São Paulo, quarta-feira, 30 de agosto de 2000


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DISSE-QUE-DISSE
Nem publicitário aguenta o horário político

LUIZ CAVERSAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Nem mesmo especialistas em vender produtos e idéias, os publicitários, aguentam o que está no ar para vender candidatos a prefeito e vereador.
A conclusão foi possível depois de ouvir três gerações da premiada publicidade brasileira: Francesc Petit, da DPZ, Washington Olivetto, da W/Brasil, Rodrigo Butori, da recém-criada Cápsula, e, também para dar o indispensável toque feminino, Ana Carmen Longobardi, da Talent.
Todos eles têm um dado em comum: não fazem campanha política. Invertendo a "hierarquia" de gerações, fala Butori, 26 anos:
"A coisa está ruim. Acho que é o pior ano que já vi. Geralmente, a propaganda política é muito mal produzida, feia, malcuidada, não dá tempo de produzir vídeos muito bonitos devido à necessidade de respostas rápidas. A mais bonitinha das que estão no ar é a do PT: é propaganda disfarçada no formato de entretenimento, de diversão. É mais agradável. A propaganda do Maluf, ao contrário dos outros anos, está muito feia."
Agora, Olivetto, para quem o horário eleitoral, se fosse bom, "não seria obrigatório" e que não faz propaganda política porque não anuncia "um produto que não pode ser devolvido":
"No mundo inteiro são raras as brilhantes campanhas políticas. Dois momentos importantes na história: a campanha de Ronald Reagan (ex-presidente dos EUA), que era muito interessante, e a realizada por Jacques Seguelá para a primeira candidatura do Mitterrand (François Miterrand, duas vezes presidente francês): ele mandou serrar os dentes caninos do Miterrand, porque eles eram muito compridos e deixavam o candidato com cara de diabo..."
"Se no mundo as boas campanhas já são raras, no Brasil é ainda pior. O pessoal faz pesquisa e pega um tema que pressupõe ser uma ansiedade do consumidor e/ou eleitor. Então, está todo mundo falando de segurança. E como todos usam aquela formulazinha ensaiada, artificial, parece que o candidato está dublado."
"Nos comerciais avulsos, o problema chave é a falta de conteúdo, que é fundamental em campanhas políticas. O produto deve ter algo a dizer para eu fazer propaganda boa."
Qual seria, então, a solução? "Eu gosto muito dos debates. E acho que a legislação deveria ter alguma coisa para evitar que um cara candidato a vereador prometa impunemente que vai fazer distribuição de renda. Precisamos de mais informação verdadeira e menos persuasão artificializada."
Petit fez uma revelação: sempre sonhou em elaborar campanhas, embora nunca as tenha feito. "A política me fascina", disse.
Como exercício, propôs quatro campanhas para candidatos que escolheu, criando em cima dos "protótipos políticos". Eis um resumo: "Luiza Erundina, fervorosa lutadora da esquerda mais radical, tem por obrigação assumir o seu papel, com discursos inflamados e propostas revolucionárias, chamando o proletariado para as grandes injustiças sociais, gritando aos marreteiros seus direitos como brasileiros, como patriotas que devem lutar pelo seu espaço, pelo seu barraco, num discurso bem fundamentado nos princípios esquerdistas".
"Para o sr. Paulo Maluf, faria uma campanha inspirada nas suas qualidades, homem de finos costumes, frequentador das maiores metrópoles do mundo. Não é um defeito, pois São Paulo é rica, pujante e não pode cair nas mãos de um pé de chinelo."
"O candidato Romeu Tuma merece uma campanha muito especial, pois não me parece adequado chamá-lo de xerife. Não podemos colocar o sr. Tuma na mesma prateleira dos famosos xerifes interpretados por Clint Eastwood, Gary Cooper ou John Wayne. O sr. Tuma é um profissional. Faria uma campanha de um patriota brasileiro bravo, enfadado com o crime, um homem que diz com o olhar que não está para sorrisos e brincadeiras."
"Para Marta Suplicy, faria outro logotipo, um Marta mais pessoal, escrito à mão. Sua campanha não deve combater os outros candidatos; ela deve se centralizar nas suas qualidades e suas causas e esquecer os defeitos dos outros. Ela deve representar de fato a mulher pública moderna disposta a lutar pelas grandes causas, mas sem a retórica anacrônica do PT."
Por último, a opinião feminina e abalizada de Ana Carmen Longobardi: "Eu observei que existem partidos (um deles é o PT) que têm procurado fazer uma campanha mais elaborada. Você vê que existe uma produção bem cuidada, existem comerciais no modelo do que se faz para um produto. Não estou falando de conteúdo, mas sim de forma: a mais profissional é a campanha do PT".
"Mas o que mais atrapalha a vida da gente é o produto anunciado. Quando você começa a ouvir, a prestar atenção nas plataformas, você fica desesperada. É muito difícil avaliar em que grau uma campanha bem elaborada ou eventualmente um conteúdo menos enganador vai surtir efeito. Porque é uma sopa tudo o que você vê. Culminando com a cara de pau de políticos como Miguel Colassuono e Brasil Vita, que até outro dia estavam fazendo o maior conchavo."
"Não gosto de que a propaganda seja obrigatória, ainda mais aquele filme de terror de fotos três por quatro sem nenhuma mensagem. São irrelevantes em termos de conteúdo e chegam a chamar a gente de palhaço. Acho que deveria ter alguma coisa dizendo que o horário político pode causar prejuízo para sua saúde."


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