser PM?
Rohrer - Não houve nenhum tipo de discriminação durante o
curso. Em alguns momentos, as
pessoas estranhavam a presença
de um policial fardado. Mas com
o passar do tempo, à medida que
as pessoas iam me conhecendo,
foi tranquilo. Fiz muitos amigos,
especialmente no núcleo a que
pertenço, inclusive professores.
Folha- Quais são as conclusões de
sua dissertação?
Rohrer - Uma das conclusões é
que aconteceu uma metamorfose
com policiais quando passaram a
trabalhar com a comunidade.
Folha - Por que acontece isso?
Rohrer - Principalmente pelo
contato com a comunidade. O policial sai ganhando com a satisfação pessoal, a auto-realização, o
auto-reconhecimento, o reconhecimento pela sociedade.
Folha - Os estudantes o chamam
de "hipócrita" por ter participado
da ação de 20 de abril e defender o
policiamento comunitário.
Rohrer - Eles sabem que não participei do comando. Desafio alguém a trazer uma imagem mostrando a minha pessoa incitando,
comandando a ação. Quando ouvi pelo rádio que os policiais pediam reforço, por causa das pedras atiradas no patrimônio público, me dirigi ao local, me desarmei e fui negociar com eles. Expliquei que tinham o direito de se
manifestar, que daria garantia de
não haver mais violência se eles se
comportassem de acordo. Mas
havia pessoas que queriam gerar
um fato e não queriam paz, como
na sexta-feira.
Não tive tempo de assumir o comando no dia 20 de abril [o capitão afirma ter levado uma pedrada e, por isso, foi encaminhado ao
atendimento médico logo em seguida".
Folha - O senhor considera o protesto na Paulista democrático?
Rohrer - Sim, mas a avenida Paulista não é o local. Existem várias
formas de se manifestar e temos
de respeitar o direito dos outros.
A beleza da democracia está aí.
Folha - O senhor é a favor da Alca?
Da globalização?
Rohrer - Não cabe a um policial
falar se é a favor de Alca, da globalização. Se é favor do capitalismo,
do socialismo, do comunismo. O
meu papel é defender o que diz a
Constituição, ser legalista.
Folha - E o aluno de pós-graduação Rohrer?
Rohrer - Aí acabaríamos confundindo uma coisa com outra, e não
seria elegante entrar nesse confronto. Nessa altura do campeonato, já está havendo quase uma
fusão dos dois. Se falar o que o
aluno e o que o capitão pensam
não será positivo.
Folha - O senhor defende o modo
de atuação da PM na repressão aos
protestos da Paulista em abril?
Rohrer - Defendo. Quando você
encontra um bando de pessoas jogando pedras nos policiais, no patrimônio público e privado, a polícia precisa agir na justa proporcionalidade do ato. A polícia vai
sair com flores? Tanto é que vários policiais saíram feridos.
Folha - Como a polícia deve agir
em casos de manifestação?
Rohrer - Com lisura, postura ética, muita serenidade e equilíbrio.
Com muito respeito aos direitos e
dignidade da pessoa humana e
muito profissionalismo. Se tiver
que usar a força, a polícia vai usar,
ela precisa ser profissional.
Folha - Como o senhor avalia os
níveis de violência em São Paulo?
Rohrer - Altíssimos. Isso não é
uma culpa do secretário da Segurança Pública, não é um problema
de polícia. Quando há essa integração social, como no policiamento comunitário, a violência
acaba regredindo.
Folha - O que o senhor pensa da
ação de Erasmo Dias em 1977
quando invadiu a PUC-SP?
Rohrer - O momento político,
histórico era aquele. As pessoas
que estavam à frente do momento
acharam que o melhor para o
país, para a nação, era aquilo. Não
me cabe estabelecer uma crítica
específica àquelas pessoas. Hoje,
para este momento político, não
está correto. Ele agiu conforme
seu momento histórico. A postura dos alunos hoje é pior. O Erasmo Dias estava escudado em um
regime de exceção, na forma de
agir e de falar.
Folha - O senhor já atirou em
ação?
Rohrer - Já atirei e tive a infelicidade de matar pessoas. Tudo em
legítima defesa, com testemunhas. A última ocorrência de que
participei estava com minha mulher em um posto de gasolina. Havia um assalto com reféns e o cidadão atirou em cima de mim.
Dei três tiros.
Folha - O senhor anda armado?
Rohrer - Ando sim, claro.
Folha - Um de seus filhos poderia
estar no protesto da Paulista. Como o senhor agiria nesse caso?
Rohrer - Agiria da mesma maneira, não tenha dúvida, me desarmaria e iria até lá negociar.
Folha - O senhor se sente prejudicado com o adiamento de sua dissertação?
Rohrer - Uma das exigências do
MEC para dar aulas na universidade é ter o curso de mestrado.
Com isso sofri prejuízo moral, intelectual e financeiro. Poderia
exercer uma atividade que agregasse alguma renda. Paguei a
PUC do meu bolso, não tive bolsa.
Folha - Até onde o senhor quer
chegar com a educação?
Rohrer - Não vejo limites, quero
dar aulas na universidade.
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