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ENTREVISTA - FERNANDO HADDAD
Para o ministro da Educação, ação poderá ser contemplada no futuro; na entrevista, Haddad defende ainda o Inep após correção de erros em pesquisa
Haddad defende lei de responsabilidade no ensino
O MINISTRO da Educação, Fernando Haddad, comenta em entrevista à Folha os
novos indicadores de qualidade do ensino divulgados pelo governo. Haddad defende a criação de uma Lei de Responsabilidade
Educacional que crie mecanismos de punição a prefeitos que não investirem adequadamente no setor.
"A sociedade poderá amadurecer essa idéia com
nosso apoio", afirmou.
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
A divulgação das medidas do
PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação) e dos resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica), novo indicador de qualidade do ensino, evidenciou
mais uma vez a necessidade de
reformulação no setor com a
constatação de que apenas
0,8% dos municípios têm, hoje,
patamares de qualidade considerados ideais.
O principal personagem do
novo plano -o ministro da
Educação, Fernando Haddad,
44- afirma que alguns pontos
que receberam críticas de especialistas podem ser contemplados em ações futuras.
Um deles é a criação de uma
Lei de Responsabilidade Educacional que, assim como faz a
Lei de Responsabilidade Fiscal,
crie mecanismos de punição a
prefeitos que não investirem
adequadamente no setor.
"É do interesse do MEC discutir a criação de uma lei de
responsabilidade educacional.
A sociedade poderá amadurecer a idéia com nosso apoio",
disse o ministro da educação
em entrevista à Folha.
Ele defendeu também o
Inep, órgão responsável pela
divulgação das estatísticas educacionais, das críticas por causa da revisão da média de algumas cidades, especialmente
São Paulo, na Prova Brasil
(exame do MEC que avalia
qualidade). Segundo Haddad,
houve um erro na leitura de algumas provas, o que levou o
MEC a corrigir as notas e informar as cidades.
FOLHA - Uma das críticas ao plano
é que os municípios que aderirem ao
plano receberão mais recursos, mas
o prefeito que não se mover por causa dos maus resultados não sofrerá
nenhuma conseqüência. Não está
na hora de criar uma Lei de Responsabilidade Educacional, como já sugeriu o ex-ministro da educação
Cristovam Buarque?
FERNANDO HADDAD - Já existe
um mecanismo em nossa
Constituição, no capítulo que
trata da intervenção da União
em Estados e municípios, que
diz que um dos fundamentos
para que essa ação ocorra é o
não cumprimento do investimento mínimo de 25% da receita de impostos em educação.
É preciso lembrar que, pela
primeira vez, condicionamos
[com o PDE] a transferência de
recursos adicionais da União a
metas bem claras a serem atingidas. É um passo muito importante e que pode evoluir para
uma Lei de Responsabilidade
Educacional.
Isso é algo que o MEC tem interesse em discutir e que a sociedade poderá amadurecer
com nosso apoio.
Não há nada que impeça que
o Executivo ou o Legislativo
proponham um projeto de lei
nessa direção, mas acredito que
nosso papel nesse momento é
criar antes um ambiente social
favorável à mudança.
FOLHA - Sabe-se, por meio de vários estudos, que os alunos que passam mais tempo em sala de aula
aprendem mais. Por que o MEC não
foi mais incisivo e propôs ampliação
da carga horária mínima, que hoje é
de apenas quatro horas?
HADDAD - Essa crítica desconsidera que, pela primeira vez, as
regras de repartição do Fundeb
[fundo que distribuirá verbas
de acordo com o número de
alunos em todo o ensino básico] prevêem uma indução da
escola em tempo integral. O
fundo prevê remuneração adicional para cada matrícula em
escolas de tempo integral.
É óbvio que podemos discutir uma proposta de expansão
da escola de tempo integral,
mas dizer que o plano não prevê mecanismos indutores é
desconsiderar um dos elementos mais ricos da regulamentação do Fundeb e que não constava do Fundef [fundo criado
em 1996 e restrito ao ensino
fundamental, que antecedeu o
Fundeb].
FOLHA - Outra crítica é a previsão
de construção com recursos federais
de apenas 400 creches ou pré-escolas por ano. Especialmente em relação às creches, parece insuficiente,
já que hoje 13% das crianças de 0 a 3
anos estudam. Por que tão pouco?
HADDAD - É preciso considerar
que neste ano, pela primeira
vez, o ministério terá um programa específico para a ampliação da oferta de educação infantil pela construção de novas
unidades. Além disso, o Congresso, em comum acordo com
o executivo, inclui no Fundeb a
proposta de incorporar no rateio dos recursos as creches
conveniadas [não administradas diretamente pelas prefeituras], desde que sejam gratuitas,
tenham condições iguais de
acesso a todos e sejam creches
comunitárias.
O investimento previsto para
este ano, de R$ 200 milhões,
pode sofrer alterações na elaboração do Plano Plurianual.
Estamos aguardando o Congresso finalizar a regulamentação do Fundeb para, a partir
daí, estabelecermos projeções
mais adequadas para a ampliação da educação infantil.
FOLHA - Com relação à remuneração do professor, há quem defenda
que o piso salarial leve em conta o
desempenho do docente. Outros criticam a idéia de vincular ao menos
parte do salário ao mérito. Qual sua
posição?
HADDAD - Eu concordo com a
idéia de que o piso seja incondicional. Sugerimos o valor de R$
850 para esse piso após resgatar um compromisso assumido
pelo governo em 1994 de fixar
um patamar mínimo de R$
300. Corrigindo para valores de
hoje, chegamos aos R$ 850 por
uma jornada de 40 horas. Hoje,
39% dos professores recebem
menos do que isso. Para professores em início de carreira, esse
percentual chega a 55%.
FOLHA - E quanto à remuneração,
para além do piso, que leve em conta o desempenho?
HADDAD - Essa é uma questão
que deve ser tratada no momento de discussão das diretrizes do Plano de Carreira. Há
hoje um projeto tramitando no
Congresso sobre esse assunto e
é este o local adequado para
discutir essa questão.
FOLHA - O Ministério da Educação
divulgou, no ano passado, ano eleitoral, dados errados na Prova Brasil
a respeito do desempenho das redes
municipais de São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte, entre outras. O
que aconteceu? Isso não trouxe prejuízo político ?
HADDAD - Os dados que foram
revistos nada têm a ver com a
posição do sistema estadual de
São Paulo na Prova Brasil. Eu
me lembro bem que o que se
questionou na eleição [ao candidato Geraldo Alckmin, do
PSDB] foi a não participação
integral de São Paulo na Prova
Brasil e o desempenho do sistema estadual paulista, que nada
tem a ver com a rede municipal
da cidade de São Paulo.
Quanto ao erro, o Inep recebeu da instituição que aplicou
as provas [a Fundação Cesgranrio] os dados das provas e fez a
divulgação. A informação que
eu obtive da instituição do Rio
de Janeiro foi que houve erro
na leitura ótica de alguns cartões de resposta, o que fez com
que o sistema não considerasse
algumas respostas corretas, ou
porque havia rasura ou porque
a máquina que processava os
cartões dos alunos [da 4ª série]
não conseguiu ler as respostas
adequadamente.
Quando o erro foi constatado, foi feita uma releitura de todas as provas e foi possível ao
Inep divulgar as médias corretas aos sistemas.
FOLHA - Mas essa correção só veio
à tona porque a Folha detectou o erro. Por que isso não foi comunicado
à imprensa?
HADDAD - Esse erro só foi constatado no final do ano passado,
e ainda não sabíamos ao certo o
grau de correção que seria feito.
Os sistemas, no entanto, foram
informados da correção.
FOLHA - Os dados de aprovação em
algumas cidades também parecem
ter erros, o que prejudicou a posição
delas. A cidade com menor Ideb, Ramilândia (PR), tinha segundo o censo uma taxa de reprovação de 93%
dos alunos, o que parece praticamente impossível. Como evitar distorções como essas?
HADDAD - Estamos alterando
profundamente o Censo Escolar. Hoje, ele é feito por meio de
um preenchimento de um formulário em papel. No caso dessa cidade, a prefeitura reconheceu que houve erro no preenchimento, ou seja, não foi um
equívoco do Inep.
Estamos reformulando o
censo, que passará a ser feito
por aluno. Em vez de a prefeitura informar apenas quantos
alunos estão matriculados e
qual a taxa de reprovação, ela
terá que informar também o
nome de cada aluno, o que permitirá o acompanhamento individual e praticamente afastaremos o risco de erros.
FOLHA - Para melhorar sua posição, não há o risco de prefeituras
aprovarem automaticamente os
alunos?
HADDAD - Na minha opinião, o
Ideb foi construído de maneira
justamente a evitar que isso
ocorra [o índice é calculado a
partir das taxas de aprovação e
do desempenho das escolas na
Prova Brasil]. Se uma prefeitura aprovar automaticamente
seus alunos, o desempenho dela vai ficar prejudicado quando
eles forem avaliados.
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