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JANIO DE FREITAS
O lado deprimente
Nem a política, nem o
país, nem ao menos os ilusionistas profissionais entram em fase nova
A SATISFAÇÃO QUE se irradia das
decisões do Supremo Tribunal Federal, e parece pular
das páginas de jornais e das telas de
TV, tem muitas e ótimas justificativas, mas não me dispensou de algum
amargor. Há uma face triste, deprimente, no resultado do desempenho tão louvável do Supremo. Afinal
de contas, nada do que ali foi repassado e medido deu-se no recôndito
da floresta equatorial do Congo. O
que ali foi esmiuçado e definido
também não foram fantasias levianas da histórica irresponsabilidade
de oposições. Foram fatos e atos
identificados com crimes, crimes
muito graves, ocorridos dentro do
Congresso brasileiro, dentro do governo brasileiro, na capital deste
país de que estamos sempre esperando o que jamais vem.
Não foi apenas ocasional, nem
produto do desatino de um grupo, o
vasto número de fatos e atos que o
Supremo decide submeter a processos criminais. O que chegou à apreciação do STF é apenas a parcela que
foi surpreendida ao acaso, a partir de
um vídeo malandro e um entrevistado em fúria, do processo de imoralidade crescente e há muito tempo
dominante na administração pública e na política brasileiras. E sobre
isso o desempenho exibido pelo Supremo não produz efeito.
O caso Collor/PCFarias levou à
idéia de que política, partidos e eleições, Presidência e governo entrariam, forçosamente, em nova fase,
de ordem legal e moralidade. Não é
preciso relembrar o desmentido factual feito pelas ocorrências entre o
impeachment e o estouro do chamado mensalão. Mas, encerrada a respectiva CPI deste caso, logo se difundiu que o Congresso, os partidos
e sua relação com o Executivo estavam forçados a nova fase, com modificações absolutas no sentido da modernização formal e da moralização.
Enquanto o Supremo se ordenava
para apreciar a denúncia do procurador- geral da República contra os
personagens do mensalão, Lula entregava a gigantesca Furnas (com o
bilionário fundo de pensão da estatal) no toma lá da rasteirice amoral
das relações entre sua Presidência e
os partidos.
Enquanto o Supremo examinava,
com admiráveis eficiência e seriedade, a denúncia do procurador-geral
da República contra os personagens
do mensalão, Lula efetivava uma
transação politiqueira e cupinchosa
para nomear novo integrante do
próprio Supremo. O que nada diz
contra a qualificação do nomeado,
mas diz muito sobre a realidade no
Brasil.
O ilusionismo já propala que,
transformados em réus os 40 personagens do mensalão, a política e o
país entram em nova fase. Nem a política, nem o país, nem ao menos esses ilusionistas profissionais entram
em fase nova. Por simples e forte razão: quem poderia e deveria fazê-lo é
fator e beneficiário da degradação,
cuidando apenas para não ser surpreendido pela má hora de um comparsa.
O maior processo em julgamento
pelo Supremo Tribunal Federal,
motivo da satisfação irradiada tanto
por seu resultado como alta qualidade dos trabalhos de apuração e de
julgamento, apesar disso atinge só a
insignificância de uma molécula no
corpo descomunal da criminalidade
sem balas perdidas -porque nem isso perde.
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