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ENTREVISTA DA 2ª
RODRIGO DE GRANDIS
Erro de Protógenes não invalida provas que PF reuniu contra Dantas
Procurador avalia que PF deveria ter avisado sobre participação da Abin na Satiagraha
LILIAN CHRISTOFOLETTI
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
O procurador da República Rodrigo de Grandis, 32, responsável pela investigação da Satiagraha, que apura crimes financeiros atribuídos ao banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity, diz que o delegado da
Polícia Federal Protógenes Queiroz errou ao não informá-lo sobre a participação de membros da Abin
(Agência Brasileira de Inteligência) no caso. "Esse erro, porém, não é, nem de longe, suficiente para anular qualquer prova obtida pela Polícia Federal durante a investigação. Todos os procedimentos tiveram autorização do Poder Judiciário", afirma De Grandis.
De Grandis, que ficou em segundo lugar no Estado de São
Paulo no concurso para o Ministério Público Federal, já
atuou em outros casos de repercussão. Denunciou o ex-prefeito e deputado Paulo Maluf (PP) por envio ilegal de dólares para o exterior e apontou
crime de lavagem de dinheiro
na parceria MSI/Corinthians.
Para ele, a ajuda de Inglaterra, EUA e Suíça na investigação
contra Dantas promete novas
provas para o caso. "Já bloqueamos US$ 45 milhões do
Opportunity na Inglaterra."
FOLHA - Como o sr. avalia os desdobramentos da Satiagraha, em que o
delegado virou investigado e o juiz
Fausto De Sanctis foi representado?
RODRIGO DE GRANDIS - Minha
avaliação é específica da investigação sobre crimes financeiros, lavagem de dinheiro e corrupção. O único motivo que
posso atribuir a essa movimentação, que não diz respeito propriamente ao processo, é o fato
de termos atingido um conjunto de pessoas relativamente
populares, como o ex-prefeito
Celso Pitta, o empresário Naji
Nahas e o banqueiro Daniel
Dantas. E, evidentemente, o interesse cresceu por conta de algumas manifestações sobre os
procedimentos adotados na
Satiagraha, em especial do presidente do Supremo Tribunal
Federal [Gilmar Mendes].
FOLHA - Mendes disse que o juiz, a
Procuradoria e a PF atuaram como
milícia. O sr. concorda?
DE GRANDIS - O que existe é um
trabalho institucional, como a
lei determina. O inquérito policial ou qualquer outra investigação policial é feita com uma
única finalidade: dar provas para que o Ministério Público ofereça uma ação penal. Por isso é
natural que o Ministério Público acompanhe o inquérito. Na
Satiagraha não foi diferente.
O Judiciário foi chamado só
nos momentos em que a lei exige essa intervenção, como para
autorizar a quebra de sigilo telefônico. Acho indevido falar
em qualquer tipo de consórcio.
Não houve isso, mas uma articulação que, na minha opinião,
é profissional, principalmente
diante de crimes complexos.
FOLHA - Quais os erros da investigação, a ponto de ter sido tão criticada pelo presidente do STF?
DE GRANDIS - Não detectei erros.
Acho que existiram algumas
imperfeições. Por exemplo,
achei indevida a superexposição da prisão do ex-prefeito
Celso Pitta [filmada por uma
equipe de TV]. Isso deve ser objeto de crítica. Agora, no que diz
respeito à investigação, entendo que todos os instrumentos
foram usados adequadamente.
Eu me refiro especialmente às
interceptações telefônicas e de
meios eletrônicos e ao procedimento de ação controlada [com
autorização judicial, a PF simulou negociação de suborno].
FOLHA - A participação de membros da Abin sem a anuência da chefia da PF compromete o caso?
DE GRANDIS - Eu tenho a plena
convicção de que a participação
da Abin está fundamentada.
Existe uma base jurídica sólida
para sustentar isso. É bom que
se diga que faz parte do dia-a-dia da Justiça Federal e dos
processos que envolvem crimes econômicos a colaboração
de outros órgãos que possuem
uma característica técnica, que
não pertencem à PF.
FOLHA - Qual a previsão legal?
DE GRANDIS - Existe um conjunto de normas que regulamenta
o sistema brasileiro de inteligência, disciplinando a atividade da Abin, e dá sustentação à
troca de informações e à participação de membros da agência. Esse auxílio não é ilícito. Tive acesso a um parecer da professora Ada Grinover, em que
ela diz que o simples acesso de
não-integrantes da PF invalida
a prova. Entendo que esse tipo
de argumento não é válido. A
operação foi presidida por uma
autoridade policial, que era o
delegado Protógenes Queiroz.
FOLHA - Ele havia informado o sr.
sobre a colaboração da Abin?
DE GRANDIS - Não.
FOLHA - Houve omissão do delegado ou do Ministério Público, que não
descobriu essa participação?
DE GRANDIS - Não considero que
houve omissão do Ministério
Público. Eu confio no trabalho
da polícia. E me manifesto sobre aquilo que chega formalmente ao processo. Nos informes que recebi, nunca foi mencionada a participação da Abin.
Eu acompanhava o procedimento de interceptação telefônica e de e-mail, ambos autorizados judicialmente. Segundo
os relatórios, esses procedimentos eram realizados por
pessoas da própria PF.
FOLHA - Houve uma omissão proposital?
DE GRANDIS - Se o delegado omitiu do Ministério Público, omitiu também da Justiça. Acho
que o único erro foi esse, foi o
delegado não ter comunicado a
participação da Abin. Bastaria
um mero ofício ao Ministério
Público e ao juiz. Teríamos evitado toda essa discussão.
FOLHA - Se tivesse sido informado,
o sr. proibiria a participação da Abin?
DE GRANDIS - Não, apenas pediria ao delegado para que explicasse o motivo de ter chamado
agentes e informaria o juízo
com um mero ofício. Isso teria
evitado toda essa discussão,
que entendo ser infundada. Eu
não sabia desse fato, mas nem
por isso acho que é um motivo
invalidador de prova. Como
membro do Ministério Público,
tenho de analisar a regularidade das provas e, na minha perspectiva, todas foram validamente produzidas, inclusive as
que tiveram o auxílio da Abin.
FOLHA - Existe o risco de as provas
obtidas serem anuladas no STF?
DE GRANDIS - É difícil fazer uma
previsão. Acho que existem vários aspectos jurídicos a serem
analisados pelos tribunais. O
Tribunal Regional Federal da
3ª Região [segunda instância]
já fez uma análise superficial da
participação da Abin e não
apontou nenhuma ilegalidade.
FOLHA - Outros países que receberam aportes financeiros do Opportunity vieram ao Brasil para acompanhar a investigação. Já foram produzidas provas internacionais?
DE GRANDIS - Daquilo que pode
ser divulgado, posso dizer que
há um bloqueio de US$ 45 milhões na Inglaterra e uma conversação com as autoridades
dos EUA, da Suíça e da Inglaterra sobre o caso. Há um interesse muito grande dessas autoridades na eventual instauração de ações penais em seus
territórios contra Dantas.
FOLHA - Esses processos existem?
DE GRANDIS - Não posso dizer.
FOLHA - A investigação brasileira
depende dessa ajuda internacional?
DE GRANDIS - Não depende, mas
pode ajudar a revelar um novo
tentáculo dessa organização
criminosa. Apuramos crimes
financeiros cometidos no Brasil. A cooperação internacional
pode revelar outros delitos praticados fora do território nacional. E essas eventuais provas
podem vir a se somar sobre o
que já temos, que é um conjunto razoável de provas.
FOLHA - Os brasileiros que enviaram dinheiro para o exterior pelo
Opportunity serão ouvidos?
DE GRANDIS - São mais de 90
pessoas. Vamos identificá-las,
saber se realmente existem, e é
natural que sejam ouvidas.
FOLHA - Condenado a dez anos de
prisão, Dantas recorrerá em liberdade. Esse fato serviu para a "Economist" dizer que a Justiça no Brasil
não é efetiva. O sr. concorda?
DE GRANDIS - Hoje, no Brasil,
qualquer investigado ou réu
que tenha um mínimo de condição financeira pode contratar
bons advogados que usam todos os recursos legais para evitar a prisão. É necessária uma
mudança da concepção jurisprudencial ou de lei para que a
sentença de primeira instância
tenha eficácia imediata. A jurisprudência do STF dá uma interpretação ampla ao princípio
da presunção de inocência. Isso
tem de ser reduzido. Hoje temos de esperar o trânsito de todos os recursos para que alguém cumpra a prisão, o que dá
a impressão de impunidade.
FOLHA - Quanto tempo pode levar
o julgamento final de Dantas?
DE GRANDIS - É difícil falar em
prazo. Eu havia dito cinco ou
seis anos, mas hoje acredito
que possa levar até dez anos.
FOLHA - O fato de o investigado ser
rico influencia uma investigação?
DE GRANDIS - Não sei se pelo fato
de ser banqueiro, mas as características das pessoas envolvidas incentivaram muita gente a
opinar sobre o caso.
FOLHA - Por que hoje há mais inquéritos contra os que investigaram
Dantas do que contra o banqueiro?
DE GRANDIS - Não sei. Também
gostaria de saber.
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