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São Paulo, quinta-feira, 30 de janeiro de 2003

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PRATO VAZIO

Para Sônia Rocha, da FGV, vincular dinheiro à comida é ineficiente

Economista acha estratégia do Fome Zero "ultrapassada"

Marco Antonio Rezende/Folha Imagem
A economista Sônia Rocha, da FGV e consultora do Banco Mundial


BONANÇA MOUTEIRA
DA SUCURSAL DO RIO

A economista da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Sônia Maria Rodrigues Rocha, 55, consultora do Banco Mundial para o combate à pobreza, considera "equivocado" o programa Fome Zero do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para ela, a idéia de alimentar a população carente "está ultrapassada".
Com a experiência de quem trabalhou durante 15 anos no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), acompanhou e participou como consultora de vários programas de combate à pobreza no Brasil, a economista afirma que essa fórmula "só é utilizada em situações emergenciais, como no caso de calamidades públicas", como seca e enchentes.
Para Rocha, está errado condicionar o dinheiro à compra de comida e, ainda assim, somente a itens predeterminados. "É uma forma de tutelar, conceito velho e ineficiente", afirmou.
Segundo a economista, é muito mais produtivo dar o dinheiro às famílias de baixa renda para que elas comprem o que mais necessitem. "Restringir à compra de comida não funciona como transferência de renda", afirmou.
"Há o risco, inclusive, de virar moeda de troca com deságio, como aconteceu com o vale-leite no governo Sarney [1985-1990]. Algo como acontece hoje com o vale-transporte - dado aos trabalhadores", diz a especialista.
Em sua avaliação, os programas de transferência de renda - Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentação e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil- deixados pelo governo Fernando Henrique "são bons", pois o dinheiro chega direto ao bolso do beneficiário final, que tem liberdade para gastá-lo de acordo com suas necessidades. "Evita o clientelismo, comum em áreas muito pobres."
Para Rocha, o maior problema destes programas de transferência de renda não é a concepção, que ela considera correta, mas a falta de controle de resultados. "A eficiência do programa depende da eficiência do cadastramento e do acompanhamento."
O cadastramento correto evita inclusive desvios. "Não de verba, mas, sim, de que o dinheiro pode estar indo para quem não precisa, deixando de atender a famílias realmente necessitadas."

Famintos
A economista alimenta ainda mais a polêmica em torno da quantidade de pobres no Brasil. Considera "absurdo" o número de 45 milhões de famintos (mencionado por Lula durante o Fórum Econômico de Davos) e discorda da metodologia de cálculo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que aponta 22 milhões de indigentes.
"Minha própria estimativa indica 16 milhões de indigentes", afirmou. O Ipea, explicou, considera como indigentes pessoas que vivem com menos de meio salário mínimo no Brasil inteiro.
Já Rocha faz cálculos diferenciados por região, levando em conta o custo de vida em cada área. "Meio salário [mínimo" é pouco na região metropolitana de São Paulo mas o suficiente no meio rural do Nordeste."
Em sua opinião, qualquer ação de assistência social deve ter um foco bem definido e números corretos. "Quanto mais certinho, mais fácil fica de resolver."
Ela considera que o principal problema social do país é a má distribuição dos recursos disponíveis e não a falta deles. "O Brasil não é um país africano onde todos vão passar fome se pegar o bolo e distribuí-lo igualmente", afirma.
"Se tivesse mais [dinheiro", melhor], disse, ciente de que o aumento dos recursos para a área social depende de reformas estruturais como a da Previdência.

Subnutrição
Mas ela aponta pelo menos uma boa notícia: os indicadores revelam que a subnutrição no país vem caindo. A mortalidade infantil declinou sensivelmente. Em 1970, eram 117 mortes para cada mil nascimentos. Em 1990, o índice caiu para 60 mortes por mil e, em 2000, já era menos da metade disso: 29,6 óbitos por mil.
"É um indicador indireto", diz Rocha. A criança subnutrida é mais vulnerável a todo tipo de doença e, por isso, acaba morrendo. A altura das crianças confirma a queda na desnutrição. O percentual de crianças com menos de cinco anos e estatura insuficiente para sua idade declinou de 32,9% em 1975 para 15,7% em 1989 e 10,4% em 1996.


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